sexta-feira, 31 de dezembro de 2010
quinta-feira, 30 de dezembro de 2010
A Arte da Prece - Uma Antologia Ortodoxa. (Capítulo VI - iv) Tempos de Desolação
A ARTE DA PRECE
Uma Antologia Ortodoxa
compilada pelo
Hegúmeno Chariton de Valamo
CAPÍTULO VI
GUERRA COM AS PAIXÕES
de vários autores
(v) TEMPOS DE DESOLAÇÃO
Sansão sendo Cegado – (Juízes cap. xiii-xvi)
Rembrandt - 1636
Duas espécies de afastamento
A permanência de nossa alma com o Senhor, que é a plena essência do trabalho interno, não é algo que depende de nós. O Senhor visita a alma, e a alma vive com Ele; a alma regozija diante Dele e Ele a preenche com calor espiritual. Então o Senhor se afasta e imediatamente a alma fica vazia, e não reside, de fato, dentro de seu poder fazer com que o Bom Visitante de almas retorne. O Senhor se afasta para colocar a alma à prova, ou às vezes para puni-la, não tanto por algum equívoco externo, mas por algum mal interno que a alma permitiu-se admitir. Quando o Senhor se afasta para colocar a alma à prova, Ele rapidamente retorna uma vez mais quando esta começa a clamar por Ele. Mas quando Ele se afasta como punição, Ele não retorna logo – não até que a alma tenha percebido o pecado cometido, tenha se arrependido, tenha chorado sobre ele e feito penitência.
TEÓFANO, O RECLUSO
Two kinds of withdrawal (p. 257)
The abiding of our soul with the Lord, which is the whole essence of inner work, is not something that depends upon us. The Lord visits the soul, and the soul dwells with Him; the soul rejoices before Him and He fills it with spiritual warmth. Then the Lord withdraws and at once the soul is empty, nor does it lie at all within its power to make the Good Visitor of souls return. The Lord withdraws to put the soul to the test, or sometimes to punish it, not so much for external trespasses but for some inner evil to which the soul has granted admission. When the Lord withdraws to put the soul to the test, He quickly returns once more when it begins to call out to Him. But when He withdraws as a punishment, He does not soon return—not until the soul has realized the sin it has committed, has repented, has wept over it and done penance.
THEOPHAN THE RECLUSE
Sansão e Dalila – Gerrit van Honthorsth – 1615
Por que a alma se esfria?
Acima de tudo, vigie cuidadosamente quando a alma se esfria. Este é um estado perigoso e amargo. O Senhor usa isto como um dos seus meios de orientação, instrução, e correção. Mas pode ser também uma espécie de punição. A razão é, normalmente, um pecado desvelado, mas já que no seu caso nenhum pecado assim é evidente, a causa deve ser buscada em sentimentos e disposições internas. Será que uma alta opinião de si mesmo não o teria assaltado e você pense que não é como os outros? Será que você não está planejando trilhar o caminho da salvação por si mesmo e ascender ao alto através dos seus próprios esforços?
TEÓFANO, O RECLUSO
Why does the soul grow cool? (p. 257)
Above all, watch carefully when the soul grows cool. This is a bitter and dangerous state. The Lord uses it as one of His means of guidance, instruction, and correction. But it can also be a kind of punishment. The reason is usually an open sin, but since in your case no such sin is in evidence, the cause should be sought in inner feelings and dispositions. It may be that a high opinion of yourself has stolen into you, and you think that you are not like the others? Maybe you are planning to tread the path of salvation by yourself and to ascend on high by your own efforts?
THEOPHAN THE RECLUSE
Cristo Adormecido no Mar da Galiléia – ( Mateus viii 23-27, Lucas viii 22-25)
Rembrandt – 1633
Escravos Inacabados Despertando – Michelangelo Buonarroti – Florença - 1519/1536
Períodos de aridez e insensibilidade são inevitáveis
Você empreende diferentes tarefas, assim me conta, ‘na maioria dos casos de má vontade e sem qualquer empenho – tenho de me forçar a fazer’.
Mas isto, afinal, é um princípio básico na vida espiritual – colocar-se em oposição àquilo que é mal e forçar-se a fazer o que é bom. Este é o significado das palavras do Senhor: “o Reino dos Céus é tomado por esforço, e os que se esforçam se apoderam dele.” (Mateus xi. 12). Eis porque seguir o Senhor é um jugo. Se tudo fosse feito com empenho, onde estaria o jugo? No entanto, no final, sucede que tudo é feito de bom grado e facilmente.
Você diz: ‘Uma pesada insensibilidade toma conta de mim; eu me torno como um autômato – sem pensamentos ou sentimentos. ’
Tais estados surgem algumas vezes como uma punição porque nos predispomos em pensamento ou sentimento para algo mal; e algumas vezes eles vêm como uma educação – principalmente para nos ensinar a humildade, habituar-nos a não esperar por nada que venha de nós mesmos, mas esperar apenas por Deus. Umas poucas experiências como esta minam a confiança em si mesmo; e assim, quando somos libertos do abatimento, sabemos de onde a ajuda veio e percebemos em quem podemos confiar sobre todas as coisas. Este é um estado depressivo, mas ele deve ser suportado com o pensamento de que não temos direito a nada melhor, que nós o merecemos. Não existem remédios contra ele e libertar-se dele depende da vontade de Deus. Tudo o que podemos fazer é clamar ao Senhor: Seja feita tua vontade! Tenha piedade! Ajuda-me! Mas de modo algum deveríamos nos permitir ficar indolentes, pois isto é nocivo e destrutivo. Os Santos Padres descrevem tais estados como arrefecimento ou aridez; e eles concordam em considerá-los como algo inevitável para qualquer um que esteja tentando viver de acordo com a vontade de Deus, pois sem eles nós rapidamente nos tornaríamos presunçosos.
TEÓFANO, O RECLUSO
Periods of dryness and insensitivity are inevitable (p. 257)
You undertake different tasks, so you tell me, ‘in most cases unwillingly and without any eagerness—I have to force myself’.
But this, after all, is a basic principle in the spiritual life—to set yourself in opposition to what is bad and to force yourself to do what is good. This is the meaning of the Lord's words, “The kingdom of heaven suffereth violence, and the violent take it by force' (Matt. xi. 12). This is why following the Lord is a yoke. If all were done eagerly, where would be the yoke? Yet in the end it so comes about that everything is done easily and willingly.
You say, ‘A dull insensitivity holds me fast; I become like an automaton—without thoughts or feelings.’
Such states come sometimes as a punishment because we have inclined in thought or feeling to something evil; and sometimes they come as an education—chiefly to teach us humility, to accustom us not to expect anything from our own powers, but to wait on God alone. A few such experiences undermine con¬fidence in self; and so, when we are delivered from heaviness we know where the help comes from, and we realize on whom to rely in everything. This is a depressing state, but it must be endured with the thought that we do not deserve anything better, that we have earned it. There are no remedies against it and deliverance from it depends on God's will. All we can do is to cry to the Lord: Thy will be done! Have mercy! Help me! But on no account should we allow ourselves to grow slack, for this is harmful and destructive. The Holy Fathers describe such states as cooling off or dryness; and they agree in regarding them as something inevitable for anyone trying to live according to God's will, for without them we quickly become presumptuous.
THEOPHAN THE RECLUSE
Um castigo pela raiva
Durante tempos de aridez deveríamos olhar e ver se tivemos algum sentimento vaidoso ou de auto-presunção na alma; e o tendo encontrado, deveríamos arrepender-nos diante do Senhor e decidir-nos ser mais cautelosos no futuro.
Esta aridez é mais frequentemente uma punição pela raiva, mentira, malícia, crítica excessiva, ou orgulho. A cura é retornar ao estado de graça. Já que a graça chega pela vontade de Deus, tudo que podemos fazer é orar para que Ele nos liberte desta aridez e insensibilidade de pedra.
TEÓFANO, O RECLUSO
A punishment for anger (p. 258)
During times of dryness we should look to see whether there has been any feeling of conceit or self-presumption in the soul; and having found it, we should repent before the Lord and resolve to be more cautious in future.
This dryness is most often a punishment for anger, lying, spitefulness, censoriousness, or pride. The cure is to return to the state of grace. Since grace comes by the will of God, all we can do is to pray that He will free us from this dryness and stone-like insensitivity.
THEOPHAN THE RECLUSE
Queda e Expulsão de Adão e Eva do Paraíso – Michelangelo Buonarroti – Capela Sistina – Roma – 1509
Fracasso na confiança de Deus
Tão logo você dê as costas – não importa quão levemente – a Deus, e não mais coloque sua confiança Nele, as coisas se entortam; pois então o Senhor se afasta, como se dissesse: “Você pôs sua confiança em outra coisa – muito bem, confie nela então.” E qualquer coisa que isto possa vir a ser prova-se ulteriormente sem valor.
TEÓFANO, O RECLUSO
Failure to trust in God (p. 259)
As soon as you turn away—however slightly—from God, and no longer place your trust in Him, things go awry; for then the Lord withdraws, as though saying: 'You have put your trust in something else—very well, rely on that instead.' And whatever it may be it proves utterly worthless.
THEOPHAN THE RECLUSE
Menino Agachado – Michelangelo Buonarroti – 1530-1534
Quão frio é sem a graça!
Você vê quão frio é sem a graça e quão apática e inerte fica a alma em relação a qualquer coisa espiritual. Este é o estado dos bons pagãos, dos Judeus fiéis a Lei, e dos Cristãos que conduzem vidas irreprováveis mas não pensam a respeito de suas vidas interiores e sua relação com Deus. E, no entanto, eles não sentem uma dor como a sua porque (diferentemente de você) eles nada sabem dos efeitos da graça. Já que acontece, circunstancialmente, deles experimentarem uma espécie de consolação espiritual – natural, não concedida pela graça – eles permanecem em paz.
O que mantém a graça na alma mais do que qualquer coisa? Humildade. O que faz com que ela se afaste mais do que qualquer outra coisa? Sentimentos de orgulho, uma elevada opinião de si próprio, e auto-suficiência. A graça vai se embora tão logo sente este mau cheiro de orgulho interno.
TEÓFANO, O RECLUSO
How cold it is without grace! (p. 259)
You see how cold it is without grace, and how listless and inert the soul is towards anything spiritual. This is the state of good pagans, of Jews faithful to the Law, and of Christians who lead blameless lives but do not think about their inner life and its relation to God. Yet they do not feel an ache like yours, because (unlike you) they know nothing of the effects of grace. Since from time to time it falls to their lot to experience a kind of spiritual consolation—natural, not grace-given—they remain at peace.
What keep grace in the soul more than anything else? Humility. What makes it withdraw more than anything else? Feelings of pride, a high opinion of oneself, self-reliance. Grace departs as soon as it senses this evil stench of inner pride.
THEOPHAN THE RECLUSE
Nossa Senhora do Rosário
As razões para a nossa frieza
Nós nos esfriamos internamente quando nosso coração fica distraído, quando ele se apega a alguma coisa diferente de Deus, preocupando-se sobre coisas diferentes, ficando com raiva ou culpando outros – quando estamos descontentes e nos entregamos à carne, chafurdando na luxúria e em pensamentos errantes. Proteja-se contra estas coisas, e a frieza diminuirá.
Quanto ao coração – onde mais está a vida se não no coração?
TEÓFANO, O RECLUSO
The reasons for our coldness (p.259)
We grow cold within when our heart is distracted, when it cleaves to something other than God, worrying about different things, getting angry and blaming someone—when we are dis¬contented and pander to the flesh, wallowing in luxury and wandering thoughts. Guard against these things, and the coldness will diminish.
As to the heart—where else is life if not in the heart?
THEOPHAN THE RECLUSE
Nem auto-indulgência e nem auto-piedade.
Você diz que não é bem sucedido. De fato, não haverá sucesso enquanto você estiver cheio de auto-indulgência e auto-piedade. Estas duas coisas mostram, de uma só vez, que aquilo que é predominante em seu coração é ‘eu’ e não o Senhor. É o pecado do amor próprio, vivendo dentro de nós, que dá nascimento a todos os nossos pecados, tornando o homem inteiro um pecador da cabeça aos pés; na medida em que permitimos que o amor próprio habite nossa alma. E quando o homem inteiro é um pecador, como pode a graça vir até ele? Não virá, do mesmo modo que uma abelha não chega perto de onde há fumaça.
Há dois elementos na decisão de trabalhar para o Senhor: primeiramente um homem deve negar ele próprio, e em segundo lugar deve seguir a Cristo (Marcos, 8,34). O primeiro requer uma completa extinção de egoísmo e amor-próprio, e consequentemente uma recusa em permitir qualquer auto-indulgência ou auto-piedade – tanto em pequenos como em grandes assuntos.
No self-indulgence and no self-pity (p.260)
You say that you have no success. Indeed, there will be no success so long as you are full of self-indulgence and self-pity. These two things show at once that what is uppermost in your heart is ‘I’ and not the Lord. It is the sin of self-love, living within us, that gives birth to all our sinfulness, making the whole man a sinner from head to foot, so long as we allow it to dwell in the soul. And when the whole man is a sinner, how can grace come to him? It will not come, just as a bee will not come where there is smoke.
There are two elements in the decision to work for the Lord: first a man must deny himself, and secondly he must follow Christ (Mark viii. 34). The first demands a complete stamping out of egoism or self-love, and consequently a refusal to allow any self-indulgence or self-pity—whether in great matters or small.
THEOPHAN THE RECLUSE
Sempre espere por repentinas mudanças
Tome coragem! Quando o calor do espírito se tornar fraco, você deveria esforçar-se de todos os modos para restaurá-lo, unindo-se ao Senhor com temor e tremor. Todas as coisas vêm Dele. Desânimo, tédio, preguiça do espírito e do corpo podem, ocasionalmente, oprimi-lo e permanecer por um longo tempo. Você não deveria perder o coração, mas permanecer firme, trabalhando com zelo de acordo com as regras que você assumiu. E não espere que a alma se livre rapidamente de sua atração pelo estado equivocado; não espere que ela sempre conserve um mesmo calor e doçura. Isto nunca acontece.
Por outro lado, sempre espere por repentinas mudanças. Quando a lassidão e o embotamento chegam, perceba que isto é você, o verdadeiro você; como você é; quanto à doçura espiritual, aceite-a como um imerecido bônus.
TEÓFANO, O RECLUSO
Always expect sudden changes (p.260)
Take courage! When the warmth of the spirit grows weak, we should strive in every way to restore it, cleaving to the Lord with fear and trembling. Everything comes from Him. Despondency, boredom, heaviness of spirit and body may occasionally oppress us and remain for a long time. You should not lose heart, but should stand firm, zealously working according to the rules you have undertaken. And do not expect the soul to be freed quickly from its attraction towards the wrong state; do not expect it always to preserve an equal warmth and sweetness. This never happens.
On the contrary, always expect sudden changes. When dullness and heaviness come, realize that this is you, the true you, as you are; as to spiritual sweetness, accept it as an undeserved bonus.
THEOPHAN THE RECLUSE
Luz e escuridão na alma
Quantas vezes você já se fez ciente do dever que sua consciência lhe dita – o dever de permanecer com o Senhor, não preferindo nada mais além Dele? Talvez sua consciência deste dever nunca mais lhe deixe. Possa a real prática dele prevalecer, outrossim, constantemente dentro de você; pois isto, afinal, é a nossa verdadeira meta. Quando estamos com o Senhor, o Senhor também está conosco; e todas as coisas brilham. Quando as cortinas da janela estão abertas em uma sala e o sol brilha, a sala fica plena de luz. Se você fechar as cortinas de uma das janelas ela se tornará mais escura, e quando você fechar todas, a sala inteira ficará numa total escuridão. É o mesmo com a alma. Quando ela está voltada para Deus com todas as suas forças e sentimentos, tudo nela é brilhante, alegre, e calmo. Mas quando ela volta sua atenção e sentimento para alguma outra coisa, este brilho diminui. Maior o número de coisas que ocupam a alma, maior a escuridão que a invade; e então pode se chegar à completa escuridão. Não são tanto os pensamentos que trazem esta escuridão quanto os sentimentos; enquanto que o simples exemplo de ser levado por sentimentos provoca, quase sempre, menos escuridão do que um continuado e apaixonado apego por algum objeto. A maior escuridão de todas é causada por atos pecaminosos externos.
TEÓFANO, O RECLUSO
Light and darkness in the soul (p. 261)
How many times already have you been made aware of the duty which your conscience dictates to you—the duty to remain with the Lord, not preferring anything else to Him? Perhaps your awareness of this duty no longer ever leaves you. May the actual practice of it likewise prevail constantly within you; for this, after all, is our true aim. When we are with the Lord, the Lord too is with us; and everything is bright. When the window curtains are drawn apart in a room and the sun shines, the room is full of light. If you draw the curtain over one window it will be darker, and when you draw them all the room will be in total darkness. It is the same with the soul. When it is turned towards God with all its powers and feelings, everything in it is bright, joyful, and calm. But when it turns its attention and feeling to something else this brightness diminishes. The greater the num¬ber of things that occupy the soul, the greater the darkness that invades it; and then complete darkness may result. It is not so much thoughts that bring this darkness, as feelings; while a single instance of being carried away by the feelings is less likely to bring darkness than is a continued passionate attachment to some object. The greatest darkness of all comes from external acts of sin.
THEOPHAN THE RECLUSE
Alegria e temor. A preservação e o afastamento da Graça
No conjunto da sua carta você manifesta o rejubilante estado de sua alma. Você se alegra pela misericórdia de Deus para consigo e, ao mesmo tempo, você está temeroso. Parece que você aprendeu, por experiência, a verdade que se deve ‘Servir o Senhor com temor, e regozijar-se Nele tremendo’ (Sl. ii. 11). Você deve manter estas duas coisas e sustentá-las juntas, inseparavelmente, para não deixar que a alegria conduza à negligência, nem o temor extinga sua felicidade. Segue-se que você deve sustentar-se em extrema reverência diante de Deus, considerando-O como o Pai mais misericordioso que nos observa com adorável atenção, mas que é ao mesmo tempo rigoroso e sem qualquer indulgência.
É simplesmente natural que você deva sentir-se temeroso de que toda esta felicidade possa abandoná-lo novamente. Sob a influência deste temor, você está desejoso e pronto para encontrar um modo de manter seu júbilo. Mas, você carrega a expectativa de ser bem sucedido nisto por si mesmo? Por causa deste único pensamento, tudo o que você ganhou pode lhe ser tomado novamente. Da sua parte, faça todo esforço possível para conservar esta felicidade, mas confie a verdadeira tarefa de protegê-la às mãos do Senhor. Se você não se esforçar Deus não irá protegê-la para você. Por outro lado, se você colocar suas esperanças apenas em seus próprios esforços e empenhos, Deus irá afastar-se vendo que você considera Seu auxílio como supérfluo; e você se deparará com as mesmas dificuldades encontradas no início. Trabalhe até que você esteja a ponto de cair, force-se até o último grau, mas ainda espere que a verdadeira proteção venha apenas das mãos de Deus. Deixe que uma fortaleça a outra – e então, juntas, ambas formarão uma forte defesa.
O Senhor sempre quer que tenhamos tudo aquilo que mais nos auxilia para a salvação, e Ele está pronto para nos dar isto a todo o momento: Ele apenas espera por nossa prontidão ou capacidade para recebê-lo. Portanto, a questão sobre aquilo que devemos fazer para proteger este auxílio é transformada em outra: o que devemos fazer para nos manter em prontidão para receber o poder protetor de Deus, que está esperando para entrar em nós? E como, de fato, este poder entra em nós? É essencial nos reconhecer como vazios, um recipiente vazio que nada contém; adicionar a isto a consciência de nossa própria impotência em preencher este vazio por qualquer dos nossos próprios esforços; coroar isto com a certeza de que apenas o Senhor pode fazê-lo, e não somente pode como quer e sabe como fazê-lo; e então, permanecendo com a mente no coração, clamamos: “Conduza-me à boa ordem pelos meios que Tu conheces, Oh Senhor”. Faça tudo isto com esperança inabalável, confiante de que Ele lhe guiará nos caminhos da justiça e não permitirá que seus pés se desviem.
Você está feliz pelo sentimento de alegria e consolação que lhe retornaram. Isto é natural. Mas apesar disto, esteja atento para não se permitir a fantasiosas conjecturas: ‘Ah! Aí está! Isso é o que é! É assim que é, e eu não sabia!’ Tais idéias são pensamentos do inimigo, deixando atrás de si o vazio, ou nos conduzindo a um beco sem saída. Todo o tempo, apenas devemos repetir: “Glória a Ti, Oh Senhor’, acrescentando: ‘Deus, seja misericordioso!’ Se você demorar nestas vãs conjecturas, junto com elas, imediatamente surgirão memórias de como você trabalhou e se esforçou, daquilo que fez e de como você se absteve, em quais de seus estados o sentido de alegria e bem-estar apareceu, em quais o deixou e em quais ele durou e foi firmemente estabelecido. E depois disso, você tomará a decisão de sempre atuar de algum modo particular. Assim você cairá em uma fantasiosa vaidade, acreditando que finalmente o segredo do progresso espiritual lhe foi revelado e está ao seu alcance. Mas, na próxima vez que você orar, toda a falsidade de tais sonhos se fará evidente, a oração se tornará vazia, inconstante, e pouco confortável. O conforto residirá apenas na memória do seu antigo bom estado e não na sua posse atual. E você terá que suspirar e condenar a si mesmo. Mas se a alma não pode induzir-se a suspirar, então, o falso estado de espírito durará e a graça novamente se afastará. Pois um tal estado fantasioso revela que a alma deslizou novamente para os seus próprios esforços e não mais para a misericórdia de Deus. Graça sempre é graça, e é independente de todo o trabalho. Aquele que a confunde com trabalho pode ficar privado dela por este motivo. Lembre-se bem disto. Os afastamentos da graça, enviados pela providência de Deus para nos corrigir, são especialmente destinados para nos ajudar a aprender esta salvadora lição.
TEÓFANO, O RECLUSO
Joy and fear. The preservation and the withdrawal of Grace (p. 261)
The whole of your letter manifests the joyful state of your soul. You rejoice in God's mercy towards you, and at the same time you are afraid. It would appear that you have learnt from experience the truth that one must ‘Serve the Lord with fear, and rejoice in him with trembling’ (Ps. ii. 11). You must keep both these two things and hold them together inseparably, in order not to allow joy to lead to negligence, nor fear to quench your joy. It follows that you must hold yourself in extreme reverence before God, regarding Him as the Father who is most merciful and watches over us with loving care, but who is at the same time strict without any indulgence.
It is only natural that you should feel a sense of fear that all this joy may leave you again. Under the influence of this fear, you are anxious and ready to find a way of keeping your joy. But do you expect to succeed in this by yourself? Because of this one thought alone, all that you have gained may be taken away again. Make every effort on your own side to preserve this joy, but entrust the actual task of safeguarding it into the hands of the Lord. If you do not strive, God will not safeguard it for you. But if you put your hopes on your own efforts and struggles, God will withdraw, seeing that you regard His aid as superfluous, and you will be met by the same difficulties as you encountered originally. Work until you are ready to fall, force yourself to the utmost degree, but still expect the actual safeguarding to be in the hands of God alone. You must not relax either your work and efforts, or your hopes in God alone. Let one strengthen the other —and then both together will form a strong defence.
The Lord always wants us to have whatever will help us most towards salvation, and He is ready to give it to us at all times: He only waits for our readiness or capacity to receive it. Therefore the question of what we must do to safeguard this help is trans¬formed into another: what must we do to keep ourselves in readiness to receive the protecting power of God, which is wait¬ing to enter into us? And how in fact does this power enter into us? It is essential to recognize ourselves as empty, an empty vessel containing nothing; to add to this the consciousness of our own powerlessness to fill this emptiness by any effort of our own; to crown this by the certitude that the Lord alone can do it, and not only can but wants to and knows how; and then, standing with the mind in the heart, to cry out: ‘Bring me into good order by the means that Thou knowest, O Lord’. Do all this with unshakeable hope, confident that He will guide you into the paths of righteousness and will not let your feet stray.
You are delighted because the feeling of joy and consolation returned to you. That is natural. But with this, be careful not to allow yourself fanciful conjectures: ‘Ah! here it is! This is what it is! This is what it is like, and I did not know it!’ Such ideas are thoughts from the enemy, leaving emptiness behind them, or leading up a blind alley. All the time you must repeat only: ‘Glory to Thee, O Lord’, adding ‘God, be merciful!’ If you dwell on these vain conjectures, immediately along with them there will come memories as to how you worked and struggled, what you did and from what you abstained, in which of your states the sense of joy and well-being appeared and in which it left you, and in which it endured and was firmly established. And afterwards you will make a decision always to act in some particular way. Thus you will fall into fanciful self-conceit, believing that at last the secret of spiritual progress has been revealed to you and lies in your grasp. But the very next time you pray, all the falsity of such dreams will be made evident, the prayer will be empty, inconstant, and of little comfort. The comfort will lie only in the memory of your former good state, and not in its present possession. And you will have to sigh and condemn yourself. But if the soul cannot induce itself to sigh, then the false mood will last and grace will withdraw again. For such a mood of fantasy shows that the soul has leaned again on its own efforts and not on God's mercy. Grace is always grace, and is independent of all work. He who confuses it with work may be deprived of it for this reason. Remember this well. Withdrawals of grace, sent by God's providence to chasten us, are especially intended to help us in learning this saving lesson.
THEOPHAN THE RECLUSE
Uma Antologia Ortodoxa
compilada pelo
Hegúmeno Chariton de Valamo
CAPÍTULO VI
GUERRA COM AS PAIXÕES
de vários autores
(v) TEMPOS DE DESOLAÇÃO
Sansão sendo Cegado – (Juízes cap. xiii-xvi)
Rembrandt - 1636
Duas espécies de afastamento
A permanência de nossa alma com o Senhor, que é a plena essência do trabalho interno, não é algo que depende de nós. O Senhor visita a alma, e a alma vive com Ele; a alma regozija diante Dele e Ele a preenche com calor espiritual. Então o Senhor se afasta e imediatamente a alma fica vazia, e não reside, de fato, dentro de seu poder fazer com que o Bom Visitante de almas retorne. O Senhor se afasta para colocar a alma à prova, ou às vezes para puni-la, não tanto por algum equívoco externo, mas por algum mal interno que a alma permitiu-se admitir. Quando o Senhor se afasta para colocar a alma à prova, Ele rapidamente retorna uma vez mais quando esta começa a clamar por Ele. Mas quando Ele se afasta como punição, Ele não retorna logo – não até que a alma tenha percebido o pecado cometido, tenha se arrependido, tenha chorado sobre ele e feito penitência.
TEÓFANO, O RECLUSO
Two kinds of withdrawal (p. 257)
The abiding of our soul with the Lord, which is the whole essence of inner work, is not something that depends upon us. The Lord visits the soul, and the soul dwells with Him; the soul rejoices before Him and He fills it with spiritual warmth. Then the Lord withdraws and at once the soul is empty, nor does it lie at all within its power to make the Good Visitor of souls return. The Lord withdraws to put the soul to the test, or sometimes to punish it, not so much for external trespasses but for some inner evil to which the soul has granted admission. When the Lord withdraws to put the soul to the test, He quickly returns once more when it begins to call out to Him. But when He withdraws as a punishment, He does not soon return—not until the soul has realized the sin it has committed, has repented, has wept over it and done penance.
THEOPHAN THE RECLUSE
Sansão e Dalila – Gerrit van Honthorsth – 1615
Por que a alma se esfria?
Acima de tudo, vigie cuidadosamente quando a alma se esfria. Este é um estado perigoso e amargo. O Senhor usa isto como um dos seus meios de orientação, instrução, e correção. Mas pode ser também uma espécie de punição. A razão é, normalmente, um pecado desvelado, mas já que no seu caso nenhum pecado assim é evidente, a causa deve ser buscada em sentimentos e disposições internas. Será que uma alta opinião de si mesmo não o teria assaltado e você pense que não é como os outros? Será que você não está planejando trilhar o caminho da salvação por si mesmo e ascender ao alto através dos seus próprios esforços?
TEÓFANO, O RECLUSO
Why does the soul grow cool? (p. 257)
Above all, watch carefully when the soul grows cool. This is a bitter and dangerous state. The Lord uses it as one of His means of guidance, instruction, and correction. But it can also be a kind of punishment. The reason is usually an open sin, but since in your case no such sin is in evidence, the cause should be sought in inner feelings and dispositions. It may be that a high opinion of yourself has stolen into you, and you think that you are not like the others? Maybe you are planning to tread the path of salvation by yourself and to ascend on high by your own efforts?
THEOPHAN THE RECLUSE
Cristo Adormecido no Mar da Galiléia – ( Mateus viii 23-27, Lucas viii 22-25)
Rembrandt – 1633
Escravos Inacabados Despertando – Michelangelo Buonarroti – Florença - 1519/1536
Períodos de aridez e insensibilidade são inevitáveis
Você empreende diferentes tarefas, assim me conta, ‘na maioria dos casos de má vontade e sem qualquer empenho – tenho de me forçar a fazer’.
Mas isto, afinal, é um princípio básico na vida espiritual – colocar-se em oposição àquilo que é mal e forçar-se a fazer o que é bom. Este é o significado das palavras do Senhor: “o Reino dos Céus é tomado por esforço, e os que se esforçam se apoderam dele.” (Mateus xi. 12). Eis porque seguir o Senhor é um jugo. Se tudo fosse feito com empenho, onde estaria o jugo? No entanto, no final, sucede que tudo é feito de bom grado e facilmente.
Você diz: ‘Uma pesada insensibilidade toma conta de mim; eu me torno como um autômato – sem pensamentos ou sentimentos. ’
Tais estados surgem algumas vezes como uma punição porque nos predispomos em pensamento ou sentimento para algo mal; e algumas vezes eles vêm como uma educação – principalmente para nos ensinar a humildade, habituar-nos a não esperar por nada que venha de nós mesmos, mas esperar apenas por Deus. Umas poucas experiências como esta minam a confiança em si mesmo; e assim, quando somos libertos do abatimento, sabemos de onde a ajuda veio e percebemos em quem podemos confiar sobre todas as coisas. Este é um estado depressivo, mas ele deve ser suportado com o pensamento de que não temos direito a nada melhor, que nós o merecemos. Não existem remédios contra ele e libertar-se dele depende da vontade de Deus. Tudo o que podemos fazer é clamar ao Senhor: Seja feita tua vontade! Tenha piedade! Ajuda-me! Mas de modo algum deveríamos nos permitir ficar indolentes, pois isto é nocivo e destrutivo. Os Santos Padres descrevem tais estados como arrefecimento ou aridez; e eles concordam em considerá-los como algo inevitável para qualquer um que esteja tentando viver de acordo com a vontade de Deus, pois sem eles nós rapidamente nos tornaríamos presunçosos.
TEÓFANO, O RECLUSO
Periods of dryness and insensitivity are inevitable (p. 257)
You undertake different tasks, so you tell me, ‘in most cases unwillingly and without any eagerness—I have to force myself’.
But this, after all, is a basic principle in the spiritual life—to set yourself in opposition to what is bad and to force yourself to do what is good. This is the meaning of the Lord's words, “The kingdom of heaven suffereth violence, and the violent take it by force' (Matt. xi. 12). This is why following the Lord is a yoke. If all were done eagerly, where would be the yoke? Yet in the end it so comes about that everything is done easily and willingly.
You say, ‘A dull insensitivity holds me fast; I become like an automaton—without thoughts or feelings.’
Such states come sometimes as a punishment because we have inclined in thought or feeling to something evil; and sometimes they come as an education—chiefly to teach us humility, to accustom us not to expect anything from our own powers, but to wait on God alone. A few such experiences undermine con¬fidence in self; and so, when we are delivered from heaviness we know where the help comes from, and we realize on whom to rely in everything. This is a depressing state, but it must be endured with the thought that we do not deserve anything better, that we have earned it. There are no remedies against it and deliverance from it depends on God's will. All we can do is to cry to the Lord: Thy will be done! Have mercy! Help me! But on no account should we allow ourselves to grow slack, for this is harmful and destructive. The Holy Fathers describe such states as cooling off or dryness; and they agree in regarding them as something inevitable for anyone trying to live according to God's will, for without them we quickly become presumptuous.
THEOPHAN THE RECLUSE
Um castigo pela raiva
Durante tempos de aridez deveríamos olhar e ver se tivemos algum sentimento vaidoso ou de auto-presunção na alma; e o tendo encontrado, deveríamos arrepender-nos diante do Senhor e decidir-nos ser mais cautelosos no futuro.
Esta aridez é mais frequentemente uma punição pela raiva, mentira, malícia, crítica excessiva, ou orgulho. A cura é retornar ao estado de graça. Já que a graça chega pela vontade de Deus, tudo que podemos fazer é orar para que Ele nos liberte desta aridez e insensibilidade de pedra.
TEÓFANO, O RECLUSO
A punishment for anger (p. 258)
During times of dryness we should look to see whether there has been any feeling of conceit or self-presumption in the soul; and having found it, we should repent before the Lord and resolve to be more cautious in future.
This dryness is most often a punishment for anger, lying, spitefulness, censoriousness, or pride. The cure is to return to the state of grace. Since grace comes by the will of God, all we can do is to pray that He will free us from this dryness and stone-like insensitivity.
THEOPHAN THE RECLUSE
Queda e Expulsão de Adão e Eva do Paraíso – Michelangelo Buonarroti – Capela Sistina – Roma – 1509
Fracasso na confiança de Deus
Tão logo você dê as costas – não importa quão levemente – a Deus, e não mais coloque sua confiança Nele, as coisas se entortam; pois então o Senhor se afasta, como se dissesse: “Você pôs sua confiança em outra coisa – muito bem, confie nela então.” E qualquer coisa que isto possa vir a ser prova-se ulteriormente sem valor.
TEÓFANO, O RECLUSO
Failure to trust in God (p. 259)
As soon as you turn away—however slightly—from God, and no longer place your trust in Him, things go awry; for then the Lord withdraws, as though saying: 'You have put your trust in something else—very well, rely on that instead.' And whatever it may be it proves utterly worthless.
THEOPHAN THE RECLUSE
Menino Agachado – Michelangelo Buonarroti – 1530-1534
Quão frio é sem a graça!
Você vê quão frio é sem a graça e quão apática e inerte fica a alma em relação a qualquer coisa espiritual. Este é o estado dos bons pagãos, dos Judeus fiéis a Lei, e dos Cristãos que conduzem vidas irreprováveis mas não pensam a respeito de suas vidas interiores e sua relação com Deus. E, no entanto, eles não sentem uma dor como a sua porque (diferentemente de você) eles nada sabem dos efeitos da graça. Já que acontece, circunstancialmente, deles experimentarem uma espécie de consolação espiritual – natural, não concedida pela graça – eles permanecem em paz.
O que mantém a graça na alma mais do que qualquer coisa? Humildade. O que faz com que ela se afaste mais do que qualquer outra coisa? Sentimentos de orgulho, uma elevada opinião de si próprio, e auto-suficiência. A graça vai se embora tão logo sente este mau cheiro de orgulho interno.
TEÓFANO, O RECLUSO
How cold it is without grace! (p. 259)
You see how cold it is without grace, and how listless and inert the soul is towards anything spiritual. This is the state of good pagans, of Jews faithful to the Law, and of Christians who lead blameless lives but do not think about their inner life and its relation to God. Yet they do not feel an ache like yours, because (unlike you) they know nothing of the effects of grace. Since from time to time it falls to their lot to experience a kind of spiritual consolation—natural, not grace-given—they remain at peace.
What keep grace in the soul more than anything else? Humility. What makes it withdraw more than anything else? Feelings of pride, a high opinion of oneself, self-reliance. Grace departs as soon as it senses this evil stench of inner pride.
THEOPHAN THE RECLUSE
Nossa Senhora do Rosário
As razões para a nossa frieza
Nós nos esfriamos internamente quando nosso coração fica distraído, quando ele se apega a alguma coisa diferente de Deus, preocupando-se sobre coisas diferentes, ficando com raiva ou culpando outros – quando estamos descontentes e nos entregamos à carne, chafurdando na luxúria e em pensamentos errantes. Proteja-se contra estas coisas, e a frieza diminuirá.
Quanto ao coração – onde mais está a vida se não no coração?
TEÓFANO, O RECLUSO
The reasons for our coldness (p.259)
We grow cold within when our heart is distracted, when it cleaves to something other than God, worrying about different things, getting angry and blaming someone—when we are dis¬contented and pander to the flesh, wallowing in luxury and wandering thoughts. Guard against these things, and the coldness will diminish.
As to the heart—where else is life if not in the heart?
THEOPHAN THE RECLUSE
Nem auto-indulgência e nem auto-piedade.
Você diz que não é bem sucedido. De fato, não haverá sucesso enquanto você estiver cheio de auto-indulgência e auto-piedade. Estas duas coisas mostram, de uma só vez, que aquilo que é predominante em seu coração é ‘eu’ e não o Senhor. É o pecado do amor próprio, vivendo dentro de nós, que dá nascimento a todos os nossos pecados, tornando o homem inteiro um pecador da cabeça aos pés; na medida em que permitimos que o amor próprio habite nossa alma. E quando o homem inteiro é um pecador, como pode a graça vir até ele? Não virá, do mesmo modo que uma abelha não chega perto de onde há fumaça.
Há dois elementos na decisão de trabalhar para o Senhor: primeiramente um homem deve negar ele próprio, e em segundo lugar deve seguir a Cristo (Marcos, 8,34). O primeiro requer uma completa extinção de egoísmo e amor-próprio, e consequentemente uma recusa em permitir qualquer auto-indulgência ou auto-piedade – tanto em pequenos como em grandes assuntos.
No self-indulgence and no self-pity (p.260)
You say that you have no success. Indeed, there will be no success so long as you are full of self-indulgence and self-pity. These two things show at once that what is uppermost in your heart is ‘I’ and not the Lord. It is the sin of self-love, living within us, that gives birth to all our sinfulness, making the whole man a sinner from head to foot, so long as we allow it to dwell in the soul. And when the whole man is a sinner, how can grace come to him? It will not come, just as a bee will not come where there is smoke.
There are two elements in the decision to work for the Lord: first a man must deny himself, and secondly he must follow Christ (Mark viii. 34). The first demands a complete stamping out of egoism or self-love, and consequently a refusal to allow any self-indulgence or self-pity—whether in great matters or small.
THEOPHAN THE RECLUSE
Sempre espere por repentinas mudanças
Tome coragem! Quando o calor do espírito se tornar fraco, você deveria esforçar-se de todos os modos para restaurá-lo, unindo-se ao Senhor com temor e tremor. Todas as coisas vêm Dele. Desânimo, tédio, preguiça do espírito e do corpo podem, ocasionalmente, oprimi-lo e permanecer por um longo tempo. Você não deveria perder o coração, mas permanecer firme, trabalhando com zelo de acordo com as regras que você assumiu. E não espere que a alma se livre rapidamente de sua atração pelo estado equivocado; não espere que ela sempre conserve um mesmo calor e doçura. Isto nunca acontece.
Por outro lado, sempre espere por repentinas mudanças. Quando a lassidão e o embotamento chegam, perceba que isto é você, o verdadeiro você; como você é; quanto à doçura espiritual, aceite-a como um imerecido bônus.
TEÓFANO, O RECLUSO
Always expect sudden changes (p.260)
Take courage! When the warmth of the spirit grows weak, we should strive in every way to restore it, cleaving to the Lord with fear and trembling. Everything comes from Him. Despondency, boredom, heaviness of spirit and body may occasionally oppress us and remain for a long time. You should not lose heart, but should stand firm, zealously working according to the rules you have undertaken. And do not expect the soul to be freed quickly from its attraction towards the wrong state; do not expect it always to preserve an equal warmth and sweetness. This never happens.
On the contrary, always expect sudden changes. When dullness and heaviness come, realize that this is you, the true you, as you are; as to spiritual sweetness, accept it as an undeserved bonus.
THEOPHAN THE RECLUSE
Luz e escuridão na alma
Quantas vezes você já se fez ciente do dever que sua consciência lhe dita – o dever de permanecer com o Senhor, não preferindo nada mais além Dele? Talvez sua consciência deste dever nunca mais lhe deixe. Possa a real prática dele prevalecer, outrossim, constantemente dentro de você; pois isto, afinal, é a nossa verdadeira meta. Quando estamos com o Senhor, o Senhor também está conosco; e todas as coisas brilham. Quando as cortinas da janela estão abertas em uma sala e o sol brilha, a sala fica plena de luz. Se você fechar as cortinas de uma das janelas ela se tornará mais escura, e quando você fechar todas, a sala inteira ficará numa total escuridão. É o mesmo com a alma. Quando ela está voltada para Deus com todas as suas forças e sentimentos, tudo nela é brilhante, alegre, e calmo. Mas quando ela volta sua atenção e sentimento para alguma outra coisa, este brilho diminui. Maior o número de coisas que ocupam a alma, maior a escuridão que a invade; e então pode se chegar à completa escuridão. Não são tanto os pensamentos que trazem esta escuridão quanto os sentimentos; enquanto que o simples exemplo de ser levado por sentimentos provoca, quase sempre, menos escuridão do que um continuado e apaixonado apego por algum objeto. A maior escuridão de todas é causada por atos pecaminosos externos.
TEÓFANO, O RECLUSO
Light and darkness in the soul (p. 261)
How many times already have you been made aware of the duty which your conscience dictates to you—the duty to remain with the Lord, not preferring anything else to Him? Perhaps your awareness of this duty no longer ever leaves you. May the actual practice of it likewise prevail constantly within you; for this, after all, is our true aim. When we are with the Lord, the Lord too is with us; and everything is bright. When the window curtains are drawn apart in a room and the sun shines, the room is full of light. If you draw the curtain over one window it will be darker, and when you draw them all the room will be in total darkness. It is the same with the soul. When it is turned towards God with all its powers and feelings, everything in it is bright, joyful, and calm. But when it turns its attention and feeling to something else this brightness diminishes. The greater the num¬ber of things that occupy the soul, the greater the darkness that invades it; and then complete darkness may result. It is not so much thoughts that bring this darkness, as feelings; while a single instance of being carried away by the feelings is less likely to bring darkness than is a continued passionate attachment to some object. The greatest darkness of all comes from external acts of sin.
THEOPHAN THE RECLUSE
Alegria e temor. A preservação e o afastamento da Graça
No conjunto da sua carta você manifesta o rejubilante estado de sua alma. Você se alegra pela misericórdia de Deus para consigo e, ao mesmo tempo, você está temeroso. Parece que você aprendeu, por experiência, a verdade que se deve ‘Servir o Senhor com temor, e regozijar-se Nele tremendo’ (Sl. ii. 11). Você deve manter estas duas coisas e sustentá-las juntas, inseparavelmente, para não deixar que a alegria conduza à negligência, nem o temor extinga sua felicidade. Segue-se que você deve sustentar-se em extrema reverência diante de Deus, considerando-O como o Pai mais misericordioso que nos observa com adorável atenção, mas que é ao mesmo tempo rigoroso e sem qualquer indulgência.
É simplesmente natural que você deva sentir-se temeroso de que toda esta felicidade possa abandoná-lo novamente. Sob a influência deste temor, você está desejoso e pronto para encontrar um modo de manter seu júbilo. Mas, você carrega a expectativa de ser bem sucedido nisto por si mesmo? Por causa deste único pensamento, tudo o que você ganhou pode lhe ser tomado novamente. Da sua parte, faça todo esforço possível para conservar esta felicidade, mas confie a verdadeira tarefa de protegê-la às mãos do Senhor. Se você não se esforçar Deus não irá protegê-la para você. Por outro lado, se você colocar suas esperanças apenas em seus próprios esforços e empenhos, Deus irá afastar-se vendo que você considera Seu auxílio como supérfluo; e você se deparará com as mesmas dificuldades encontradas no início. Trabalhe até que você esteja a ponto de cair, force-se até o último grau, mas ainda espere que a verdadeira proteção venha apenas das mãos de Deus. Deixe que uma fortaleça a outra – e então, juntas, ambas formarão uma forte defesa.
O Senhor sempre quer que tenhamos tudo aquilo que mais nos auxilia para a salvação, e Ele está pronto para nos dar isto a todo o momento: Ele apenas espera por nossa prontidão ou capacidade para recebê-lo. Portanto, a questão sobre aquilo que devemos fazer para proteger este auxílio é transformada em outra: o que devemos fazer para nos manter em prontidão para receber o poder protetor de Deus, que está esperando para entrar em nós? E como, de fato, este poder entra em nós? É essencial nos reconhecer como vazios, um recipiente vazio que nada contém; adicionar a isto a consciência de nossa própria impotência em preencher este vazio por qualquer dos nossos próprios esforços; coroar isto com a certeza de que apenas o Senhor pode fazê-lo, e não somente pode como quer e sabe como fazê-lo; e então, permanecendo com a mente no coração, clamamos: “Conduza-me à boa ordem pelos meios que Tu conheces, Oh Senhor”. Faça tudo isto com esperança inabalável, confiante de que Ele lhe guiará nos caminhos da justiça e não permitirá que seus pés se desviem.
Você está feliz pelo sentimento de alegria e consolação que lhe retornaram. Isto é natural. Mas apesar disto, esteja atento para não se permitir a fantasiosas conjecturas: ‘Ah! Aí está! Isso é o que é! É assim que é, e eu não sabia!’ Tais idéias são pensamentos do inimigo, deixando atrás de si o vazio, ou nos conduzindo a um beco sem saída. Todo o tempo, apenas devemos repetir: “Glória a Ti, Oh Senhor’, acrescentando: ‘Deus, seja misericordioso!’ Se você demorar nestas vãs conjecturas, junto com elas, imediatamente surgirão memórias de como você trabalhou e se esforçou, daquilo que fez e de como você se absteve, em quais de seus estados o sentido de alegria e bem-estar apareceu, em quais o deixou e em quais ele durou e foi firmemente estabelecido. E depois disso, você tomará a decisão de sempre atuar de algum modo particular. Assim você cairá em uma fantasiosa vaidade, acreditando que finalmente o segredo do progresso espiritual lhe foi revelado e está ao seu alcance. Mas, na próxima vez que você orar, toda a falsidade de tais sonhos se fará evidente, a oração se tornará vazia, inconstante, e pouco confortável. O conforto residirá apenas na memória do seu antigo bom estado e não na sua posse atual. E você terá que suspirar e condenar a si mesmo. Mas se a alma não pode induzir-se a suspirar, então, o falso estado de espírito durará e a graça novamente se afastará. Pois um tal estado fantasioso revela que a alma deslizou novamente para os seus próprios esforços e não mais para a misericórdia de Deus. Graça sempre é graça, e é independente de todo o trabalho. Aquele que a confunde com trabalho pode ficar privado dela por este motivo. Lembre-se bem disto. Os afastamentos da graça, enviados pela providência de Deus para nos corrigir, são especialmente destinados para nos ajudar a aprender esta salvadora lição.
TEÓFANO, O RECLUSO
Joy and fear. The preservation and the withdrawal of Grace (p. 261)
The whole of your letter manifests the joyful state of your soul. You rejoice in God's mercy towards you, and at the same time you are afraid. It would appear that you have learnt from experience the truth that one must ‘Serve the Lord with fear, and rejoice in him with trembling’ (Ps. ii. 11). You must keep both these two things and hold them together inseparably, in order not to allow joy to lead to negligence, nor fear to quench your joy. It follows that you must hold yourself in extreme reverence before God, regarding Him as the Father who is most merciful and watches over us with loving care, but who is at the same time strict without any indulgence.
It is only natural that you should feel a sense of fear that all this joy may leave you again. Under the influence of this fear, you are anxious and ready to find a way of keeping your joy. But do you expect to succeed in this by yourself? Because of this one thought alone, all that you have gained may be taken away again. Make every effort on your own side to preserve this joy, but entrust the actual task of safeguarding it into the hands of the Lord. If you do not strive, God will not safeguard it for you. But if you put your hopes on your own efforts and struggles, God will withdraw, seeing that you regard His aid as superfluous, and you will be met by the same difficulties as you encountered originally. Work until you are ready to fall, force yourself to the utmost degree, but still expect the actual safeguarding to be in the hands of God alone. You must not relax either your work and efforts, or your hopes in God alone. Let one strengthen the other —and then both together will form a strong defence.
The Lord always wants us to have whatever will help us most towards salvation, and He is ready to give it to us at all times: He only waits for our readiness or capacity to receive it. Therefore the question of what we must do to safeguard this help is trans¬formed into another: what must we do to keep ourselves in readiness to receive the protecting power of God, which is wait¬ing to enter into us? And how in fact does this power enter into us? It is essential to recognize ourselves as empty, an empty vessel containing nothing; to add to this the consciousness of our own powerlessness to fill this emptiness by any effort of our own; to crown this by the certitude that the Lord alone can do it, and not only can but wants to and knows how; and then, standing with the mind in the heart, to cry out: ‘Bring me into good order by the means that Thou knowest, O Lord’. Do all this with unshakeable hope, confident that He will guide you into the paths of righteousness and will not let your feet stray.
You are delighted because the feeling of joy and consolation returned to you. That is natural. But with this, be careful not to allow yourself fanciful conjectures: ‘Ah! here it is! This is what it is! This is what it is like, and I did not know it!’ Such ideas are thoughts from the enemy, leaving emptiness behind them, or leading up a blind alley. All the time you must repeat only: ‘Glory to Thee, O Lord’, adding ‘God, be merciful!’ If you dwell on these vain conjectures, immediately along with them there will come memories as to how you worked and struggled, what you did and from what you abstained, in which of your states the sense of joy and well-being appeared and in which it left you, and in which it endured and was firmly established. And afterwards you will make a decision always to act in some particular way. Thus you will fall into fanciful self-conceit, believing that at last the secret of spiritual progress has been revealed to you and lies in your grasp. But the very next time you pray, all the falsity of such dreams will be made evident, the prayer will be empty, inconstant, and of little comfort. The comfort will lie only in the memory of your former good state, and not in its present possession. And you will have to sigh and condemn yourself. But if the soul cannot induce itself to sigh, then the false mood will last and grace will withdraw again. For such a mood of fantasy shows that the soul has leaned again on its own efforts and not on God's mercy. Grace is always grace, and is independent of all work. He who confuses it with work may be deprived of it for this reason. Remember this well. Withdrawals of grace, sent by God's providence to chasten us, are especially intended to help us in learning this saving lesson.
THEOPHAN THE RECLUSE
quarta-feira, 29 de dezembro de 2010
terça-feira, 28 de dezembro de 2010
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
domingo, 26 de dezembro de 2010
sábado, 25 de dezembro de 2010
sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
quinta-feira, 23 de dezembro de 2010
Hesíquio, O Sinaíta
A PEQUENA FILOCALIA
O Livro Clássico da Igreja Oriental
HESÍQUIO, O SINAÍTA
(séculos VIII-X)
Hegúmeno de Nossa Senhora da Sarça (Batos), no Sinai; autor de duas centúrias sobre a sobriedade e a virtude (P.G. t. 93, c. 1480). Posterior a João Clímaco e a São Máximo, que ele utiliza. Hesíquio inculca uma noção muito simples da vida espiritual, que ele repete incansavelmente ao longo de seus 200 capítulos. Para ele, tudo está na atenção, na sobriedade ou ainda na hésychia, da qual as duas primeiras são o objeto, o meio e o fim ao mesmo tempo.
Combatei os pensamentos e não haverá mais pecado, pois o pecado começa no declive criado por uma primeira representação que não se fez parar, por não se ter sabido distingui-la. É questão de atenção. E de graça: daí vem o segundo principio, da invocação de Jesus, da oração monológica a Jesus. A resistência ao pensamento passa-se em três momentos: vigilância perpétua para descobrir o pensamento intruso, bom ou mau; resistência e mobilização da ira sã (a "ira segundo a natureza") contra o indesejável; finalmente, a simples invocação, unida à respiração, que torna saudável e puro o ar do coração. A história dessa atenção ligada à Oração de Jesus é a mesma do progresso espiritual. Começa por uma escada (a observação dos mandamentos, as virtudes), depois ela nos abre um livro (a ciência dos seres, as contemplações inferiores); e por fim introduz, na Jerusalém espiritual, a visão de Cristo (a "teologia") na luz de nossa alma.
As duas centúrias já apresentam essa simplificação que surpreende em Nicéforo, o Solitário: a perfeição espiritual é absorvida pela atenção e pela Oração de Jesus. Sem a famosa técnica e, mais tarde, a contribuição palamita sobre a visão da luz do Tabor, Nicéforo e o pseudo-Simeão não passariam de pura e simples reedição de Hesíquio.
PRIMEIRA CENTÚRIA
1. A sobriedade é um método espiritual que,
com a ajuda de Deus e mediante uma pratica re¬gular e firme, liberta-nos inteiramente dos pensamentos e palavras apaixonadas, bem como das ações más. Dá um conhecimento seguro do Deus incompreensível e resolve de maneira secreta os divinos e secretes mistérios. Ela cumpre todos os mandamentos do Antigo e do Novo Testamento e consegue todos os bens da vida futura. A sobriedade, é, antes de tudo, aquela pureza do coração que sua excelência e sua beleza, ou mais exatamente nossa negligencia e nossa desatenção tornaram tão rara entre os monges destes tempos e que Cristo beatificou: “Bem-aventurados os corações puros porque verão a Deus” (Mt 5,8). Por essa razão, ela é de grande valor. A sobriedade guia o homem que a pratica com perseverança, numa vida justa e agradável a Deus. É, alem disso, uma escada que conduz à contemplação; ensina-nos a reger convenientemente os movimentos das três partes da alma (razão, irascível e concupiscível), a vigiar com segurança os nossos sentidos; e aumenta, de dia para dia, as quatro grandes virtudes.
2. ... “Cuida que não te venha ao coração um pensamento secreto” (cf. Dt 15,9). Moisés, ou antes, o Espírito Santo, entende que isso é a simples aparição de um objeto mau, em repulsa a Deus, o que os Padres chamam de sugestão. Oferecida ao coração pelo diabo, logo após ser apresentada à inteligência, e seguida por nossos pensamentos, que começam então uma conversa apaixonada com ela.
3. A sobriedade é o caminho de todas as virtudes e de todos os mandamentos de Deus. Consiste na tranquilidade do coração e num espírito absolutamente preservado de qualquer imaginação.
5. A atenção é um coração em permanente repouso (hesíquia) de todo pensamento, que só respira e invoca ininterruptamente o Cristo Jesus FiIho de Deus; que combate, intrépido, a seu lado e confessa Aquele que tem poder de perdoar os pecados. Que a alma, através de uma invocação constante, abrace Cristo, que escruta em segredo os corações; que ela se aplique em esconder completamente, aos homens, sua alegria e combate interiores. O Maligno não encontra mais passagem por onde introduzir sua malicia no coração e destruir a obra perfeita, entre todas.
6. A sobriedade é uma sentinela imóvel e perseverante do espírito, à porta do coração, para perceber sutilmente os que se apresentam, escutar suas conversas, espiar as manobras desses inimigos mortais; para reconhecer a marca demoníaca que tenta, pela imaginação, devastar nosso espírito. Essa obra, corajosamente conduzida, vai dar-nos, se quisermos, uma experiência muito prudente do combate interior.
7. O duplo temor, os desamparos e as provas pedagógicas que Deus usa conosco têm, como efeito natural, criar uma continuidade solida de atenção, no espírito do homem que se esforça para obstruir a fonte dos maus pensamentos e ações. É a razão dos desamparos e das tentações inopinadas, enviadas por Deus, para corrigir nossa conduta, principalmente se, depois de provar a doce paz da atenção, caímos na negligencia. O esforço incansável gera o hábito; este, uma certa continuação da sobriedade que, por sua vez, consegue pouco a pouco uma visão direta do combate, seguida da oração perseverante de Jesus, o suave repouso de um espírito livre de imaginação e do estado estabelecido por Jesus.
11. “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor!’ entrará no reino dos céus, mas aquele que pratica a vontade de meu Pai” (Mt 7,21). Ora, a vontade de Deus é “detestar o mal” (Sl 97,10). Pela Oração de Jesus, detestemos os maus pensamentos, e está cumprida a vontade de Deus!
13. Vou indicar, em seguida, de quantas maneiras, a meu ver, a sobriedade purifica o espírito dos pensamentos apaixonados...
14. A primeira forma de sobriedade consiste em vigiar rigorosamente a imaginação e a sugestão, pois sem a imaginação Satã é incapaz de formar pensamentos, para apresentá-los ao nosso espírito e iludi-lo com sua mentira.
15. A segunda forma consiste em guardar sempre o coração num silêncio e numa profunda trégua de tudo. E orar.
16. A terceira consiste em chamar Jesus em nosso auxilio incessantemente, com humildade.
17. Outra, em conservar ininterruptamente na alma a lembrança da morte.
18. Todas essas praticas detém os maus pensamentos, à maneira dos janízaros. Sobre o método importante, que consiste em olhar apenas para o céu e considerar a terra como nada valendo, vou alongar-me mais em outra ocasião, se Deus quiser.
20. O combatente espiritual deve, a todo instante, possuir quatro coisas: humildade, extrema atenção, contradição e oração. A humildade, porque esse combate opõe-nos demônios, inimigos da humildade, de moda a conservar, ao alcance do coração, o Senhor, que detesta os orgulhosos. A atenção, para impedir que o coração encerre qualquer pensamento, sejam quais forem suas boas aparências. A contradição, para que, vendo perfeitamente o recém-chegado, seja possível replicar-lhe com ira, no mesmo instante. A oração, logo após a contradição, para gritar do fundo do coração, para Cristo, com inexprimível gemido. Então, o combatente verá o inimigo dissipar-se no nome santo e adorável de Jesus, como a poeira ao vento, e desaparecer como fumaça, com suas imaginações.
21. Quem não tem a oração pura de pensamentos, está desarmado para o combate; quero dizer, a oração praticada incessantemente no santuário profundo da alma, para expulsar a chicotadas e eliminar o inimigo invisível, pela invocação de Jesus Cristo.
22. Que os olhos do vosso espírito permaneçam sempre vivos e atentos para reconhecer os recém-chegados. Uma vez reconhecidos, esmagai a cabeça da serpente com a contradição, ao mesmo tempo em que, gemendo, chamareis Cristo. Recebereis então o sentimento direto do socorro invisível e vereis distintamente a integridade do vosso coração.
23. Quem tem nas mãos um espelho e esta no meio de outras pessoas enquanto olha nesse espelho, vê nele o seu próprio rosto e os dos outros, que ali se refletem. Assim também, quem olha dentro de seu coração com muita atenção, vê o estado próprio e as faces dos demônios invisíveis.
24. O espírito, entregue a seus próprios meios, é incapaz de vencer a imaginação demoníaca. Que ele não se arrisque! Temos inimigos tão astutos, que fingem a derrota, para nos fazer tropeçar na vaidade; mas, diante da invocação de Jesus, não vão aguentar-se nem usar de astúcia um só minuto mais.
27. Aqui estão um exemplo e uma regra para o silêncio (hesíquia) do coração. Se quereis lutar, tomai como exemplo esse bichinho, a aranha. Se não (se não vos conduzis como a aranha), ainda não tendes todo o necessário silêncio de espírito. Esse animalzinho apanha pequenas moscas. Se imitais sua quietude (hesíquia), com a alma compungida, não cessareis de exterminar os filhos da Babilônia.
29. Se passais todo o tempo em vosso coração, na humildade de pensamento, na lembrança da morte, na contradição e na invocação de Jesus Cristo; se, todo dia, seguis na sobriedade e munidos dessas armas, o caminho interior, estreito mas gerador de alegria, atingireis as santas contemplações das santas realidades. “Cristo, em quem se acham escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Cl 2,3) iluminará para vos os mistérios profundos... Então percebereis, em Jesus, que o Espírito Santo precipitou-se sobre vosso coração; Aquele que ilumina o espírito do homem para fazê-lo “ver com a face descoberta a glória do Senhor” (2 Cor 3,18).
30. Os que gostam de se instruir devem saber que os demônios muitas vezes nos distraem, por inveja, e reduzem nosso combate interior; porque vêem, com despeito, a preciosa ajuda que ele presta a subida para Deus, e o conhecimento que nos consegue. Desse modo, por causa de nossa negligência, apossam-se de repente de nosso espírito e tornam alguns de nós desatentos ao coração. Toda a sua ambição e todos os seus esforços visam a impedir que nosso coração seja atento: eles sabem que enriquecimento traz à nossa alma a pratica diária da atenção. Mas apliquemo-nos, então, às contemplações espirituais com a lembrança de Nosso Senhor Jesus Cristo, e o combate se reavivará em nosso espírito...
39. “O diabo vos rodeia como um leão a rugir, procurando quem devorar” (1 Pd 5,8). Não deveis jamais interromper a atenção do coração, a sobrie¬dade, a contradição e a Oração de Jesus Cristo, nosso Deus. Em toda a nossa vida, não poderíamos encontrar ajuda mais excelente que em Jesus.
41. Quanto mais abundante for a chuva, mais
amolecerá a terra. Quanto mais assiduamente invocarmos o nome de Cristo, independente de todos os
pensamentos, mais ele amaciará a terra de nosso
coração, mais a penetrará de júbilo e de alegria.
42. É útil que as pessoas de pouca experiência
saibam ainda isto: quando estamos abatidos, quan¬do o corpo e a razão nos arrastam para a terra,
temos inimigos invisíveis e imateriais, astutos e
hábeis para nos prejudicar. Temos um único meio
de vencê-los: a constante sobriedade de espírito e
a invocação de Cristo, nosso Deus e Criador. Que
os inexperientes encontrem, na Oração de Jesus, um
excitante para sentir e conhecer o bem. Quanto aos que adquiriram experiência, o melhor ensinamento e a melhor prática do bem consistem em praticá-lo e em repousar nele.
43. A criança sem malícia se deixa seduzir pelo charlatão e, em sua simplicidade, segue-o. Da mesma forma nossa alma, simples e boa — seu bom
Mestre assim a criou — encontra prazer nas sugestões do demônio; ela se deixa seduzir e corre para o malvado, como se ele fosse bom, assim como a pomba corre para o caçador de pássaros que arma arapucas para seus filhotes. Desse modo, nossa alma mistura seus próprios pensamentos a imaginação proposta pelo demônio. Seja o rosto
de uma linda mulher ou alguma outra coisa absolutamente proibida pelos mandamentos de Cristo, a alma procura o meio de traduzir em ato o objeto que viu... Identifica-se então com seu pensamento e executa, no corpo, para a própria condenação, o objeto proibido que viu mentalmente.
44. Assim procede o Maligno; é com essas flechas que ele envenena todas as suas vitimas. Por isso, é mais prudente, enquanto o espírito ainda não possui uma longa experiência da guerra, não deixar os pensamentos entrarem no coração. Especialmente no começo, quando nossa alma ainda sente inclinação pelas sugestões dos demônios, encontra prazer nelas e segue-as com avidez. É indispensável, logo que se percebem os pensamentos, suprimi-los imediatamente, no mesmo instante em que nos atingem e em que os identificamos. Quando o espírito tiver adquirido uma grande experiência desse exercício admirável e souber tudo o que e necessário saber; quando estiver habituado a essa guerra, ao ponto de discernir com exatidão entre os pensamentos; e quando for capaz, conforme a palavra do Profeta, de “apanhar as raposinhas”, então ele poderá dispensar-se a astucia de deixá-los avançar, e em seguida iniciar, com a ajuda de Cristo, o combate de desmascará-los e empurrá-los para fora.
46. A sugestão é o começo. Depois, vem a ligação: nossos pensamentos misturam-se com os do espírito mau. Depois, a união: as duas espécies de pensamentos deliberam e acertam o plano do pecado a ser cometido. Finalmente, vem o ato visível, o pecado. Se o espírito se encontra em estado de atenção e de sobriedade e, através da contradição e da invocação de Jesus Cristo, impede, que a sugestão imaginativa progrida, ela não terá consequências. Porque o Maligno, sendo um espírito puro, para perder as almas, tem apenas a imaginação e os pensamentos...
49. Velai incessantemente para que não haja em vosso coração nenhum pensamento, nem insensato (proibido), nem sensato (permitido): não tardareis a reconhecer os estrangeiros, isto é, os primogênitos dos egípcios.
51. A sobriedade lembra a escada de Jacó, sobre a qual Deus permanece, e que os anjos escalam. Ela destrói todo mal em nós, suprime tagarelice, injúrias, distrações e toda a sua seqüela de paixões. sensíveis. Porque não suporta privar-se da própria suavidade, em favor delas, nem mesmo por um instante.
53. Entre os outros bens que ele vai encontrar no exercício assíduo da guarda do coração, o espírito que não descuida de seu exercício secreto, esvaziará dos pecados exteriores os cinco sentidos do corpo. Inteiramente aplicado a sua própria virtude, desejoso de regozijar-se continuamente em bons pensamentos, ele não se deixará pilhar pelos cinco sentidos, que são o caminho de acesso aos pensamentos vãos e materiais; ele os dominará de dentro, por meio de um vigoroso esforço da vontade.
54. Permanecei em vossa inteligência e não tereis que vos afligir nas tentações. Vós vos afastais dela? Suportai as consequências.
62. Quem quiser purificar o coração, tirará excelente proveito da invocação constante do santo nome de Jesus, contra os inimigos invisíveis; fizemos essa experiência. Vede como as lições da experiência concordam com o testemunho da Escritura: “Prepara-te, Israel, para invocar o nome do Senhor teu Deus” (Am 4,12); e do Apostolo: “Orai sem cessar” (1 Ts 5,17)... Que excelente bem é a oração, que contém todos os outros: ela purifica o coração no qual Deus se manifesta àquele que crê.
68. Quem consagra todas as ocupações em seu interior, é casto. E não é só isso. Contempla, vê Deus, anuncia Deus e ora...
70. Aquele que renuncia às coisas do mundo, como mulheres e riquezas, torna monge o homem exterior; não, ainda, o homem interior. Em compensação, quem renuncia ao pensamento apaixonado dessas coisas, torna monge também o homem interior, isto é, o espírito. Esse é um verdadeiro monge. É bem fácil tornar monge o homem exterior; é só querer. Mas tornar monge o homem interior, requer um árduo combate.
71. Não sei se existe um único homem, em toda a nossa geração, que seja totalmente liberto dos pensamentos apaixonados; um homem que tenha sido gratificado com a oração imaterial e pura, índice e sinal do monge interior.
73. Não reserveis toda a atenção ao corpo; determinai para ele um trabalho proporcional a suas forcas e dirigi o vosso espírito, todo, para o mundo interior; pois, esta dito: “A pouco serve o exercício corporal, ao passo que a piedade é proveitosa a tudo" (I Tm 4,8).
79. ... O Reino dos céus não é a recompensa de nosso trabalho; é um dom gratuito de Nosso Senhor, reservado por ele a seus fiéis servidores. O servidor não reclama a liberdade como recompensa. Se esta lhe é concedida, fica reconhecido, como um devedor. Se ele não a recebe, espera-a, como um testemunho de misericórdia.
86. Das sugestões nos vem todas as espécies de pensamentos; e dos pensamentos o ato sensível, ele próprio, mau. Quem, com Jesus, abafa as primeiras, escapa, pelo mesmo fato, à sua consequência. Enriquece-se com o divino conhecimento, no qual verá Deus presente por toda parte. Colocando diante de Deus o espelho de sua alma, será por ele iluminado — como um puro cristal reflete o sol — quando alcançar pouco a pouco o fim desejável; e ficará liberto de qualquer outra contemplação.
87. Todos os pensamentos penetram no coração através da imaginação de certos objetos sensíveis. A bem-aventurada luz da Divindade ilumina o espírito, quando este se libertou de todas as coisas e de suas formas, se é verdade que esse esplendor se manifesta ao espírito purificado, por meio da privação de todo pensamento.
88. Quanto maior atenção prestardes ao vosso pensamento, mais invocareis Jesus, com fervoroso desejo. Quanto mais descurardes o exame de vosso pensamento, mais vos distanciareis de Jesus. Tanto a primeira conduta ilumina a atmosfera do pensamento, quanto a renuncia à sobriedade e à suave invocação de Jesus tem por efeito natural escurecer o espírito. Isso está na ordem da natureza. Vós o percebereis na experiência e o sentireis na ação. Pois essa virtude — a deliciosa atividade geradora de luz — só se aprende pela experiência.
89. O efeito da invocação constante de Jesus, acompanhada de desejo ardente, cheio de alegria suave, é banhar de júbilo e de paz a atmosfera do coração, graças à atenção rigorosa. Mas a própria purificação do coração não tem outro autor além de Jesus Cristo, Filho de Deus e, ele mesmo, Deus...
90. A alma plenamente satisfeita e docemente consolada por Jesus, reconhece seu benfeitor com amor e alegria; agradece-lhe e invoca com júbilo aquele que a purifica; ela o vê dissipando as imaginações dos espíritos do mal, dentro de si mesma.
92. Quando não resta mais nenhuma imaginação no coração, o espírito se encontra em seu estado natural, disposto a toda contemplação espiritual e agradável a Deus.
Assim, pois, sobriedade e Oração de Jesus completam-se e sustentam-se mutuamente. A atenção perfeita reforça a oração contínua; e a oração, por sua vez, reforça a sobriedade e a atenção perfeitas.
96. A lembrança e a invocação constantes de Nosso Senhor produzem, em nosso espírito, um estado divino, sob a condição de não negligenciar-mos a súplica interior a Cristo, a sobriedade perseverante e o trabalho de vigilância. Apeguemo-nos sempre, sem descanso, ao exercício da invocação do Senhor Jesus; que o chamemos com coração ardente, de maneira a comungar com o santo nome de Jesus. Pois, em matéria de virtude, como de vício, a continuidade gera o hábito e o hábito é uma segunda natureza.
97. Toda vez que os maus pensamentos comecem a pulular em nós, lancemos bem no meio deles a invocação de N. S. Jesus Cristo, e os veremos dissipar-se, incontinenti, como fumaça no ar. Uma vez sozinho o espírito, retomemos a atenção e a invocação constantes, e toda vez que a mesma coisa se repita, façamos o mesmo.
98. É impossível viver sem respirar... é igualmente impossível, sem humildade e sem perpétua suplica a Jesus, aprender a ciência do combate espiritual secreto e afastar com método os nossos inimigos.
SEGUNDA CENTÚRIA
1. O esquecimento extingue a guarda do espírito, como a água extingue o fogo. A oração contínua de Jesus, aliada a uma ativa sobriedade, acaba por dissipar do coração o esquecimento. Pois a oração tem tanta necessidade de sobriedade, quanto uma lâmpada precisa de mecha.
Dispensam-se todos os cuidados para preservar o que se tem de precioso. Ora, não possuímos outro bem realmente precioso, além daquele que nos guarda, tanto quanto possível, de todo mal espiritual. É a obra da guarda do espírito, unida a invocação de Jesus; em outras palavras, com olhar sempre fixo nas profundezas do coração e com uma paz (hesíquia) perpétua do espírito. Direi mais: devemos fazer um esforço para nos esvaziarmos até dos pensamentos que pareçam vir da direita; e, de maneira geral, de todos os pensamentos, pois ladrões poderiam emboscar-se neles. O exercício que consiste em não abandonar o coração é árduo, sem dúvida, mas o repouso esta próximo.
3. O coração constantemente guardado, cujo acesso é proibido às formas, imagens e representações dos espíritos tenebrosos e maus, gera naturalmente pensamentos luminosos. O carvão produz chama; quanto mais Deus, que habita o nosso coração desde o santo batismo. Se ele encontrar puro o ar de nosso pensamento, sem sopros do mal e guardado pelo espírito, iluminará nosso poder de intelecção para a contemplação, como a chama ilumina o círio.
4. Não cessemos de fazer voltear o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo nos espaços de nosso coração, como o relâmpago volteia no firmamento, quando a chuva se anuncia. Aqueles que têm a experiência do intelecto e de seu combate interior, sabem disso. Temos de conduzir com ordem o combate, como se organiza uma batalha: primeiro, a atenção; depois, quando o inimigo projeta contra nós um mau pensamento, expulsá-lo com ira, através das palavras de maldição de nosso coração; em terceiro lugar, amaldiçoá-lo, reunindo as forcas do coração, na invocação de Jesus Cristo, para que a mentira do demônio se dissipe e o espírito não queira correr atrás da imaginação, como a criança iludida quer correr atrás do charlatão.
5. Limitemo-nos a clamar: “Senhor Jesus Cristo”, ainda que esgotemos a voz nesse chamado; e que nossos olhos não cessem de se dirigir para o céu, a espera de Nosso Senhor (cf. Sl 69,4)...
6. Quem olha fixamente para o sol, necessariamente terá os olhos atingidos pela radiação. De modo semelhante, quem não cessa de penetrar na atmosfera do coração, só poderá ser iluminado.
11. Praticada convenientemente, a pureza do coração — ou seja, a vigilância e a guarda do espírito, cuja forma é o Novo Testamento — suprime do coração todas as paixões e todo mal. Ela extirpa o mal, para substituí-lo por alegria, boa esperança, contrição, compunção, lágrimas, conhecimento de nós mesmos e de nossas faltas, lembrança da morte, verdadeira humildade, amor incomensurável por Deus e pelos homens e ternura divina do coração.
30. A prática sensata da tranquilidade do coração descobrirá a visão de um abismo vertiginoso; o coração em repouso (hesíquia) ouvirá de Deus coisas extraordinárias.
35. A Oração de Jesus, unida a sobriedade dos pensamentos profundos do coração, apaga os pensamentos que se estabeleceram nele contra nossa vontade.
46. O fato de suspender todo pensamento parece difícil e penoso; efetivamente, é árduo. Encerrar e limitar o incorpóreo no corpóreo não é rebarbativo apenas para os que não entendem nada do combate, mas também para os que adquiriram a experiência da luta íntima e imaterial. Aquele que se impregnou de Cristo Jesus, por meio da oração constante, não mais sofrerá para segui-lo... por causa da beleza e da doçura de Jesus, ele confundirá seus inimigos (os demônios ímpios que giram em torno dele), quando lhes falar às portas do coração; e, por Jesus, irá fazê-los bater em retirada (cf. Sl 127,5).
50. Comecemos pela atenção do espírito; acrescentemos humildade e sobriedade, oração e contradição, e caminharemos venturosamente pelo caminho do espírito. Iluminados pela lâmpada do nome adorado de Jesus Cristo, purificaremos e adornaremos a casa de nosso coração. Se contarmos exclusivamente com a sobriedade e a atenção, logo nos deixaremos empurrar e derrotar pelos inimigos. Vamos ser dominados por esses pérfidos, vamos nos emaranhar na rede dos maus pensamentos; e, depressa eles conseguirão condenar-nos à morte, porque nos terá faltado a arma poderosa, o nome de Jesus. Somente essa santa arma, erguida continuamente num coração que se tornou simples, poderá derrotá-los.
51. A obra incessante da sobriedade, mas também o grande proveito da alma, é ver as imaginações dos pensamentos, no momento exato em que se formam no espírito. A obra da contradição é revelar e refutar o pensamento desejoso de se introduzir na atmosfera de nosso espírito, através da imaginação de um objeto sensível. Mas o que apaga e dissipa no mesmo instante qualquer pensamento do adversário, qualquer raciocínio, qualquer imaginação, aparência ou imagem... é a invocação do Senhor.
53. Lembremo-nos da morte, sem cessar, se for possível. Essa lembrança determina a exclusão de toda preocupação vã, a guarda do espírito e a oração constante, o desapego ao corpo, o ódio ao pecado; na verdade, toda virtude ativa nasce dela. Devemos praticá-la, se for possível, como respiramos.
54. O coração livre das imaginações acaba por produzir, em si mesmo, santos e misteriosos pensamentos, como se vê, no mar calmo, saltarem os peixes e piruetarem os golfinhos.
61. Longa experiência e observação ensinaram-nos isto: aos pensamentos simples e isentos de paixão, seguem-se os pensamentos apaixonados. Os primeiros abrem a porta aos segundos.
64. Quando, fortificados no Cristo Jesus, começamos a avançar, seguros, na sobriedade, uma luz se nos mostra. É, primeiramente, em nosso espírito, uma lâmpada que, por assim dizer, levamos nas mãos e que nos guia pelos atalhos da alma; depois, como que uma lua resplandecente, que executa sua revolução no firmamento do coração. Enfim, Jesus nos aparece como um sol que irradia a justiça, isto é, revela-se como o outro sol, com a luz absolutamente pura de sua contemplação.
68. ... É tão impossível ao sol brilhar sem luz, quanto ao coração purificar-se da mácula dos pensamentos de perdição, sem a invocação do nome de Jesus. Se assim é, como assegura minha experiência, prefiramos esse nome com a mesma frequência com que respiramos. Porque este é a Luz e aqueles, as trevas.
69. ... A guarda do espírito ultrapassa as virtudes corporais mais elevadas, por mais numerosas que possam ser, reunidas no mesmo homem. Devemos, portanto, àquela virtude, os nomes mais magníficos... O poder de Cristo transforma os que o amam, de pecadores, de homens maus, ignorantes, impuros, injustos, em homens justos e bons, santos e sábios. Melhor: eles são admitidos na contemplação dos mistérios, nadam na luz absolutamente pura e infinita, experimentam sua indescritível carícia, habitam-na e vivem nela...
72. A oração monológica mata e reduz a pó as suas tentações. Jesus, Deus e Filho de Deus, invocado por nós com ininterrupta assiduidade, não tolera nem mesmo que a primeira entre as primeiras sugestões se mostre ao espírito, no espelho interior, nem dirija a palavra ao coração.
73. A oração contínua limpa a atmosfera da alma das nuvens sombrias. Uma vez purificada dos sopros dos espíritos maus a atmosfera do coração, é impossível — foi dito — que não brilhe para ele a divina luz de Jesus. Porém, se ele não se encher de orgulho, de vaidade e de presunção.
80. Quereis sinceramente cobrir de vergonha os vossos pensamentos, viver numa quietude sem esforço, exercer facilmente a sobriedade do coração? Que a Oração de Jesus adira a vossa respiração e vós o conseguireis dentro de pouco tempo.
87. Uni ao movimento de vossas narinas a sobriedade, o nome de Jesus, a meditação da morte e a humildade: todos são muito úteis.
94. Sem nenhuma dúvida, é bem-aventurada a inteligência a qual a Oração de Jesus adere assim; o coração que não cessa de ressoar o nome de Jesus, como o ar adere a nosso corpo e a chama à cera. O sol percorre a terra e faz o dia; o santo nome de Jesus, não cessando de brilhar na inteligência, produz inúmeros e resplandecentes pensamentos.
O Livro Clássico da Igreja Oriental
HESÍQUIO, O SINAÍTA
(séculos VIII-X)
Hegúmeno de Nossa Senhora da Sarça (Batos), no Sinai; autor de duas centúrias sobre a sobriedade e a virtude (P.G. t. 93, c. 1480). Posterior a João Clímaco e a São Máximo, que ele utiliza. Hesíquio inculca uma noção muito simples da vida espiritual, que ele repete incansavelmente ao longo de seus 200 capítulos. Para ele, tudo está na atenção, na sobriedade ou ainda na hésychia, da qual as duas primeiras são o objeto, o meio e o fim ao mesmo tempo.
Combatei os pensamentos e não haverá mais pecado, pois o pecado começa no declive criado por uma primeira representação que não se fez parar, por não se ter sabido distingui-la. É questão de atenção. E de graça: daí vem o segundo principio, da invocação de Jesus, da oração monológica a Jesus. A resistência ao pensamento passa-se em três momentos: vigilância perpétua para descobrir o pensamento intruso, bom ou mau; resistência e mobilização da ira sã (a "ira segundo a natureza") contra o indesejável; finalmente, a simples invocação, unida à respiração, que torna saudável e puro o ar do coração. A história dessa atenção ligada à Oração de Jesus é a mesma do progresso espiritual. Começa por uma escada (a observação dos mandamentos, as virtudes), depois ela nos abre um livro (a ciência dos seres, as contemplações inferiores); e por fim introduz, na Jerusalém espiritual, a visão de Cristo (a "teologia") na luz de nossa alma.
As duas centúrias já apresentam essa simplificação que surpreende em Nicéforo, o Solitário: a perfeição espiritual é absorvida pela atenção e pela Oração de Jesus. Sem a famosa técnica e, mais tarde, a contribuição palamita sobre a visão da luz do Tabor, Nicéforo e o pseudo-Simeão não passariam de pura e simples reedição de Hesíquio.
PRIMEIRA CENTÚRIA
1. A sobriedade é um método espiritual que,
com a ajuda de Deus e mediante uma pratica re¬gular e firme, liberta-nos inteiramente dos pensamentos e palavras apaixonadas, bem como das ações más. Dá um conhecimento seguro do Deus incompreensível e resolve de maneira secreta os divinos e secretes mistérios. Ela cumpre todos os mandamentos do Antigo e do Novo Testamento e consegue todos os bens da vida futura. A sobriedade, é, antes de tudo, aquela pureza do coração que sua excelência e sua beleza, ou mais exatamente nossa negligencia e nossa desatenção tornaram tão rara entre os monges destes tempos e que Cristo beatificou: “Bem-aventurados os corações puros porque verão a Deus” (Mt 5,8). Por essa razão, ela é de grande valor. A sobriedade guia o homem que a pratica com perseverança, numa vida justa e agradável a Deus. É, alem disso, uma escada que conduz à contemplação; ensina-nos a reger convenientemente os movimentos das três partes da alma (razão, irascível e concupiscível), a vigiar com segurança os nossos sentidos; e aumenta, de dia para dia, as quatro grandes virtudes.
2. ... “Cuida que não te venha ao coração um pensamento secreto” (cf. Dt 15,9). Moisés, ou antes, o Espírito Santo, entende que isso é a simples aparição de um objeto mau, em repulsa a Deus, o que os Padres chamam de sugestão. Oferecida ao coração pelo diabo, logo após ser apresentada à inteligência, e seguida por nossos pensamentos, que começam então uma conversa apaixonada com ela.
3. A sobriedade é o caminho de todas as virtudes e de todos os mandamentos de Deus. Consiste na tranquilidade do coração e num espírito absolutamente preservado de qualquer imaginação.
5. A atenção é um coração em permanente repouso (hesíquia) de todo pensamento, que só respira e invoca ininterruptamente o Cristo Jesus FiIho de Deus; que combate, intrépido, a seu lado e confessa Aquele que tem poder de perdoar os pecados. Que a alma, através de uma invocação constante, abrace Cristo, que escruta em segredo os corações; que ela se aplique em esconder completamente, aos homens, sua alegria e combate interiores. O Maligno não encontra mais passagem por onde introduzir sua malicia no coração e destruir a obra perfeita, entre todas.
6. A sobriedade é uma sentinela imóvel e perseverante do espírito, à porta do coração, para perceber sutilmente os que se apresentam, escutar suas conversas, espiar as manobras desses inimigos mortais; para reconhecer a marca demoníaca que tenta, pela imaginação, devastar nosso espírito. Essa obra, corajosamente conduzida, vai dar-nos, se quisermos, uma experiência muito prudente do combate interior.
7. O duplo temor, os desamparos e as provas pedagógicas que Deus usa conosco têm, como efeito natural, criar uma continuidade solida de atenção, no espírito do homem que se esforça para obstruir a fonte dos maus pensamentos e ações. É a razão dos desamparos e das tentações inopinadas, enviadas por Deus, para corrigir nossa conduta, principalmente se, depois de provar a doce paz da atenção, caímos na negligencia. O esforço incansável gera o hábito; este, uma certa continuação da sobriedade que, por sua vez, consegue pouco a pouco uma visão direta do combate, seguida da oração perseverante de Jesus, o suave repouso de um espírito livre de imaginação e do estado estabelecido por Jesus.
11. “Nem todo aquele que me diz: ‘Senhor, Senhor!’ entrará no reino dos céus, mas aquele que pratica a vontade de meu Pai” (Mt 7,21). Ora, a vontade de Deus é “detestar o mal” (Sl 97,10). Pela Oração de Jesus, detestemos os maus pensamentos, e está cumprida a vontade de Deus!
13. Vou indicar, em seguida, de quantas maneiras, a meu ver, a sobriedade purifica o espírito dos pensamentos apaixonados...
14. A primeira forma de sobriedade consiste em vigiar rigorosamente a imaginação e a sugestão, pois sem a imaginação Satã é incapaz de formar pensamentos, para apresentá-los ao nosso espírito e iludi-lo com sua mentira.
15. A segunda forma consiste em guardar sempre o coração num silêncio e numa profunda trégua de tudo. E orar.
16. A terceira consiste em chamar Jesus em nosso auxilio incessantemente, com humildade.
17. Outra, em conservar ininterruptamente na alma a lembrança da morte.
18. Todas essas praticas detém os maus pensamentos, à maneira dos janízaros. Sobre o método importante, que consiste em olhar apenas para o céu e considerar a terra como nada valendo, vou alongar-me mais em outra ocasião, se Deus quiser.
20. O combatente espiritual deve, a todo instante, possuir quatro coisas: humildade, extrema atenção, contradição e oração. A humildade, porque esse combate opõe-nos demônios, inimigos da humildade, de moda a conservar, ao alcance do coração, o Senhor, que detesta os orgulhosos. A atenção, para impedir que o coração encerre qualquer pensamento, sejam quais forem suas boas aparências. A contradição, para que, vendo perfeitamente o recém-chegado, seja possível replicar-lhe com ira, no mesmo instante. A oração, logo após a contradição, para gritar do fundo do coração, para Cristo, com inexprimível gemido. Então, o combatente verá o inimigo dissipar-se no nome santo e adorável de Jesus, como a poeira ao vento, e desaparecer como fumaça, com suas imaginações.
21. Quem não tem a oração pura de pensamentos, está desarmado para o combate; quero dizer, a oração praticada incessantemente no santuário profundo da alma, para expulsar a chicotadas e eliminar o inimigo invisível, pela invocação de Jesus Cristo.
22. Que os olhos do vosso espírito permaneçam sempre vivos e atentos para reconhecer os recém-chegados. Uma vez reconhecidos, esmagai a cabeça da serpente com a contradição, ao mesmo tempo em que, gemendo, chamareis Cristo. Recebereis então o sentimento direto do socorro invisível e vereis distintamente a integridade do vosso coração.
23. Quem tem nas mãos um espelho e esta no meio de outras pessoas enquanto olha nesse espelho, vê nele o seu próprio rosto e os dos outros, que ali se refletem. Assim também, quem olha dentro de seu coração com muita atenção, vê o estado próprio e as faces dos demônios invisíveis.
24. O espírito, entregue a seus próprios meios, é incapaz de vencer a imaginação demoníaca. Que ele não se arrisque! Temos inimigos tão astutos, que fingem a derrota, para nos fazer tropeçar na vaidade; mas, diante da invocação de Jesus, não vão aguentar-se nem usar de astúcia um só minuto mais.
27. Aqui estão um exemplo e uma regra para o silêncio (hesíquia) do coração. Se quereis lutar, tomai como exemplo esse bichinho, a aranha. Se não (se não vos conduzis como a aranha), ainda não tendes todo o necessário silêncio de espírito. Esse animalzinho apanha pequenas moscas. Se imitais sua quietude (hesíquia), com a alma compungida, não cessareis de exterminar os filhos da Babilônia.
29. Se passais todo o tempo em vosso coração, na humildade de pensamento, na lembrança da morte, na contradição e na invocação de Jesus Cristo; se, todo dia, seguis na sobriedade e munidos dessas armas, o caminho interior, estreito mas gerador de alegria, atingireis as santas contemplações das santas realidades. “Cristo, em quem se acham escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento” (Cl 2,3) iluminará para vos os mistérios profundos... Então percebereis, em Jesus, que o Espírito Santo precipitou-se sobre vosso coração; Aquele que ilumina o espírito do homem para fazê-lo “ver com a face descoberta a glória do Senhor” (2 Cor 3,18).
30. Os que gostam de se instruir devem saber que os demônios muitas vezes nos distraem, por inveja, e reduzem nosso combate interior; porque vêem, com despeito, a preciosa ajuda que ele presta a subida para Deus, e o conhecimento que nos consegue. Desse modo, por causa de nossa negligência, apossam-se de repente de nosso espírito e tornam alguns de nós desatentos ao coração. Toda a sua ambição e todos os seus esforços visam a impedir que nosso coração seja atento: eles sabem que enriquecimento traz à nossa alma a pratica diária da atenção. Mas apliquemo-nos, então, às contemplações espirituais com a lembrança de Nosso Senhor Jesus Cristo, e o combate se reavivará em nosso espírito...
39. “O diabo vos rodeia como um leão a rugir, procurando quem devorar” (1 Pd 5,8). Não deveis jamais interromper a atenção do coração, a sobrie¬dade, a contradição e a Oração de Jesus Cristo, nosso Deus. Em toda a nossa vida, não poderíamos encontrar ajuda mais excelente que em Jesus.
41. Quanto mais abundante for a chuva, mais
amolecerá a terra. Quanto mais assiduamente invocarmos o nome de Cristo, independente de todos os
pensamentos, mais ele amaciará a terra de nosso
coração, mais a penetrará de júbilo e de alegria.
42. É útil que as pessoas de pouca experiência
saibam ainda isto: quando estamos abatidos, quan¬do o corpo e a razão nos arrastam para a terra,
temos inimigos invisíveis e imateriais, astutos e
hábeis para nos prejudicar. Temos um único meio
de vencê-los: a constante sobriedade de espírito e
a invocação de Cristo, nosso Deus e Criador. Que
os inexperientes encontrem, na Oração de Jesus, um
excitante para sentir e conhecer o bem. Quanto aos que adquiriram experiência, o melhor ensinamento e a melhor prática do bem consistem em praticá-lo e em repousar nele.
43. A criança sem malícia se deixa seduzir pelo charlatão e, em sua simplicidade, segue-o. Da mesma forma nossa alma, simples e boa — seu bom
Mestre assim a criou — encontra prazer nas sugestões do demônio; ela se deixa seduzir e corre para o malvado, como se ele fosse bom, assim como a pomba corre para o caçador de pássaros que arma arapucas para seus filhotes. Desse modo, nossa alma mistura seus próprios pensamentos a imaginação proposta pelo demônio. Seja o rosto
de uma linda mulher ou alguma outra coisa absolutamente proibida pelos mandamentos de Cristo, a alma procura o meio de traduzir em ato o objeto que viu... Identifica-se então com seu pensamento e executa, no corpo, para a própria condenação, o objeto proibido que viu mentalmente.
44. Assim procede o Maligno; é com essas flechas que ele envenena todas as suas vitimas. Por isso, é mais prudente, enquanto o espírito ainda não possui uma longa experiência da guerra, não deixar os pensamentos entrarem no coração. Especialmente no começo, quando nossa alma ainda sente inclinação pelas sugestões dos demônios, encontra prazer nelas e segue-as com avidez. É indispensável, logo que se percebem os pensamentos, suprimi-los imediatamente, no mesmo instante em que nos atingem e em que os identificamos. Quando o espírito tiver adquirido uma grande experiência desse exercício admirável e souber tudo o que e necessário saber; quando estiver habituado a essa guerra, ao ponto de discernir com exatidão entre os pensamentos; e quando for capaz, conforme a palavra do Profeta, de “apanhar as raposinhas”, então ele poderá dispensar-se a astucia de deixá-los avançar, e em seguida iniciar, com a ajuda de Cristo, o combate de desmascará-los e empurrá-los para fora.
46. A sugestão é o começo. Depois, vem a ligação: nossos pensamentos misturam-se com os do espírito mau. Depois, a união: as duas espécies de pensamentos deliberam e acertam o plano do pecado a ser cometido. Finalmente, vem o ato visível, o pecado. Se o espírito se encontra em estado de atenção e de sobriedade e, através da contradição e da invocação de Jesus Cristo, impede, que a sugestão imaginativa progrida, ela não terá consequências. Porque o Maligno, sendo um espírito puro, para perder as almas, tem apenas a imaginação e os pensamentos...
49. Velai incessantemente para que não haja em vosso coração nenhum pensamento, nem insensato (proibido), nem sensato (permitido): não tardareis a reconhecer os estrangeiros, isto é, os primogênitos dos egípcios.
51. A sobriedade lembra a escada de Jacó, sobre a qual Deus permanece, e que os anjos escalam. Ela destrói todo mal em nós, suprime tagarelice, injúrias, distrações e toda a sua seqüela de paixões. sensíveis. Porque não suporta privar-se da própria suavidade, em favor delas, nem mesmo por um instante.
53. Entre os outros bens que ele vai encontrar no exercício assíduo da guarda do coração, o espírito que não descuida de seu exercício secreto, esvaziará dos pecados exteriores os cinco sentidos do corpo. Inteiramente aplicado a sua própria virtude, desejoso de regozijar-se continuamente em bons pensamentos, ele não se deixará pilhar pelos cinco sentidos, que são o caminho de acesso aos pensamentos vãos e materiais; ele os dominará de dentro, por meio de um vigoroso esforço da vontade.
54. Permanecei em vossa inteligência e não tereis que vos afligir nas tentações. Vós vos afastais dela? Suportai as consequências.
62. Quem quiser purificar o coração, tirará excelente proveito da invocação constante do santo nome de Jesus, contra os inimigos invisíveis; fizemos essa experiência. Vede como as lições da experiência concordam com o testemunho da Escritura: “Prepara-te, Israel, para invocar o nome do Senhor teu Deus” (Am 4,12); e do Apostolo: “Orai sem cessar” (1 Ts 5,17)... Que excelente bem é a oração, que contém todos os outros: ela purifica o coração no qual Deus se manifesta àquele que crê.
68. Quem consagra todas as ocupações em seu interior, é casto. E não é só isso. Contempla, vê Deus, anuncia Deus e ora...
70. Aquele que renuncia às coisas do mundo, como mulheres e riquezas, torna monge o homem exterior; não, ainda, o homem interior. Em compensação, quem renuncia ao pensamento apaixonado dessas coisas, torna monge também o homem interior, isto é, o espírito. Esse é um verdadeiro monge. É bem fácil tornar monge o homem exterior; é só querer. Mas tornar monge o homem interior, requer um árduo combate.
71. Não sei se existe um único homem, em toda a nossa geração, que seja totalmente liberto dos pensamentos apaixonados; um homem que tenha sido gratificado com a oração imaterial e pura, índice e sinal do monge interior.
73. Não reserveis toda a atenção ao corpo; determinai para ele um trabalho proporcional a suas forcas e dirigi o vosso espírito, todo, para o mundo interior; pois, esta dito: “A pouco serve o exercício corporal, ao passo que a piedade é proveitosa a tudo" (I Tm 4,8).
79. ... O Reino dos céus não é a recompensa de nosso trabalho; é um dom gratuito de Nosso Senhor, reservado por ele a seus fiéis servidores. O servidor não reclama a liberdade como recompensa. Se esta lhe é concedida, fica reconhecido, como um devedor. Se ele não a recebe, espera-a, como um testemunho de misericórdia.
86. Das sugestões nos vem todas as espécies de pensamentos; e dos pensamentos o ato sensível, ele próprio, mau. Quem, com Jesus, abafa as primeiras, escapa, pelo mesmo fato, à sua consequência. Enriquece-se com o divino conhecimento, no qual verá Deus presente por toda parte. Colocando diante de Deus o espelho de sua alma, será por ele iluminado — como um puro cristal reflete o sol — quando alcançar pouco a pouco o fim desejável; e ficará liberto de qualquer outra contemplação.
87. Todos os pensamentos penetram no coração através da imaginação de certos objetos sensíveis. A bem-aventurada luz da Divindade ilumina o espírito, quando este se libertou de todas as coisas e de suas formas, se é verdade que esse esplendor se manifesta ao espírito purificado, por meio da privação de todo pensamento.
88. Quanto maior atenção prestardes ao vosso pensamento, mais invocareis Jesus, com fervoroso desejo. Quanto mais descurardes o exame de vosso pensamento, mais vos distanciareis de Jesus. Tanto a primeira conduta ilumina a atmosfera do pensamento, quanto a renuncia à sobriedade e à suave invocação de Jesus tem por efeito natural escurecer o espírito. Isso está na ordem da natureza. Vós o percebereis na experiência e o sentireis na ação. Pois essa virtude — a deliciosa atividade geradora de luz — só se aprende pela experiência.
89. O efeito da invocação constante de Jesus, acompanhada de desejo ardente, cheio de alegria suave, é banhar de júbilo e de paz a atmosfera do coração, graças à atenção rigorosa. Mas a própria purificação do coração não tem outro autor além de Jesus Cristo, Filho de Deus e, ele mesmo, Deus...
90. A alma plenamente satisfeita e docemente consolada por Jesus, reconhece seu benfeitor com amor e alegria; agradece-lhe e invoca com júbilo aquele que a purifica; ela o vê dissipando as imaginações dos espíritos do mal, dentro de si mesma.
92. Quando não resta mais nenhuma imaginação no coração, o espírito se encontra em seu estado natural, disposto a toda contemplação espiritual e agradável a Deus.
Assim, pois, sobriedade e Oração de Jesus completam-se e sustentam-se mutuamente. A atenção perfeita reforça a oração contínua; e a oração, por sua vez, reforça a sobriedade e a atenção perfeitas.
96. A lembrança e a invocação constantes de Nosso Senhor produzem, em nosso espírito, um estado divino, sob a condição de não negligenciar-mos a súplica interior a Cristo, a sobriedade perseverante e o trabalho de vigilância. Apeguemo-nos sempre, sem descanso, ao exercício da invocação do Senhor Jesus; que o chamemos com coração ardente, de maneira a comungar com o santo nome de Jesus. Pois, em matéria de virtude, como de vício, a continuidade gera o hábito e o hábito é uma segunda natureza.
97. Toda vez que os maus pensamentos comecem a pulular em nós, lancemos bem no meio deles a invocação de N. S. Jesus Cristo, e os veremos dissipar-se, incontinenti, como fumaça no ar. Uma vez sozinho o espírito, retomemos a atenção e a invocação constantes, e toda vez que a mesma coisa se repita, façamos o mesmo.
98. É impossível viver sem respirar... é igualmente impossível, sem humildade e sem perpétua suplica a Jesus, aprender a ciência do combate espiritual secreto e afastar com método os nossos inimigos.
SEGUNDA CENTÚRIA
1. O esquecimento extingue a guarda do espírito, como a água extingue o fogo. A oração contínua de Jesus, aliada a uma ativa sobriedade, acaba por dissipar do coração o esquecimento. Pois a oração tem tanta necessidade de sobriedade, quanto uma lâmpada precisa de mecha.
Dispensam-se todos os cuidados para preservar o que se tem de precioso. Ora, não possuímos outro bem realmente precioso, além daquele que nos guarda, tanto quanto possível, de todo mal espiritual. É a obra da guarda do espírito, unida a invocação de Jesus; em outras palavras, com olhar sempre fixo nas profundezas do coração e com uma paz (hesíquia) perpétua do espírito. Direi mais: devemos fazer um esforço para nos esvaziarmos até dos pensamentos que pareçam vir da direita; e, de maneira geral, de todos os pensamentos, pois ladrões poderiam emboscar-se neles. O exercício que consiste em não abandonar o coração é árduo, sem dúvida, mas o repouso esta próximo.
3. O coração constantemente guardado, cujo acesso é proibido às formas, imagens e representações dos espíritos tenebrosos e maus, gera naturalmente pensamentos luminosos. O carvão produz chama; quanto mais Deus, que habita o nosso coração desde o santo batismo. Se ele encontrar puro o ar de nosso pensamento, sem sopros do mal e guardado pelo espírito, iluminará nosso poder de intelecção para a contemplação, como a chama ilumina o círio.
4. Não cessemos de fazer voltear o nome de Nosso Senhor Jesus Cristo nos espaços de nosso coração, como o relâmpago volteia no firmamento, quando a chuva se anuncia. Aqueles que têm a experiência do intelecto e de seu combate interior, sabem disso. Temos de conduzir com ordem o combate, como se organiza uma batalha: primeiro, a atenção; depois, quando o inimigo projeta contra nós um mau pensamento, expulsá-lo com ira, através das palavras de maldição de nosso coração; em terceiro lugar, amaldiçoá-lo, reunindo as forcas do coração, na invocação de Jesus Cristo, para que a mentira do demônio se dissipe e o espírito não queira correr atrás da imaginação, como a criança iludida quer correr atrás do charlatão.
5. Limitemo-nos a clamar: “Senhor Jesus Cristo”, ainda que esgotemos a voz nesse chamado; e que nossos olhos não cessem de se dirigir para o céu, a espera de Nosso Senhor (cf. Sl 69,4)...
6. Quem olha fixamente para o sol, necessariamente terá os olhos atingidos pela radiação. De modo semelhante, quem não cessa de penetrar na atmosfera do coração, só poderá ser iluminado.
11. Praticada convenientemente, a pureza do coração — ou seja, a vigilância e a guarda do espírito, cuja forma é o Novo Testamento — suprime do coração todas as paixões e todo mal. Ela extirpa o mal, para substituí-lo por alegria, boa esperança, contrição, compunção, lágrimas, conhecimento de nós mesmos e de nossas faltas, lembrança da morte, verdadeira humildade, amor incomensurável por Deus e pelos homens e ternura divina do coração.
30. A prática sensata da tranquilidade do coração descobrirá a visão de um abismo vertiginoso; o coração em repouso (hesíquia) ouvirá de Deus coisas extraordinárias.
35. A Oração de Jesus, unida a sobriedade dos pensamentos profundos do coração, apaga os pensamentos que se estabeleceram nele contra nossa vontade.
46. O fato de suspender todo pensamento parece difícil e penoso; efetivamente, é árduo. Encerrar e limitar o incorpóreo no corpóreo não é rebarbativo apenas para os que não entendem nada do combate, mas também para os que adquiriram a experiência da luta íntima e imaterial. Aquele que se impregnou de Cristo Jesus, por meio da oração constante, não mais sofrerá para segui-lo... por causa da beleza e da doçura de Jesus, ele confundirá seus inimigos (os demônios ímpios que giram em torno dele), quando lhes falar às portas do coração; e, por Jesus, irá fazê-los bater em retirada (cf. Sl 127,5).
50. Comecemos pela atenção do espírito; acrescentemos humildade e sobriedade, oração e contradição, e caminharemos venturosamente pelo caminho do espírito. Iluminados pela lâmpada do nome adorado de Jesus Cristo, purificaremos e adornaremos a casa de nosso coração. Se contarmos exclusivamente com a sobriedade e a atenção, logo nos deixaremos empurrar e derrotar pelos inimigos. Vamos ser dominados por esses pérfidos, vamos nos emaranhar na rede dos maus pensamentos; e, depressa eles conseguirão condenar-nos à morte, porque nos terá faltado a arma poderosa, o nome de Jesus. Somente essa santa arma, erguida continuamente num coração que se tornou simples, poderá derrotá-los.
51. A obra incessante da sobriedade, mas também o grande proveito da alma, é ver as imaginações dos pensamentos, no momento exato em que se formam no espírito. A obra da contradição é revelar e refutar o pensamento desejoso de se introduzir na atmosfera de nosso espírito, através da imaginação de um objeto sensível. Mas o que apaga e dissipa no mesmo instante qualquer pensamento do adversário, qualquer raciocínio, qualquer imaginação, aparência ou imagem... é a invocação do Senhor.
53. Lembremo-nos da morte, sem cessar, se for possível. Essa lembrança determina a exclusão de toda preocupação vã, a guarda do espírito e a oração constante, o desapego ao corpo, o ódio ao pecado; na verdade, toda virtude ativa nasce dela. Devemos praticá-la, se for possível, como respiramos.
54. O coração livre das imaginações acaba por produzir, em si mesmo, santos e misteriosos pensamentos, como se vê, no mar calmo, saltarem os peixes e piruetarem os golfinhos.
61. Longa experiência e observação ensinaram-nos isto: aos pensamentos simples e isentos de paixão, seguem-se os pensamentos apaixonados. Os primeiros abrem a porta aos segundos.
64. Quando, fortificados no Cristo Jesus, começamos a avançar, seguros, na sobriedade, uma luz se nos mostra. É, primeiramente, em nosso espírito, uma lâmpada que, por assim dizer, levamos nas mãos e que nos guia pelos atalhos da alma; depois, como que uma lua resplandecente, que executa sua revolução no firmamento do coração. Enfim, Jesus nos aparece como um sol que irradia a justiça, isto é, revela-se como o outro sol, com a luz absolutamente pura de sua contemplação.
68. ... É tão impossível ao sol brilhar sem luz, quanto ao coração purificar-se da mácula dos pensamentos de perdição, sem a invocação do nome de Jesus. Se assim é, como assegura minha experiência, prefiramos esse nome com a mesma frequência com que respiramos. Porque este é a Luz e aqueles, as trevas.
69. ... A guarda do espírito ultrapassa as virtudes corporais mais elevadas, por mais numerosas que possam ser, reunidas no mesmo homem. Devemos, portanto, àquela virtude, os nomes mais magníficos... O poder de Cristo transforma os que o amam, de pecadores, de homens maus, ignorantes, impuros, injustos, em homens justos e bons, santos e sábios. Melhor: eles são admitidos na contemplação dos mistérios, nadam na luz absolutamente pura e infinita, experimentam sua indescritível carícia, habitam-na e vivem nela...
72. A oração monológica mata e reduz a pó as suas tentações. Jesus, Deus e Filho de Deus, invocado por nós com ininterrupta assiduidade, não tolera nem mesmo que a primeira entre as primeiras sugestões se mostre ao espírito, no espelho interior, nem dirija a palavra ao coração.
73. A oração contínua limpa a atmosfera da alma das nuvens sombrias. Uma vez purificada dos sopros dos espíritos maus a atmosfera do coração, é impossível — foi dito — que não brilhe para ele a divina luz de Jesus. Porém, se ele não se encher de orgulho, de vaidade e de presunção.
80. Quereis sinceramente cobrir de vergonha os vossos pensamentos, viver numa quietude sem esforço, exercer facilmente a sobriedade do coração? Que a Oração de Jesus adira a vossa respiração e vós o conseguireis dentro de pouco tempo.
87. Uni ao movimento de vossas narinas a sobriedade, o nome de Jesus, a meditação da morte e a humildade: todos são muito úteis.
94. Sem nenhuma dúvida, é bem-aventurada a inteligência a qual a Oração de Jesus adere assim; o coração que não cessa de ressoar o nome de Jesus, como o ar adere a nosso corpo e a chama à cera. O sol percorre a terra e faz o dia; o santo nome de Jesus, não cessando de brilhar na inteligência, produz inúmeros e resplandecentes pensamentos.
A Arte da Prece - Uma Antologia Ortodoxa. (Capítulo IV - i) Os Frutos da Oração
A ARTE DA PRECE
Uma Antologia Ortodoxa
compilada pelo
Hegúmeno Chariton de Valamo
CAPÍTULO IV
OS FRUTOS DA ORAÇÃO
por Teófan, o Recluso.
(i) ATENÇÃO E TEMOR DE DEUS
Os primeiros frutos da oração – atenção e uma calorosa ternura do coração
Qualquer regra de oração que é apropriadamente executada produzirá como seus primeiros frutos atenção e uma calorosa ternura do coração ; mas estas coisas virão especialmente da prática da Oração de Jesus, que se situa num nível superior que a salmodia e outras formas de prece. A atenção dá nascimento à calorosa ternura do coração, que por sua vez faz aumentar a atenção. Eles se fortificam juntos, apoiando um ao outro. Eles dão profundidade à oração, ativando gradualmente o coração: banindo as distrações e os pensamentos errantes, concedendo à oração a sua pureza. A verdadeira oração é um dom de Deus; assim também são a atenção e a calorosa ternura do coração.
The first-fruits of prayer—attention and a warm tenderness of heart (p.124)
Any rule of prayer that is properly followed will produce as its first-fruits attention and a warm tenderness of heart; but especially will these things come from the practice of the Jesus Prayer, which stands on a higher level than psalmody and other forms of prayer. Attention gives birth to warm tenderness of heart, which in its turn increases attention. They grow in strength together, supporting each other. They give depth to prayer, gradually quickening the heart: banishing distraction and wandering thoughts, they bestow on prayer its purity. True prayer is a gift of God; so also are attention and warm tenderness of heart.
Natividade – Catedral de Chartres Séc. XIII
A prece do coração nunca chega prematuramente
Você deveria saber que a atenção nunca deve deixar o coração. O trabalho no coração, entretanto, algumas vezes torna-se apenas mental, executado pela mente, ao passo que outras vezes não é somente no coração, mas do coração, em outras palavras, ele se inicia e continua com caloroso sentimento. Esta lei aplica-se não somente a eremitas mas a todos os Cristão, a todos aqueles que gostariam de estar diante de Deus com o coração purificado e trabalhar diante da Sua Face. Se a mente se esgota dizendo as palavras da oração, então, ore sem palavras curvando-se diante do Senhor no íntimo do seu coração e doando-se a Ele. Esta é a oração real. As palavras são somente a expressão da prece e são sempre mais fracas aos olhos de Deus do que a própria prece.
A prece do coração nunca chega prematuramente. Com seu advento, Deus começa a trabalhar dentro de nós; na medida em que de modo crescente torna-se estabelecido no coração, este trabalho é levado cada vez mais à sua plenitude. Esta prece deve ser buscada sem meios esforços; então Deus, vendo nossa labuta, nos dará o que buscamos. A oração real não será obtida por esforços humanos; é um dom de Deus. Busque e você encontrará.
Você nada perdeu por não ter orado com técnicas artificiais para enxertar a oração; pois tais técnicas não são indispensáveis. O que é importante não é a posição do corpo mas o estado interior. Nossa inteira meta é permanecer com a atenção no coração, e olhar para Deus, e clamar a Ele.
De fato, eu nunca encontrei alguém que aprovasse as técnicas artificiais. Nem o Bispo Ignatii nem o Padre Makarii de Optina as aprovam.
Prayer of the heart never comes prematurely (p.124)
You should know that attention must never leave the heart. Work in the heart, however, is sometimes only mental,
performed by the mind, whereas sometimes it is not only in but of the heart, in other words, it is begun and continued with warm feeling. This law applies not just to hermits but to all Christians, to all who would stand before God in purity of heart and work before His Face. If the mind becomes exhausted by saying the words of the prayer, then pray without words, bowing down before the Lord inwardly in your heart and giving yourself to Him. This is true prayer. Words are only prayer's expression and are always weaker in God's eyes than prayer itself.
Prayer of the heart never comes prematurely. With its advent God begins to work within us; as it becomes increasingly estab¬lished in the heart this work is brought more and more to its fullness. This prayer must be sought with no scant effort; then God, seeing our travail, will give us what we seek. True prayer will not be achieved by human efforts; it is a gift of God. Seek and you will find.
It is no loss that you have prayed without using artificial tech¬niques to engraft the prayer; for such techniques are not indis¬pensable. What is important is not the position of the body but the inner state. Our whole aim is to stand with attention in the heart, and look towards God, and cry out to Him.
I have never in fact met anyone who approved of the artificial techniques. Neither Bishop Ignatii nor Father Makarii of Optina approve of them.
Nascimento de Cristo com Lâmpada
Os frutos naturais e o fruto da graça
Nossa meta é a arte da Oração de Jesus. Devemos tentar executá-la pura e simplesmente com nossa atenção no coração, sempre conservando a lembrança de Deus. Isto traz por si mesmo seus próprios frutos naturais – concentração da mente, devoção e temor de Deus, lembrança da morte, serenidade de pensamento e certo calor do coração. Todos estes são os frutos naturais da oração no coração e não são os frutos da graça. Este fato deve ser mantido bem em mente para que não nos vangloriemos a nós e aos outros e não nos tornemos arrogantes.
Nossa oração começa a ter valor quando vem a graça. Enquanto apenas obtivermos os frutos naturais da oração o que alcançamos é sem valor, tanto em si mesmo quanto diante do julgamento de Deus. Pois a chagada da graça é o sinal de que Deus olhou para nós com misericórdia.
Eu não posso lhe dizer como esta ação da graça se manifestará, mas é certo que a graça não pode surgir antes que estes frutos naturais da oração interior façam sua aparição.
Natural fruits and the fruit of grace (p.125)
Our task is the art of the Jesus Prayer. We must try to perform it quite simply, with our attention in the heart, always preserving the remembrance of God. This brings by itself its own natural fruit—collectedness of mind, devoutness and fear of God, recollection of death, stillness of thought, and a certain warmth of heart. All these are natural fruits of prayer in the heart, and are not the fruit of grace. This fact must be kept well in mind, lest we boast to ourselves and to others and become proud.
Our prayer begins to be of value only when grace comes. As long as we have only the natural fruits of prayer, what we achieve is valueless, both in itself and in the judgement of God. For the coming of grace is the sign that God has looked on us in mercy.
I cannot tell you just how this action of grace will be made manifest, but it is certain that grace cannot come before these natural fruits of inner prayer have made their appearance.
Mãe de Deus “Znameniye” – Ícone Russo – Primeiro quarto do Séc. XVIII.
Os frutos naturais são acessíveis a todos
O fruto da oração é a concentração da atenção no coração acompanhado por um sentimento de calor. Este é o efeito natural. Qualquer pessoa pode obtê-lo. E digo: quaisquer pessoas, não somente os monges mas os leigos também, podem executar uma prece de tal tipo.
Esta espécie de trabalho é simples, e não está num nível elevado. A Oração de Jesus por si mesma não é milagrosa, mas como qualquer outra oração curta é oral e consequentemente externa. Ainda assim ela pode tornar-se uma prece da mente-no-coração de um modo inteiramente natural. Em relação àquilo que vem da graça, por outro lado, a isto devemos simplesmente esperar; nenhuma espécie de técnica pode apreendê-lo pela força.
Quando se está ocupado com a oração contemplativa superior, é necessário em primeiro lugar purificar-se das paixões. Mas aqui estamos ocupados com a oração simples, embora ela possa nos conduzir à oração superior.
Para que a prática da oração prossiga sendo bem sucedida, é sempre essencial de início colocar tudo de lado, de modo que o coração fique completamente livre das distrações. Nada deveria introduzir-se na mente: nenhuma face, nenhuma atividade, nenhum objeto. Neste momento tudo deve ser afastado. Cumpra esta regra e não haverá necessidade de desistir de tal prece, que é para ser dita a qualquer momento. Tão logo você esteja livre, volte imediatamente para ela.
Durante o serviço a atenção deve ser mantida na cerimônia, mas quando algo é indistintamente lido ou cantado, repita a Oração de Jesus.
The natural fruits are accessible to all (p.126)
The fruit of prayer is the concentration of attention in the heart accompanied by a feeling of warmth. This is the natural effect. Everyone can achieve it. And everyone, not only monks but laymen as well, can perform prayer of such a kind.
This sort of work is simple, and not on a high level. The Jesus Prayer is not in itself miraculous, but like any other short prayer it is oral and consequently external. Yet it can become the prayer of mind-in-heart in a wholly natural way. As for what comes from grace, on the other hand, this we must simply await; no kind of technique can lay hold on it by force.
When concerned with high contemplative prayer, it is neces¬sary in the first place to be cleansed of passions. But here we are concerned with simple prayer, although this may lead to higher prayer.
If the practice of prayer is to proceed successfully, it is always essential at the outset to lay everything else aside, so that the heart is completely free of distraction. Nothing should obtrude on the mind: neither face, nor activity, nor object. At such a time all is to be driven out. Keep to this rule and there will be no need to desist from such prayer, which is to be said at any time. As soon as you are free, return to it immediately.
During the service attention must be paid to the office, but when something is read or sung indistinctly, repeat the Jesus Prayer.
Profeta Joel e Inscrição do Filactério - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Os perigos da distração
Como uma permissão especial, você consentiu-se a uma pequena distração e não tomou bastante cuidado na vigilância de seus olhos, de sua língua e de seus pensamentos. Assim o calor se foi e lhe deixou vazio. Isto é ruim. Apresse-se a restabelecer a ordem interior apropriada, ou a recebê-la novamente em resposta às suas preces. Confine-se dentro, e nada mais faça que orar e ler sobre a oração até que sua atenção se una a Deus no coração, e um espírito de contrição e uma calorosa ternura sejam ali restabelecidos: este espírito lhe fará saber claramente se você está no correto estado ou desviou-se dele. Você parece considerar a atenção como uma excessiva austeridade, enquanto que na verdade é a raiz de nossa vida espiritual interior. Esta é a razão pela qual o inimigo tão particularmente toma armas contra ela, e usa de todos os meios para formar atrativas imagens diante dos olhos da alma, e sugere pensamentos sobre permissões especiais e distrações.
The dangers of distraction (p.127)
As a special favour, you have allowed yourself a little distraction and have not taken enough care to keep watch over your eyes, your tongue, and your thoughts. So warmth has gone from you, and you are left empty. This is bad. Hasten to re-establish the proper inner order, or to receive it again in answer to your prayers. Shut yourself in, and do nothing but pray and read about prayer until your attention unites with God in the heart, and a spirit of contrition and warm tenderness is established there: this spirit will make it clear to you whether you are in the right state or have turned aside from it. You seem to regard attention as an excessive austerity, whereas in fact it is the root of all our inner spiritual life. This is why the enemy so particularly takes up arms against it, and uses every means to build up attractive images before the eyes of the soul, and suggests thoughts about special favours and distractions.
Profeta Joel - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Dor no coração
Quer seja a Oração de Jesus quer seja qualquer outra oração curta, é bom que ela sempre esteja na boca. Apenas tome cuidado para que a atenção esteja no coração e não na cabeça, e mantenha isto não somente quando em oração mas também em todos os outros momentos também. Tente obter uma espécie de dor em seu coração. Com esforço constante obterá isto rapidamente. Não há nada de peculiar nisto: o surgimento desta dor é um efeito natural. Irá lhe ajudar a recolher-se melhor. Mas a coisa principal é que o Senhor, que vê seu esforço, lhe dará ajuda e a graça na oração. Uma ordem diferente irá, então, estabelecer-se no coração.
Soreness in the heart (p.127)
Whether it be the Jesus Prayer or any other short prayer, it is good if it is always in the mouth. Only take care that the attention is in the heart and not in the head, and hold to this not only when standing in prayer but at all other times as well. Try to acquire a kind of soreness in your heart. Constant effort will achieve this quickly. There is nothing peculiar in this: the appearance of this pain is a natural effect. It will help you to collect yourself better. But the chief thing is that the Lord, who sees your effort, will give you help and grace in prayer. A different order will then be established in the heart.
Profeta Jonas - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Início da reintegração interna
Continue a praticar esta regra, e seus pensamentos irão gradualmente acalmar-se mais e mais, enquanto a debilidade que você notou será curada. Se perseverar no modo correto, isto criará uma dor em seu coração e esta dor fará com que seus pensamentos liguem-se apenas a Deus; e assim, a divagação dos pensamentos cessará. A partir desse momento, se nosso Senhor o conceder, a reintegração de todo nosso ser interior se inicia e nós nunca deixaremos de caminhar diante Dele.
Inner reintegration begins (p.127)
Continue to practise this rule, and your thoughts will gradually quieten down more and more, while the debility you have noticed will be cured. If you persevere in the right way, it will create a soreness in your heart, and this pain will make your thoughts cleave to God alone; and so the wandering of your thoughts will cease. From that moment, if our Lord grants it, the reintegration of all our inner being commences and we never cease to walk before Him.
Profeta Jonas e Inscrição do Filactério - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Apaixonando-se pela doçura espiritual
Você diz que teme apaixonar-se pela doçura espiritual. E, certamente, você não pode pensar em fazer tal coisa. Não é pela sua doçura que se pratica a oração, mas porque é nosso dever servir a Deus desta maneira, embora a doçura vá com a necessidade do verdadeiro serviço. A coisa mais importante na prece é permanecer diante de Deus com temor e reverência, com a mente no coração; pois isto modera e dispersa toda tolice e planta, no coração, a contrição diante de Deus. Estes sentimentos de temor e aflição aos olhos de Deus, o coração contrito e submisso, são as principais características da oração interna real, e o teste de todas as orações, pelo qual podemos dizer se nossa oração está sendo executada como deveria ou não. Se eles estão presentes a oração está em ordem. Quando eles estão ausentes a oração não está no seu verdadeiro caminho e deve ser trazida de volta à sua apropriada condição. Se não produzimos esta sensação de temor e contrição, então a doçura e o calor podem gerar presunção; e isto é arrogância espiritual; e conduzirá a uma perniciosa ilusão. Logo, a doçura e o calor desaparecerão, deixando apenas memórias, mas a alma ainda irá imaginar que os tem. Disto você deveria ter medo, e por isto deveria estimular em seu coração, de modo crescente, o temor a Deus, a humildade, e uma contrita prostração diante Dele, sempre caminhando em Sua presença. Esta é a essência da questão.
Falling in love with spiritual sweetness (p.128)
You say that you are afraid of falling in love with spiritual sweetness. But you surely cannot think of doing any such thing. It is not for its sweetness that prayer is practised, but because it is our duty to serve God in this way, although sweetness goes of necessity with true service. The most important thing in prayer is to stand before God in reverence and fear, with the mind in the heart; for this sobers and disperses every folly and plants contrition before God in the heart. These feelings of fear and sorrow in the sight of God, the broken and contrite heart, are the principal features of true inner prayer, and the test of every prayer, by which we can tell whether or not our prayer is performed as it should be. If they are present, prayer is in order. When they are absent, prayer is not in its true course and must be brought back to its proper condition. If we lack this sense of sorrow and contrition, then sweetness and warmth may breed self-conceit; and that is spiritual pride, and will lead to pernicious illusion. Then the sweetness and warmth will vanish, leaving only their memory, but the soul will still imagine that it has them. Of this you should be afraid, and so you must increasingly kindle in your heart the fear of God, lowliness, and contrite prostration before Him, walking always in His presence. This is the heart of the matter.
Crucifixo Dourado com Cabeça de Cristo em Lápis Lazúli – Alemanha - 1050
A instabilidade da doçura interior
Não fique atraído pela doçura interior: sem a Cruz ela é instável e perigosa.
Considere a todos como sendo melhores que você. Sem este pensamento mesmo um operador de milagres está distante de Deus.
The instability of inner sweetness (p.128)
‘Do not become attracted by inner sweetness: without the Cross it is unstable and dangerous.
Consider every one to be better than yourself. Without this thought even a worker of miracles is far from God.
Jesus Cristo – Agonia no Jardim de Getsêmane – Aleijadinho – Congonhas do Campo - MG - 1799
Sobriedade da mente e calor do coração
Cumprindo a regra com zelo, proteja a sobriedade da mente e o calor do coração. Se este último começa a diminuir, apresse-se a aquecê-lo, estando convencido de que seu desaparecimento significará que você se afastou mais de meio caminho de Deus. O temor de Deus é o guardião e revigorador do calor interno, mas a humildade também é necessária, a paciência, a fidelidade às regras e, acima tudo, a sobriedade. Vigie a si mesmo de perto, por causa de Deus. Desperte-se se você tornou-se sonolento, erga-se de todos os modos para não cair no sono.
Sobriety of mind and warmth of heart (p.129)
Fulfilling the rule zealously, preserve sobriety of mind and warmth of heart. If the latter begins to diminish, hasten to warm it, being convinced that its disappearance will mean that you have withdrawn more than halfway from God. The fear of God is the guardian and quickener of interior warmth, but humility is also necessary, and patience, and fidelity to rules, and above all, sobri¬ety. Watch yourself closely, for the sake of God. Wake yourself if you have grown drowsy, rouse yourself up in every way so as not to fall asleep.
Homem matando Serpente diante do Portão Estreito – Papiro de Ani – Egito (1250 A.C.)
Sobriedade e discernimento
Os guerreiros de Cristo deveriam manter estreita vigilância sobre duas coisas em particular: sobriedade e discernimento. A primeira é dirigida para dentro, a segunda para fora. Com a sobriedade observamos os movimentos que emergem do próprio coração; com o discernimento nós antevemos os movimentos que estão para surgir nele sob o impulso das influências externas. A regra para a sobriedade é: depois que cada pensamento tenha sido banido da alma pela lembrança da presença de Deus, fique de pé na porta do coração e vigie cuidadosamente tudo que entra e que sai dali. Em especial, não permita que suas ações sejam prejudicadas pela emoção e pelo desejo, pois todo mal vem daí.
Sobriety and discernment (p.129)
The warriors of Christ should keep watchful guard over two things in particular: sobriety and discernment. The first is directed within, the second outward. With sobriety we observe movements which come out of the heart itself; with discernment we foresee movements which are about to be roused in it under the impulse of external influences. The rule for sobriety is: after every thought has been banished from the soul by the memory of God's presence, stand at the door of the heart and watch carefully everything that enters or goes out from there. Especially do not let your actions be prejudiced by emotion and desire, for all evil comes thence.
Jesus Cristo – Prisão no Horto das Oliveiras – Aleijadinho – Congonhas do Campo - MG - 1799
Seja sóbrio, esteja vigilante
Ser sóbrio significa não permitir que o coração se apegue a qualquer coisa que não seja Deus. Ligar-se a outras coisas embebeda a alma, e ela começa a fazer muitas e inumeráveis coisas. Estar vigilante significa vigiar cuidadosamente para que nada de mal brote no coração.
Be sober, be vigilant (p. 129)
To be sober means not to let the heart cling to anything except God. Cleaving to other things makes the soul drunk, and it begins to do quite unaccountable things. To be vigilant means to watch carefully, lest something evil springs up in the heart.
Buda Retornando das Montanhas – Séc. XVIII
Humildade e calor do coração
Você ainda conserva seu estado de calor espiritual? Deveria ser conservado. Sua base é a humildade. Tão logo a humildade diminui, entra a frieza. Pois quando a alma começa a se considerar como algo importante, o Senhor se afasta de uma só vez; e, deixada por si só, a alma esfria. Não é somente com a língua que deveríamos ficar dizendo: “Eu não sou nada”, mas deveríamos sentir nossa nulidade no coração. Então o Senhor sempre estará ali, Aquele que cria e criou todas as coisas do nada. O Senhor dará o calor, mas devemos fazer a nossa própria parte também.
Com o que, pois, contribuímos para este trabalho? Humildade e atenção, e uma sofrida submissão a Deus nas profundezas do coração, que deveria continuar incessantemente com tudo que possamos estar fazendo ou dizendo, se estamos sentados ou nos movimentando por aí, seja em casa ou na igreja. Que o Senhor lhe conceda sabedoria. Leia as sagradas escrituras, reflita sobre elas, e absorva tudo o que é útil, aplicando-as à sua vida e à sua alma.
Humility and warmth of heart (p.130)
Have you still preserved your state of spiritual warmth? It should be preserved. Its basis is humility. As soon as humility decreases, coolness enters. For when the soul begins to regard itself as something important, the Lord at once withdraws; and, left by itself, the soul grows cold. It is not just with the tongue that we should keep saying “I am nothing”, but we should feel our nothingness in the heart. Then the Lord will always be there, He who creates and has created everything out of nothing. The Lord will give warmth, but we must do our own part as well.
What, then, can we contribute to this work? Humility and attention, and a suffering submission to God in the depths of the heart, which should continue unceasingly whatever we may be doing or saying, whether we are sitting down or moving about, whether at home or in church. May the Lord grant you wisdom. Read holy writings, reflect upon them, and absorb all that is useful, applying it to your life and to your soul.
Teto com Olho de Deus – Catedral de John Hertogenbosch Holanda - 1525
Leitura espiritual. O temor de Deus
Você tem um livro? Então o leia, reflita sobre aquilo que ele diz, e aplique as palavras para si mesmo. Aplicar o conteúdo em si mesmo é o propósito e o fruto da leitura. Se você ler sem aplicar o que é lido em si mesmo, nada bom virá e pode até resultar prejudicial. Teorias se acumularão na cabeça, levando você a criticar os outros ao invés de melhorar sua própria vida. Portanto, tenha ouvidos e ouça. Se você já tem a Filocalia, dê uma olhada em Hesíquio e leia o que ele diz sobre a sobriedade. Ele dá direções exatas de como controlar e pôr os pensamentos em ordem. Leia suas palavras atentamente, tome-as no seu coração, e então aja como sugerido.
Nós sempre deveríamos nos agarrar ao temor de Deus. É a raiz de todo conhecimento espiritual e de toda ação correta. Quando o temor a Deus governa a alma tudo vai bem tanto dentro como fora. Tente acender este sentimento de temor em seu coração a cada manhã antes de fazer qualquer outra coisa. Então ele irá trabalhando por si mesmo como uma espécie de pêndulo.
Spiritual reading. The fear of God (p. 130)
You have a book? Then read it, reflect on what it says, and apply the words to yourself. To apply the content to oneself is the purpose and fruit of reading. If you read without applying what is read to yourself, nothing good will come of it, and even harm may result. Theories will accumulate in the head, leading you to criticise others instead of improving your own life. So have ears and hear. If you already have the Philokalia, look up Hesychios and read what he says on sobriety. He gives exact directions how to control and set in order one's thoughts. Read his words attentively, take them in with your heart, and then act as suggested.
We should always hold fast to the fear of God. It is the root of all spiritual knowledge and all right action. When the fear of God rules in the soul everything goes well both within and without. Try to kindle this sense of fear in your heart every morning before you do anything else. Then it will go on working by itself as a kind of pendulum.
Mão de Deus – Afresco Romanesco - Séc. XII
O principal fruto da oração
O principal fruto da oração não é calor nem doçura, mas temor a Deus e contrição.
The principal fruit of prayer (p. 131)
The principal fruit of prayer is not warmth and sweetness, but fear of God and contrition.
Criação de Adão – Michelangelo – Capela Sistina – 1508/1512
A raiz da ordem interior
A raiz da boa ordem interior é o temor a Deus. Conserve este temor dentro de você constantemente: ele manterá todas as coisas bem esticadas e não permitirá nenhuma lassidão, seja nos pensamentos ou no aparato físico, criando um coração vigilante e uma mente sóbria, e não permitindo nenhum torpor corporal ou obscuridade de pensamento.
Mas deve-se sempre lembrar que o sucesso em qualquer aspecto da vida espiritual é o fruto da graça de Deus. A vida espiritual vem inteiramente do Seu mais sagrado Espírito. Nós temos nosso próprio espírito, porém ele está sem energia. Ele começa a se fortalecer somente quando a graça de Deus flui para ele.
The root of inner order (p. 131)
The root of good inner order is the fear of God. Preserve this fear within you constantly: it will hold everything taut, and will allow no slackness either in physical members or thoughts, creating a vigilant heart and a sober mind, and allowing no bodily torpor or blurring of thought.
But one must always remember that success in any aspect of the spiritual life is the fruit of the grace of God. Spiritual life comes entirely from His most holy Spirit. We have our own spirit but it is void of power. It begins to gain strength only when the grace of God flows into it.
Êxtase de Santa Teresa – Gian Lorenzo Bernini –
Igreja de Santa Maria della Vitoria – Roma - 1652
Sentimentos de êxtase
O que você deve buscar na oração é estabelecer no coração um calmo e caloroso sentimento para com Deus, não criando expectativas sobre êxtases ou qualquer estado extraordinário. Todavia, quando Deus envia tais sentimentos especiais na oração você deve ser grato por eles e não imaginar que eles ocorrem devido a você, e nem lamentar o desaparecimento deles como se fosse uma grande perda; mas sempre descer destas alturas para a humildade e serenidade de sentimento para com o Senhor.
Feelings of ecstasy (p. 131)
What you must seek in prayer is to establish in the heart a quiet but warm and constant feeling towards God, not expecting ecstasy or any extraordinary state. But when God does send such special feelings in prayer, you must be grateful for them and not imagine that they are due to yourself, nor regret their disappear¬ance as if it were a great loss; but always descend from these heights to humility and quietness of feeling towards the Lord.
A Parábola das Virgens Prudentes e das Tolas (Mateus 25,13) – William Blake - 1822
Esforços humanos e os frutos do Espírito
A menos que estejamos adornados com simplicidade e bondade, a aparência exterior e a atitude da oração não nos trarão proveito algum. Isto é verdadeiro não somente a respeito da oração, mas a respeito de qualquer trabalho ou esforço, tais como virgindade ou jejum, ou qualquer espécie de trabalho que seja feito por causa da virtude. Se não vemos abundantemente em nós mesmos os frutos do amor, a paz, felicidade e mansidão, os frutos da humildade, simplicidade e sinceridade, os da fé e os da paciência, então trabalhamos sem proveito e em vão: pois todo o propósito do nosso trabalho e labuta foi para ganhar estes frutos. Se os frutos do amor e da paz não estão em nós, então todo nosso trabalho foi inútil e em vão. Aqueles que labutam deste modo, provarão ser, no dia do julgamento, como as cinco virgens tolas que assim foram chamadas porque ainda não tinham no vaso dos seus corações o óleo espiritual, isto é, as virtudes que mencionamos; e assim elas foram expulsas da festa de núpcias, não obtendo nenhum proveito de suas virgindades. Agricultores que trabalham em uma vinha empreendem todo o próprio trabalho na esperança de obter fruto, e se não há fruto tudo fica sem propósito; e do mesmo modo, se não vemos em nós mesmos, através da ação do Espírito, os frutos do amor, paz, felicidade, humildade, e todas as outras virtudes enumeradas pelo Apóstolo (Gl. v. 22); se não sentimos com plena segurança e percepção espiritual que eles estão presentes dentro de nós, então todo o trabalho de castidade, oração, salmodia, jejum, e vigília se mostrarão em vão e sem proveito. Pois estes trabalhos da alma e do corpo devem ser praticados na esperança da obtenção dos frutos espirituais; e o fruto do Espírito que as virtudes carregam é um contentamento espiritual de um prazer incorruptível, conferido pelo Espírito sobre o coração dos fiéis. Portanto, esforços e empenhos deveriam ser simplesmente considerados – pois assim são em verdade – apenas como esforços e empenhos e nada mais do que isso, e o fruto considerado como fruto. Mas se, por causa de conhecimento insuficiente, alguém chegue a considerar seu esforço e empenho como o fruto do Espírito, ele se engana completamente; e através desta falsa opinião priva a si mesmo dos frutos reais do Espírito, que são incomparavelmente maiores.
Human efforts and the fruits of the Spirit (p. 131)
Unless we are adorned with simplicity and goodness, the out¬ward semblance and attitude of prayer will profit us nothing. This is true not only of prayer, but of any labour or endeavour, such as virginity or fasting, or any kind of work whatever done for the sake of virtue. If we do not see abundantly present in ourselves the fruits of love, peace, joy and meekness, of humility, simplicity and sincerity, of faith and long-suffering, then we have laboured without profit and in vain: for the whole purpose of our labour and toil was to gain these fruits. If the fruits of love and peace are not in us, then our entire labour has been useless and in vain. Those who toil in such a way, on the day of judgement will prove to be like the five foolish virgins who were called foolish because they did not yet have in the vessels of their hearts the spiritual oil, that is, the virtues which we mentioned; and so they were shut out from the marriage feast, gaining no profit from their virginity. Husbandmen who work in a vineyard undergo all their labour and care in the hope of obtaining fruit, and if there is no fruit all their work proves to no purpose; and in the same way, if we do not see in ourselves, through the action of the Spirit, the fruits of love, peace, joy, humility, and all the other virtues enumerated by the Apostle (Gal. v, 22), if we do not feel in full assurance and spiritual perception that they are present within us, then all the labour of chastity, prayer, psalmody, fasting, and vigil will prove in vain and profitless. For these labours of soul and body must be practised in the hope of gaining spiritual fruits; and the fruit of the Spirit that the virtues bear is spiritual enjoyment of an uncorrupted delight, conferred by the Spirit upon the hearts of the faithful. Therefore efforts and endeavours should simply be regarded—for such they are in truth—as efforts and endeavours and no more, and the fruit as fruit. But if, because of insufficient knowledge, anyone comes to regard his effort and endeavour as the fruit of the Spirit, he deceives himself utterly; and by this false opinion deprives himself of the real fruits of the Spirit, which are incomparably great.
Uma Antologia Ortodoxa
compilada pelo
Hegúmeno Chariton de Valamo
CAPÍTULO IV
OS FRUTOS DA ORAÇÃO
por Teófan, o Recluso.
(i) ATENÇÃO E TEMOR DE DEUS
Os primeiros frutos da oração – atenção e uma calorosa ternura do coração
Qualquer regra de oração que é apropriadamente executada produzirá como seus primeiros frutos atenção e uma calorosa ternura do coração ; mas estas coisas virão especialmente da prática da Oração de Jesus, que se situa num nível superior que a salmodia e outras formas de prece. A atenção dá nascimento à calorosa ternura do coração, que por sua vez faz aumentar a atenção. Eles se fortificam juntos, apoiando um ao outro. Eles dão profundidade à oração, ativando gradualmente o coração: banindo as distrações e os pensamentos errantes, concedendo à oração a sua pureza. A verdadeira oração é um dom de Deus; assim também são a atenção e a calorosa ternura do coração.
The first-fruits of prayer—attention and a warm tenderness of heart (p.124)
Any rule of prayer that is properly followed will produce as its first-fruits attention and a warm tenderness of heart; but especially will these things come from the practice of the Jesus Prayer, which stands on a higher level than psalmody and other forms of prayer. Attention gives birth to warm tenderness of heart, which in its turn increases attention. They grow in strength together, supporting each other. They give depth to prayer, gradually quickening the heart: banishing distraction and wandering thoughts, they bestow on prayer its purity. True prayer is a gift of God; so also are attention and warm tenderness of heart.
Natividade – Catedral de Chartres Séc. XIII
A prece do coração nunca chega prematuramente
Você deveria saber que a atenção nunca deve deixar o coração. O trabalho no coração, entretanto, algumas vezes torna-se apenas mental, executado pela mente, ao passo que outras vezes não é somente no coração, mas do coração, em outras palavras, ele se inicia e continua com caloroso sentimento. Esta lei aplica-se não somente a eremitas mas a todos os Cristão, a todos aqueles que gostariam de estar diante de Deus com o coração purificado e trabalhar diante da Sua Face. Se a mente se esgota dizendo as palavras da oração, então, ore sem palavras curvando-se diante do Senhor no íntimo do seu coração e doando-se a Ele. Esta é a oração real. As palavras são somente a expressão da prece e são sempre mais fracas aos olhos de Deus do que a própria prece.
A prece do coração nunca chega prematuramente. Com seu advento, Deus começa a trabalhar dentro de nós; na medida em que de modo crescente torna-se estabelecido no coração, este trabalho é levado cada vez mais à sua plenitude. Esta prece deve ser buscada sem meios esforços; então Deus, vendo nossa labuta, nos dará o que buscamos. A oração real não será obtida por esforços humanos; é um dom de Deus. Busque e você encontrará.
Você nada perdeu por não ter orado com técnicas artificiais para enxertar a oração; pois tais técnicas não são indispensáveis. O que é importante não é a posição do corpo mas o estado interior. Nossa inteira meta é permanecer com a atenção no coração, e olhar para Deus, e clamar a Ele.
De fato, eu nunca encontrei alguém que aprovasse as técnicas artificiais. Nem o Bispo Ignatii nem o Padre Makarii de Optina as aprovam.
Prayer of the heart never comes prematurely (p.124)
You should know that attention must never leave the heart. Work in the heart, however, is sometimes only mental,
performed by the mind, whereas sometimes it is not only in but of the heart, in other words, it is begun and continued with warm feeling. This law applies not just to hermits but to all Christians, to all who would stand before God in purity of heart and work before His Face. If the mind becomes exhausted by saying the words of the prayer, then pray without words, bowing down before the Lord inwardly in your heart and giving yourself to Him. This is true prayer. Words are only prayer's expression and are always weaker in God's eyes than prayer itself.
Prayer of the heart never comes prematurely. With its advent God begins to work within us; as it becomes increasingly estab¬lished in the heart this work is brought more and more to its fullness. This prayer must be sought with no scant effort; then God, seeing our travail, will give us what we seek. True prayer will not be achieved by human efforts; it is a gift of God. Seek and you will find.
It is no loss that you have prayed without using artificial tech¬niques to engraft the prayer; for such techniques are not indis¬pensable. What is important is not the position of the body but the inner state. Our whole aim is to stand with attention in the heart, and look towards God, and cry out to Him.
I have never in fact met anyone who approved of the artificial techniques. Neither Bishop Ignatii nor Father Makarii of Optina approve of them.
Nascimento de Cristo com Lâmpada
Os frutos naturais e o fruto da graça
Nossa meta é a arte da Oração de Jesus. Devemos tentar executá-la pura e simplesmente com nossa atenção no coração, sempre conservando a lembrança de Deus. Isto traz por si mesmo seus próprios frutos naturais – concentração da mente, devoção e temor de Deus, lembrança da morte, serenidade de pensamento e certo calor do coração. Todos estes são os frutos naturais da oração no coração e não são os frutos da graça. Este fato deve ser mantido bem em mente para que não nos vangloriemos a nós e aos outros e não nos tornemos arrogantes.
Nossa oração começa a ter valor quando vem a graça. Enquanto apenas obtivermos os frutos naturais da oração o que alcançamos é sem valor, tanto em si mesmo quanto diante do julgamento de Deus. Pois a chagada da graça é o sinal de que Deus olhou para nós com misericórdia.
Eu não posso lhe dizer como esta ação da graça se manifestará, mas é certo que a graça não pode surgir antes que estes frutos naturais da oração interior façam sua aparição.
Natural fruits and the fruit of grace (p.125)
Our task is the art of the Jesus Prayer. We must try to perform it quite simply, with our attention in the heart, always preserving the remembrance of God. This brings by itself its own natural fruit—collectedness of mind, devoutness and fear of God, recollection of death, stillness of thought, and a certain warmth of heart. All these are natural fruits of prayer in the heart, and are not the fruit of grace. This fact must be kept well in mind, lest we boast to ourselves and to others and become proud.
Our prayer begins to be of value only when grace comes. As long as we have only the natural fruits of prayer, what we achieve is valueless, both in itself and in the judgement of God. For the coming of grace is the sign that God has looked on us in mercy.
I cannot tell you just how this action of grace will be made manifest, but it is certain that grace cannot come before these natural fruits of inner prayer have made their appearance.
Mãe de Deus “Znameniye” – Ícone Russo – Primeiro quarto do Séc. XVIII.
Os frutos naturais são acessíveis a todos
O fruto da oração é a concentração da atenção no coração acompanhado por um sentimento de calor. Este é o efeito natural. Qualquer pessoa pode obtê-lo. E digo: quaisquer pessoas, não somente os monges mas os leigos também, podem executar uma prece de tal tipo.
Esta espécie de trabalho é simples, e não está num nível elevado. A Oração de Jesus por si mesma não é milagrosa, mas como qualquer outra oração curta é oral e consequentemente externa. Ainda assim ela pode tornar-se uma prece da mente-no-coração de um modo inteiramente natural. Em relação àquilo que vem da graça, por outro lado, a isto devemos simplesmente esperar; nenhuma espécie de técnica pode apreendê-lo pela força.
Quando se está ocupado com a oração contemplativa superior, é necessário em primeiro lugar purificar-se das paixões. Mas aqui estamos ocupados com a oração simples, embora ela possa nos conduzir à oração superior.
Para que a prática da oração prossiga sendo bem sucedida, é sempre essencial de início colocar tudo de lado, de modo que o coração fique completamente livre das distrações. Nada deveria introduzir-se na mente: nenhuma face, nenhuma atividade, nenhum objeto. Neste momento tudo deve ser afastado. Cumpra esta regra e não haverá necessidade de desistir de tal prece, que é para ser dita a qualquer momento. Tão logo você esteja livre, volte imediatamente para ela.
Durante o serviço a atenção deve ser mantida na cerimônia, mas quando algo é indistintamente lido ou cantado, repita a Oração de Jesus.
The natural fruits are accessible to all (p.126)
The fruit of prayer is the concentration of attention in the heart accompanied by a feeling of warmth. This is the natural effect. Everyone can achieve it. And everyone, not only monks but laymen as well, can perform prayer of such a kind.
This sort of work is simple, and not on a high level. The Jesus Prayer is not in itself miraculous, but like any other short prayer it is oral and consequently external. Yet it can become the prayer of mind-in-heart in a wholly natural way. As for what comes from grace, on the other hand, this we must simply await; no kind of technique can lay hold on it by force.
When concerned with high contemplative prayer, it is neces¬sary in the first place to be cleansed of passions. But here we are concerned with simple prayer, although this may lead to higher prayer.
If the practice of prayer is to proceed successfully, it is always essential at the outset to lay everything else aside, so that the heart is completely free of distraction. Nothing should obtrude on the mind: neither face, nor activity, nor object. At such a time all is to be driven out. Keep to this rule and there will be no need to desist from such prayer, which is to be said at any time. As soon as you are free, return to it immediately.
During the service attention must be paid to the office, but when something is read or sung indistinctly, repeat the Jesus Prayer.
Profeta Joel e Inscrição do Filactério - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Os perigos da distração
Como uma permissão especial, você consentiu-se a uma pequena distração e não tomou bastante cuidado na vigilância de seus olhos, de sua língua e de seus pensamentos. Assim o calor se foi e lhe deixou vazio. Isto é ruim. Apresse-se a restabelecer a ordem interior apropriada, ou a recebê-la novamente em resposta às suas preces. Confine-se dentro, e nada mais faça que orar e ler sobre a oração até que sua atenção se una a Deus no coração, e um espírito de contrição e uma calorosa ternura sejam ali restabelecidos: este espírito lhe fará saber claramente se você está no correto estado ou desviou-se dele. Você parece considerar a atenção como uma excessiva austeridade, enquanto que na verdade é a raiz de nossa vida espiritual interior. Esta é a razão pela qual o inimigo tão particularmente toma armas contra ela, e usa de todos os meios para formar atrativas imagens diante dos olhos da alma, e sugere pensamentos sobre permissões especiais e distrações.
The dangers of distraction (p.127)
As a special favour, you have allowed yourself a little distraction and have not taken enough care to keep watch over your eyes, your tongue, and your thoughts. So warmth has gone from you, and you are left empty. This is bad. Hasten to re-establish the proper inner order, or to receive it again in answer to your prayers. Shut yourself in, and do nothing but pray and read about prayer until your attention unites with God in the heart, and a spirit of contrition and warm tenderness is established there: this spirit will make it clear to you whether you are in the right state or have turned aside from it. You seem to regard attention as an excessive austerity, whereas in fact it is the root of all our inner spiritual life. This is why the enemy so particularly takes up arms against it, and uses every means to build up attractive images before the eyes of the soul, and suggests thoughts about special favours and distractions.
Profeta Joel - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Dor no coração
Quer seja a Oração de Jesus quer seja qualquer outra oração curta, é bom que ela sempre esteja na boca. Apenas tome cuidado para que a atenção esteja no coração e não na cabeça, e mantenha isto não somente quando em oração mas também em todos os outros momentos também. Tente obter uma espécie de dor em seu coração. Com esforço constante obterá isto rapidamente. Não há nada de peculiar nisto: o surgimento desta dor é um efeito natural. Irá lhe ajudar a recolher-se melhor. Mas a coisa principal é que o Senhor, que vê seu esforço, lhe dará ajuda e a graça na oração. Uma ordem diferente irá, então, estabelecer-se no coração.
Soreness in the heart (p.127)
Whether it be the Jesus Prayer or any other short prayer, it is good if it is always in the mouth. Only take care that the attention is in the heart and not in the head, and hold to this not only when standing in prayer but at all other times as well. Try to acquire a kind of soreness in your heart. Constant effort will achieve this quickly. There is nothing peculiar in this: the appearance of this pain is a natural effect. It will help you to collect yourself better. But the chief thing is that the Lord, who sees your effort, will give you help and grace in prayer. A different order will then be established in the heart.
Profeta Jonas - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Início da reintegração interna
Continue a praticar esta regra, e seus pensamentos irão gradualmente acalmar-se mais e mais, enquanto a debilidade que você notou será curada. Se perseverar no modo correto, isto criará uma dor em seu coração e esta dor fará com que seus pensamentos liguem-se apenas a Deus; e assim, a divagação dos pensamentos cessará. A partir desse momento, se nosso Senhor o conceder, a reintegração de todo nosso ser interior se inicia e nós nunca deixaremos de caminhar diante Dele.
Inner reintegration begins (p.127)
Continue to practise this rule, and your thoughts will gradually quieten down more and more, while the debility you have noticed will be cured. If you persevere in the right way, it will create a soreness in your heart, and this pain will make your thoughts cleave to God alone; and so the wandering of your thoughts will cease. From that moment, if our Lord grants it, the reintegration of all our inner being commences and we never cease to walk before Him.
Profeta Jonas e Inscrição do Filactério - Aleijadinho – Congonhas do Campo – MG - 1805
Apaixonando-se pela doçura espiritual
Você diz que teme apaixonar-se pela doçura espiritual. E, certamente, você não pode pensar em fazer tal coisa. Não é pela sua doçura que se pratica a oração, mas porque é nosso dever servir a Deus desta maneira, embora a doçura vá com a necessidade do verdadeiro serviço. A coisa mais importante na prece é permanecer diante de Deus com temor e reverência, com a mente no coração; pois isto modera e dispersa toda tolice e planta, no coração, a contrição diante de Deus. Estes sentimentos de temor e aflição aos olhos de Deus, o coração contrito e submisso, são as principais características da oração interna real, e o teste de todas as orações, pelo qual podemos dizer se nossa oração está sendo executada como deveria ou não. Se eles estão presentes a oração está em ordem. Quando eles estão ausentes a oração não está no seu verdadeiro caminho e deve ser trazida de volta à sua apropriada condição. Se não produzimos esta sensação de temor e contrição, então a doçura e o calor podem gerar presunção; e isto é arrogância espiritual; e conduzirá a uma perniciosa ilusão. Logo, a doçura e o calor desaparecerão, deixando apenas memórias, mas a alma ainda irá imaginar que os tem. Disto você deveria ter medo, e por isto deveria estimular em seu coração, de modo crescente, o temor a Deus, a humildade, e uma contrita prostração diante Dele, sempre caminhando em Sua presença. Esta é a essência da questão.
Falling in love with spiritual sweetness (p.128)
You say that you are afraid of falling in love with spiritual sweetness. But you surely cannot think of doing any such thing. It is not for its sweetness that prayer is practised, but because it is our duty to serve God in this way, although sweetness goes of necessity with true service. The most important thing in prayer is to stand before God in reverence and fear, with the mind in the heart; for this sobers and disperses every folly and plants contrition before God in the heart. These feelings of fear and sorrow in the sight of God, the broken and contrite heart, are the principal features of true inner prayer, and the test of every prayer, by which we can tell whether or not our prayer is performed as it should be. If they are present, prayer is in order. When they are absent, prayer is not in its true course and must be brought back to its proper condition. If we lack this sense of sorrow and contrition, then sweetness and warmth may breed self-conceit; and that is spiritual pride, and will lead to pernicious illusion. Then the sweetness and warmth will vanish, leaving only their memory, but the soul will still imagine that it has them. Of this you should be afraid, and so you must increasingly kindle in your heart the fear of God, lowliness, and contrite prostration before Him, walking always in His presence. This is the heart of the matter.
Crucifixo Dourado com Cabeça de Cristo em Lápis Lazúli – Alemanha - 1050
A instabilidade da doçura interior
Não fique atraído pela doçura interior: sem a Cruz ela é instável e perigosa.
Considere a todos como sendo melhores que você. Sem este pensamento mesmo um operador de milagres está distante de Deus.
The instability of inner sweetness (p.128)
‘Do not become attracted by inner sweetness: without the Cross it is unstable and dangerous.
Consider every one to be better than yourself. Without this thought even a worker of miracles is far from God.
Jesus Cristo – Agonia no Jardim de Getsêmane – Aleijadinho – Congonhas do Campo - MG - 1799
Sobriedade da mente e calor do coração
Cumprindo a regra com zelo, proteja a sobriedade da mente e o calor do coração. Se este último começa a diminuir, apresse-se a aquecê-lo, estando convencido de que seu desaparecimento significará que você se afastou mais de meio caminho de Deus. O temor de Deus é o guardião e revigorador do calor interno, mas a humildade também é necessária, a paciência, a fidelidade às regras e, acima tudo, a sobriedade. Vigie a si mesmo de perto, por causa de Deus. Desperte-se se você tornou-se sonolento, erga-se de todos os modos para não cair no sono.
Sobriety of mind and warmth of heart (p.129)
Fulfilling the rule zealously, preserve sobriety of mind and warmth of heart. If the latter begins to diminish, hasten to warm it, being convinced that its disappearance will mean that you have withdrawn more than halfway from God. The fear of God is the guardian and quickener of interior warmth, but humility is also necessary, and patience, and fidelity to rules, and above all, sobri¬ety. Watch yourself closely, for the sake of God. Wake yourself if you have grown drowsy, rouse yourself up in every way so as not to fall asleep.
Homem matando Serpente diante do Portão Estreito – Papiro de Ani – Egito (1250 A.C.)
Sobriedade e discernimento
Os guerreiros de Cristo deveriam manter estreita vigilância sobre duas coisas em particular: sobriedade e discernimento. A primeira é dirigida para dentro, a segunda para fora. Com a sobriedade observamos os movimentos que emergem do próprio coração; com o discernimento nós antevemos os movimentos que estão para surgir nele sob o impulso das influências externas. A regra para a sobriedade é: depois que cada pensamento tenha sido banido da alma pela lembrança da presença de Deus, fique de pé na porta do coração e vigie cuidadosamente tudo que entra e que sai dali. Em especial, não permita que suas ações sejam prejudicadas pela emoção e pelo desejo, pois todo mal vem daí.
Sobriety and discernment (p.129)
The warriors of Christ should keep watchful guard over two things in particular: sobriety and discernment. The first is directed within, the second outward. With sobriety we observe movements which come out of the heart itself; with discernment we foresee movements which are about to be roused in it under the impulse of external influences. The rule for sobriety is: after every thought has been banished from the soul by the memory of God's presence, stand at the door of the heart and watch carefully everything that enters or goes out from there. Especially do not let your actions be prejudiced by emotion and desire, for all evil comes thence.
Jesus Cristo – Prisão no Horto das Oliveiras – Aleijadinho – Congonhas do Campo - MG - 1799
Seja sóbrio, esteja vigilante
Ser sóbrio significa não permitir que o coração se apegue a qualquer coisa que não seja Deus. Ligar-se a outras coisas embebeda a alma, e ela começa a fazer muitas e inumeráveis coisas. Estar vigilante significa vigiar cuidadosamente para que nada de mal brote no coração.
Be sober, be vigilant (p. 129)
To be sober means not to let the heart cling to anything except God. Cleaving to other things makes the soul drunk, and it begins to do quite unaccountable things. To be vigilant means to watch carefully, lest something evil springs up in the heart.
Buda Retornando das Montanhas – Séc. XVIII
Humildade e calor do coração
Você ainda conserva seu estado de calor espiritual? Deveria ser conservado. Sua base é a humildade. Tão logo a humildade diminui, entra a frieza. Pois quando a alma começa a se considerar como algo importante, o Senhor se afasta de uma só vez; e, deixada por si só, a alma esfria. Não é somente com a língua que deveríamos ficar dizendo: “Eu não sou nada”, mas deveríamos sentir nossa nulidade no coração. Então o Senhor sempre estará ali, Aquele que cria e criou todas as coisas do nada. O Senhor dará o calor, mas devemos fazer a nossa própria parte também.
Com o que, pois, contribuímos para este trabalho? Humildade e atenção, e uma sofrida submissão a Deus nas profundezas do coração, que deveria continuar incessantemente com tudo que possamos estar fazendo ou dizendo, se estamos sentados ou nos movimentando por aí, seja em casa ou na igreja. Que o Senhor lhe conceda sabedoria. Leia as sagradas escrituras, reflita sobre elas, e absorva tudo o que é útil, aplicando-as à sua vida e à sua alma.
Humility and warmth of heart (p.130)
Have you still preserved your state of spiritual warmth? It should be preserved. Its basis is humility. As soon as humility decreases, coolness enters. For when the soul begins to regard itself as something important, the Lord at once withdraws; and, left by itself, the soul grows cold. It is not just with the tongue that we should keep saying “I am nothing”, but we should feel our nothingness in the heart. Then the Lord will always be there, He who creates and has created everything out of nothing. The Lord will give warmth, but we must do our own part as well.
What, then, can we contribute to this work? Humility and attention, and a suffering submission to God in the depths of the heart, which should continue unceasingly whatever we may be doing or saying, whether we are sitting down or moving about, whether at home or in church. May the Lord grant you wisdom. Read holy writings, reflect upon them, and absorb all that is useful, applying it to your life and to your soul.
Teto com Olho de Deus – Catedral de John Hertogenbosch Holanda - 1525
Leitura espiritual. O temor de Deus
Você tem um livro? Então o leia, reflita sobre aquilo que ele diz, e aplique as palavras para si mesmo. Aplicar o conteúdo em si mesmo é o propósito e o fruto da leitura. Se você ler sem aplicar o que é lido em si mesmo, nada bom virá e pode até resultar prejudicial. Teorias se acumularão na cabeça, levando você a criticar os outros ao invés de melhorar sua própria vida. Portanto, tenha ouvidos e ouça. Se você já tem a Filocalia, dê uma olhada em Hesíquio e leia o que ele diz sobre a sobriedade. Ele dá direções exatas de como controlar e pôr os pensamentos em ordem. Leia suas palavras atentamente, tome-as no seu coração, e então aja como sugerido.
Nós sempre deveríamos nos agarrar ao temor de Deus. É a raiz de todo conhecimento espiritual e de toda ação correta. Quando o temor a Deus governa a alma tudo vai bem tanto dentro como fora. Tente acender este sentimento de temor em seu coração a cada manhã antes de fazer qualquer outra coisa. Então ele irá trabalhando por si mesmo como uma espécie de pêndulo.
Spiritual reading. The fear of God (p. 130)
You have a book? Then read it, reflect on what it says, and apply the words to yourself. To apply the content to oneself is the purpose and fruit of reading. If you read without applying what is read to yourself, nothing good will come of it, and even harm may result. Theories will accumulate in the head, leading you to criticise others instead of improving your own life. So have ears and hear. If you already have the Philokalia, look up Hesychios and read what he says on sobriety. He gives exact directions how to control and set in order one's thoughts. Read his words attentively, take them in with your heart, and then act as suggested.
We should always hold fast to the fear of God. It is the root of all spiritual knowledge and all right action. When the fear of God rules in the soul everything goes well both within and without. Try to kindle this sense of fear in your heart every morning before you do anything else. Then it will go on working by itself as a kind of pendulum.
Mão de Deus – Afresco Romanesco - Séc. XII
O principal fruto da oração
O principal fruto da oração não é calor nem doçura, mas temor a Deus e contrição.
The principal fruit of prayer (p. 131)
The principal fruit of prayer is not warmth and sweetness, but fear of God and contrition.
Criação de Adão – Michelangelo – Capela Sistina – 1508/1512
A raiz da ordem interior
A raiz da boa ordem interior é o temor a Deus. Conserve este temor dentro de você constantemente: ele manterá todas as coisas bem esticadas e não permitirá nenhuma lassidão, seja nos pensamentos ou no aparato físico, criando um coração vigilante e uma mente sóbria, e não permitindo nenhum torpor corporal ou obscuridade de pensamento.
Mas deve-se sempre lembrar que o sucesso em qualquer aspecto da vida espiritual é o fruto da graça de Deus. A vida espiritual vem inteiramente do Seu mais sagrado Espírito. Nós temos nosso próprio espírito, porém ele está sem energia. Ele começa a se fortalecer somente quando a graça de Deus flui para ele.
The root of inner order (p. 131)
The root of good inner order is the fear of God. Preserve this fear within you constantly: it will hold everything taut, and will allow no slackness either in physical members or thoughts, creating a vigilant heart and a sober mind, and allowing no bodily torpor or blurring of thought.
But one must always remember that success in any aspect of the spiritual life is the fruit of the grace of God. Spiritual life comes entirely from His most holy Spirit. We have our own spirit but it is void of power. It begins to gain strength only when the grace of God flows into it.
Êxtase de Santa Teresa – Gian Lorenzo Bernini –
Igreja de Santa Maria della Vitoria – Roma - 1652
Sentimentos de êxtase
O que você deve buscar na oração é estabelecer no coração um calmo e caloroso sentimento para com Deus, não criando expectativas sobre êxtases ou qualquer estado extraordinário. Todavia, quando Deus envia tais sentimentos especiais na oração você deve ser grato por eles e não imaginar que eles ocorrem devido a você, e nem lamentar o desaparecimento deles como se fosse uma grande perda; mas sempre descer destas alturas para a humildade e serenidade de sentimento para com o Senhor.
Feelings of ecstasy (p. 131)
What you must seek in prayer is to establish in the heart a quiet but warm and constant feeling towards God, not expecting ecstasy or any extraordinary state. But when God does send such special feelings in prayer, you must be grateful for them and not imagine that they are due to yourself, nor regret their disappear¬ance as if it were a great loss; but always descend from these heights to humility and quietness of feeling towards the Lord.
A Parábola das Virgens Prudentes e das Tolas (Mateus 25,13) – William Blake - 1822
Esforços humanos e os frutos do Espírito
A menos que estejamos adornados com simplicidade e bondade, a aparência exterior e a atitude da oração não nos trarão proveito algum. Isto é verdadeiro não somente a respeito da oração, mas a respeito de qualquer trabalho ou esforço, tais como virgindade ou jejum, ou qualquer espécie de trabalho que seja feito por causa da virtude. Se não vemos abundantemente em nós mesmos os frutos do amor, a paz, felicidade e mansidão, os frutos da humildade, simplicidade e sinceridade, os da fé e os da paciência, então trabalhamos sem proveito e em vão: pois todo o propósito do nosso trabalho e labuta foi para ganhar estes frutos. Se os frutos do amor e da paz não estão em nós, então todo nosso trabalho foi inútil e em vão. Aqueles que labutam deste modo, provarão ser, no dia do julgamento, como as cinco virgens tolas que assim foram chamadas porque ainda não tinham no vaso dos seus corações o óleo espiritual, isto é, as virtudes que mencionamos; e assim elas foram expulsas da festa de núpcias, não obtendo nenhum proveito de suas virgindades. Agricultores que trabalham em uma vinha empreendem todo o próprio trabalho na esperança de obter fruto, e se não há fruto tudo fica sem propósito; e do mesmo modo, se não vemos em nós mesmos, através da ação do Espírito, os frutos do amor, paz, felicidade, humildade, e todas as outras virtudes enumeradas pelo Apóstolo (Gl. v. 22); se não sentimos com plena segurança e percepção espiritual que eles estão presentes dentro de nós, então todo o trabalho de castidade, oração, salmodia, jejum, e vigília se mostrarão em vão e sem proveito. Pois estes trabalhos da alma e do corpo devem ser praticados na esperança da obtenção dos frutos espirituais; e o fruto do Espírito que as virtudes carregam é um contentamento espiritual de um prazer incorruptível, conferido pelo Espírito sobre o coração dos fiéis. Portanto, esforços e empenhos deveriam ser simplesmente considerados – pois assim são em verdade – apenas como esforços e empenhos e nada mais do que isso, e o fruto considerado como fruto. Mas se, por causa de conhecimento insuficiente, alguém chegue a considerar seu esforço e empenho como o fruto do Espírito, ele se engana completamente; e através desta falsa opinião priva a si mesmo dos frutos reais do Espírito, que são incomparavelmente maiores.
Human efforts and the fruits of the Spirit (p. 131)
Unless we are adorned with simplicity and goodness, the out¬ward semblance and attitude of prayer will profit us nothing. This is true not only of prayer, but of any labour or endeavour, such as virginity or fasting, or any kind of work whatever done for the sake of virtue. If we do not see abundantly present in ourselves the fruits of love, peace, joy and meekness, of humility, simplicity and sincerity, of faith and long-suffering, then we have laboured without profit and in vain: for the whole purpose of our labour and toil was to gain these fruits. If the fruits of love and peace are not in us, then our entire labour has been useless and in vain. Those who toil in such a way, on the day of judgement will prove to be like the five foolish virgins who were called foolish because they did not yet have in the vessels of their hearts the spiritual oil, that is, the virtues which we mentioned; and so they were shut out from the marriage feast, gaining no profit from their virginity. Husbandmen who work in a vineyard undergo all their labour and care in the hope of obtaining fruit, and if there is no fruit all their work proves to no purpose; and in the same way, if we do not see in ourselves, through the action of the Spirit, the fruits of love, peace, joy, humility, and all the other virtues enumerated by the Apostle (Gal. v, 22), if we do not feel in full assurance and spiritual perception that they are present within us, then all the labour of chastity, prayer, psalmody, fasting, and vigil will prove in vain and profitless. For these labours of soul and body must be practised in the hope of gaining spiritual fruits; and the fruit of the Spirit that the virtues bear is spiritual enjoyment of an uncorrupted delight, conferred by the Spirit upon the hearts of the faithful. Therefore efforts and endeavours should simply be regarded—for such they are in truth—as efforts and endeavours and no more, and the fruit as fruit. But if, because of insufficient knowledge, anyone comes to regard his effort and endeavour as the fruit of the Spirit, he deceives himself utterly; and by this false opinion deprives himself of the real fruits of the Spirit, which are incomparably great.
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