quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011



A Arte da Prece - Uma Antologia Ortodoxa. (Capítulo V - ii) A União da Mente e do Coração

A ARTE DA PRECE





Uma Antologia Ortodoxa

compilada pelo





Hegúmeno Chariton de Valamo





CAPÍTULO V



O REINO DO CORAÇÃO

por vários autores.























(ii) A União da Mente e do Coração.







O depósito de todos os nossos pensamentos



Quando lutamos com diligente sobriedade para manter a vigilância sobre nossas faculdades racionais, para controlá-las e corrigi-las, de que outro modo podemos ser bem sucedidos nesta tarefa exceto recolhendo a mente, que está dispersa no exterior através dos sentidos, e trazendo-a de volta para o mundo interno, para o próprio coração, que é o depósito de todos os nossos pensamentos?

S. GREGÓRIO PALAMAS



The storehouse of all our thoughts (p. 181)



When we strive with diligent sobriety to keep watch over our rational faculties, to control and correct them, how else can we succeed in this task except by collecting our mind, which is dispersed abroad through the senses, and bringing it back into the world within, into the heart itself, which is the storehouse of all our thoughts?



ST. GREGORY PALAMAS







Pintura em Túmulo Grego – Pedra de Paestum (Sul da Itália) – Séc. IV A.C.





Fora está a morte: dentro está o reino



O reino do céu está dentro de você. Tanto quanto o Filho de Deus habita em você, o reino do céu está dentro de você também.

Aqui dentro estão as riquezas do céu, se você as deseja. Aqui, Oh pecador, está o reino de Deus dentro de você. Entre em si mesmo, busque mais avidamente e você o encontrará sem grande labuta. Fora está a morte e a porta da morte é o pecado. Entre dentro de si mesmo e permaneça em seu coração, pois ali está Deus.



S. EFRAIM DA SÍRIA



Outside is death: within is the kingdom (p. 181)





The kingdom of heaven is within you. In so far as the Son of God dwells in you, the kingdom of heaven lies within you also.

Here within are the riches of heaven, if you desire them. Here, O sinner, is the kingdom of God within you. Enter into yourself, seek more eagerly and you will find it without great travail. Outside you is death, and the door to death is sin. Enter within yourself and remain in your heart, for there is God.

ST. EFHRAIM OF SYRIA

















Jesus Cristo - Igreja Nossa Senhora das Mercês – Ouro Preto.







Cristo Caminhando no Coração – Antonius Wierix – Séc. XVI.



Ciscos de poeira



Você deve recolher-se dentro do seu coração e permanecer ali diante do Senhor. Isto lhe revelará qualquer cisco de poeira. Ore, e possa Deus conceder sua prece.



TEÓFANO, O RECLUSO



Specks of dust (p. 182)





You must gather yourself together within your heart and stand there before the Lord. This will show up any speck of dust. Pray, and may God grant your prayer.



THEOPHAN THE RECLUSE







Cristo Ensinando ao Coração – Antonius Wierix – Séc. XVI.



Assistindo ao coração com discernimento



Atenção sobre aquilo que acontece no coração e sobre aquilo que sai dele é o principal trabalho de uma vida Cristã bem-ordenada. Através desta atenção o interior e o exterior são levados a uma devida relação um com o outro. Mas a esta vigilância o discernimento sempre deve ser adicionado, de modo que nós possamos entender corretamente o que acontece internamente e o que é requerido pela circunstância externa. A atenção é inútil sem discernimento.



TEÓFANO, O RECLUSO



Attending to the heart with discernment (p. 182)



Attention to what goes on in the heart and to what comes forth from it is the chief work of a well-ordered Christian life. Through this attention the inward and the outward are brought into due relation with one another. But to this watchfulness, discern¬ment must always be added, so that we may understand aright what passes within and what is required by outward circumstance. Attention is useless without discernment.



THEOPHAN THE RECLUSE









Jesus Purificando o Templo (João II 13-17) – El Greco – Antes de 1570



Esteja atento a imaginação



Na ordem natural das coisas, quando tentamos trazer nossos poderes espirituais sob controle, o caminho de fora para dentro é bloqueado pela imaginação. Para chegar com sucesso ao nosso objetivo interno, devemos viajar com segurança através da imaginação. Se formos descuidados a este respeito podemos nos apegar à imaginação e permanecer ali, sob a impressão que chegamos dentro, quando de fato estamos apenas do lado de fora da entrada, como se estivéssemos na corte dos gentios. Em si mesmo isto não tem muita importância, não fosse este estado quase sempre acompanhado por auto-engano.

É bem sabido que o pleno propósito daqueles que são zelosos na vida espiritual, é colocá-los na correta relação com Deus: e esta correta relação é realizada e tornada manifesta na oração. A oração é o caminho de ascensão a Deus e seus estágios são os estágios da aproximação do nosso espírito a Deus. Na oração a regra mais simples é não formar imagem de nada: recolhendo a mente dentro do coração permaneça na convicção que Deus está perto, que Ele vê e ouve, e nesta convicção prostre-se diante Dele que é terrível em Sua majestade e ao mesmo tempo muito íntimo em Sua amável bondade em relação a nós. As imagens, não importando quão sacras possam ser, retêm a atenção do lado de fora, quando no momento da oração a atenção deve estar dentro – no coração. A concentração da atenção no coração – este é o ponto de partida para a verdadeira oração. E uma vez que a prece é o caminho de ascensão a Deus, se nossa atenção desvia do coração significa que estamos desviando do caminho e deixando de ascender a Ele.



TEÓFANO, O RECLUSO



Beware of the imagination (p. 182)



In the natural order of things, when we try to bring our spiritual powers under control, the path from without to within is blocked by the imagination. To arrive successfully at our inward objective, we must travel safely past the imagination. If we are careless about this, we may stick fast in the imagination and remain there, under the impression that we have entered within, whereas in fact we are merely outside the entrance, as it were in the court of the Gentiles. This in itself would not matter so much, were it not that this state is almost always accompanied by self-deception.

It is well known that the whole purpose of those who are zealous in the spiritual life, is to place themselves in a right relationship with God: and this right relationship is realized and made manifest in prayer. Prayer is the way of ascent to God, and its stages are the stages of our spirit's approach to God. In prayer the simplest rule is not to form an image of anything: gathering the mind within the heart, stand in the conviction that God is near, that He sees and listens, and in this conviction prostrate yourself before Him who is terrible in His majesty and at the same time very close in His loving-kindness towards us. Images, however sacred they may be, retain the attention outside, whereas at the time of prayer the attention must be within — in the heart. The concentration of attention in the heart—this is the starting-point for all true prayer. And since prayer is the way of ascension to God, if our attention deviates from the heart, it means that we are deviating from the way and have ceased to ascend towards Him.



THEOPHAN THE RECLUSE







Desça da sua cabeça ao seu coração



Você deve descer da sua cabeça ao seu coração. No momento, seus pensamentos a respeito de Deus estão em sua cabeça. E Deus Ele Próprio está, por assim dizer, fora de você, de modo que assim sua oração e outros exercícios espirituais permanecem externos. Enquanto você ainda estiver em sua cabeça os pensamentos não serão facilmente conquistados mas sempre estarão girando ao redor, como neve no inverno ou nuvens de mosquitos no verão.

Neste estágio a solidão e a leitura são dois rápidos auxiliares.



TEÓFANO, O RECLUSO



Descend from your head into your heart (p. 183)



You must descend from your head into your heart. At present your thoughts of God are in your head. And God Himself is, as it were, outside you, and so your prayer and other spiritual exercises remain exterior. Whilst you are still in your head, thoughts will not easily be subdued but will always be whirling about, like snow in winter or clouds of mosquitoes in the summer.

At this stage solitude and reading are two swift helpers.



THEOPHAN THE RECLUSE









Um mercado de pano abarrotado



Quando você ora com sentimento, onde está a sua atenção se não no coração? Adquira sentimento e você também obterá atenção. A cabeça é um mercado de pano abarrotado: não é possível orar a Deus lá. Se às vezes a oração vai bem e segue por si mesma, este é um bom sinal. Significa que ela começou a ser transplantada ao coração. Proteja seu coração de apegos; tente lembrar-se de Deus, vendo-O diante de você e trabalhando diante de Sua face.



TEÓFANO, O RECLUSO



A crowded rag market (p. 184)



When you pray with feeling, where is your attention if not in the heart? Acquire feeling, and you will acquire attention as well. The head is a crowded rag market: it is not possible to pray to God there. If at times the prayer goes well and by itself, that is a good sign. It means that it has begun to be grafted to the heart. Guard your heart from attachments; try to remember God, see¬ing Him before you and working before His face.



THEOPHAN THE RECLUSE







No coração está a vida e você deve viver lá



Eu me lembro da sua carta que conta que você fica com dor de cabeça quando tenta agarrar-se à sua atenção. Sim, se você trabalhar somente com a cabeça é isto o que acontecerá; mas quando você descer ao coração não haverá, de fato, nenhuma fadiga nervosa. A cabeça se tornará vazia e haverá um fim dos pensamentos. Eles estão sempre na cabeça, perseguindo um ao outro, e não é possível controlá-los. Mas se você entra no coração, e é capaz de permanecer dentro dele, então a cada vez que os pensamentos começam a lhe confundir, você tem apenas que descer ao coração e os pensamentos irão lhe abandonar. Será um refúgio confortável e seguro. Não seja preguiçoso em relação a esta descida. No coração está a vida e você deve viver lá. Não pense que isto é algo que só os perfeitos tentam. Não. É para qualquer um que começou a buscar o Senhor.



TEÓFANO, O RECLUSO

In the heart is life, and you must live there (p. 184)



I remember your writing to tell me that you get a headache when you try to hold fast your attention. Yes, if you work only with the head, that is what will happen; but when you descend into the heart there will be no strain at all. The head will become empty and there will be an end to thoughts. They are always in the head, chasing one another, and it is not possible to control them. But if you enter the heart, and are able to remain in it, then every time thoughts begin to confuse you, you have only to descend into the heart and the thoughts will flee. It will be a comforting and safe haven. Do not be lazy about descending. In the heart is life, and you must live there. Do not think that this is something to be attempted only by the perfect. No. It is for everyone who has begun to seek the Lord.



THEOPHAN THE RECLUSE







Todo o secreto mistério da vida espiritual



Como deveríamos interpretar a expressão: “concentrar a mente no coração”? A mente é onde está a atenção. Concentrar a mente no coração significa estabelecer a atenção no coração e mentalmente ver diante de você o sempre-presente e invisível Deus; significa virar-se para Ele com aprovação, agradecimento e petição, ao mesmo tempo em que se vigia para que nada de estranho possa entrar no coração. Aqui está todo o mistério secreto da vida espiritual.

O desafio ascético mais importante é proteger o coração dos movimentos apaixonados e a mente dos pensamentos apaixonados. Você deveria olhar para o coração e expulsar dele tudo que está incorreto. Faça tudo que está prescrito e então você quase será uma freira, ou talvez uma freira por completo. Mesmo fora de um convento pode-se ser uma freira se a pessoa vive como uma freira, enquanto que mesmo num convento uma freira pode ser uma mulher leiga.



TEÓFANO, O RECLUSO





The whole secret mystery of the spiritual life (p. 184)



How should we interpret the expression, “to concentrate the mind in the heart”? The mind is where the attention is. To concentrate the mind in the heart means to establish the attention in the heart, and mentally to see before you the ever-present and invisible God; it means turning to Him with praise, thanksgiving, and petition, while at the same time taking care that nothing extraneous should enter the heart. Here is the whole secret mystery of the spiritual life.

The most important ascetic undertaking is to keep the heart from passionate movements, and the mind from passionate thoughts. You should look into the heart and drive away from it all that is wrong. Do everything that is prescribed, and then you will be almost a nun, and perhaps completely a nun. Even outside a convent, one can be a nun if one lives as a nun, while even in a convent a nun may be a laywoman.



THEOPHAN THE RECLUSE







Eremitério Glagolítico – Ilha de Brač – Croácia - 1555





O eremitério do coração. Diferentes tipos de sentimentos na oração



Você sonha com um eremitério. Mas você já tem seu eremitério, aqui e agora! Sente-se quieto e invoque: “Senhor, tenha piedade”. Quando você está isolado do resto do mundo, como você cumprirá a vontade de Deus? Simplesmente preservando dentro de você o correto estado interior. E o que é isto? É um estado de incessante lembrança de Deus com temor e sincera devoção, junto com a lembrança da morte. O hábito de caminhar diante de Deus e mantê-Lo na lembrança – tal é o ar que respiramos na vida espiritual. Criados como somos à imagem de Deus, este hábito deveria existir em nosso espírito naturalmente: se ele está ausente, isto é porque nos afastamos de Deus. Como resultado desta queda, temos que lutar para adquirir o hábito de caminhar diante de Deus. Nossa luta ascética consiste, essencialmente, no esforço para permanecer conscientemente diante da face do Deus sempre-presente; mas existem também várias atividades secundárias que também formam parte da vida espiritual. Aqui também há trabalho a ser feito de modo a direcionar estas atividades para suas verdadeiras metas. Leitura, meditação, prece, todas as nossas ocupações e contatos devem ser conduzidos de tal modo que não maculem ou perturbem a lembrança de Deus. O assento de nossa consciência e atenção deve estar concentrado nesta lembrança de Deus.

A mente está na cabeça e os intelectuais sempre vivem na cabeça. Vivem na cabeça e sofrem de incessante turbulência dos pensamentos. Esta turbulência não permite que a atenção se estabeleça sobre qualquer coisa. Nem a mente pode, quando está na cabeça, habitar constantemente no pensamento único de Deus. Todo tempo ela fica fugindo. Por esta razão, aqueles que querem estabelecer o pensamento único de Deus dentro deles próprios são aconselhados a deixar a cabeça e descer com suas mentes aos seus corações, e permanecer ali com a atenção sempre presente. Somente então, quando a mente estiver unida com o coração, é possível esperar ter sucesso na lembrança de Deus.

Esta, portanto, é a meta que você deveria colocar agora diante de você e em direção à qual você deveria começar a avançar. Não pense que esta meta está além de sua força; mas também não pense que é tão fácil que baste apenas desejá-la e imediatamente ela se cumprirá. O primeiro passo para atrair a mente ao coração é, essencialmente, estar motivado com simpatia, entrando com seus sentimentos nos significados das orações que você lê ou escuta; pois são os sentimentos do coração que normalmente dominam a mente. Se você dá este primeiro passo como se deve, estes sentimentos irão se modificar de acordo com o conteúdo das orações. Mas além deste primeiro tipo de sentimentos, existem outros, muito mais poderosos e mais arrebatadores – sentimentos que capturam tanto nossa consciência como o coração, acorrentando a alma e não lhe dando nenhuma liberdade para continuar lendo, pois reivindica sua atenção inteiramente para eles próprios. Estes são sentimentos especiais e, tão logo eles nasçam, a alma também dá nascimento às orações que são de sua própria progenitura. Você nunca deve interromper estes sentimentos e orações especiais que nascem no coração – não siga, por exemplo, a leitura, mas pare-a de uma vez – pois você deve deixá-los livres para verterem-se até que estejam esgotados e a emoção retorne ao nível dos sentimentos mais comuns que ocorrem durante a prece. Esta segunda forma de oração é mais poderosa que a primeira, e envia a mente para baixo no coração mais rapidamente. Mas ela somente pode agir depois da primeira forma, ou junto com ela.



TEÒFANO, O RECLUSO



The hermitage of the heart. Different kinds of feelings in prayer (p. 185)



You dream of a hermitage. But you already have your hermit¬age, here and now! Sit still, and call out: ‘Lord, have mercy’ When you are isolated from the rest of the world, how will you fulfil the will of God? Simply by preserving within yourself the right inner state. And what is this? It is a state of unceasing remembrance of God in fear and piety, together with the remem¬brance of death. The habit of walking before God and keeping Him in remembrance—such is the air we breath in the spiritual life. Created as we are in the image of God, this habit should exist in our spirit naturally: if it is absent, that is because we have fallen away from God. As a result of this fall, we have to fight to acquire the habit of walking before God. Our ascetic struggle consists essentially in the effort to stand consciously before the face of the ever-present God; but there are also various secondary activities, which likewise form part of the spiritual life. Here too, there is work to be done, in order to direct these activities to their true aim. Reading, meditation, prayer, all our occupations and con¬tacts, must be conducted in such a way as not to blot out or disturb the remembrance of God. The seat of our consciousness and attention must also be concentrated on this remembrance of God.

The mind is in the head, and intellectuals live always in the head. They live in the head and suffer from unceasing turbulence of thoughts. This turbulence does not allow the attention to settle on any one thing. Neither can the mind, when it is in the head, dwell constantly on the one thought of God. All the time it keeps running away. For this reason, those who want to establish the one thought of God within themselves, are advised to leave the head and descend with their mind into their heart, and to stand there with ever present attention. Only then, when the mind is united with the heart, is it possible to expect success in the remembrance of God.

This, then, is the aim which you should now set before your¬self, and towards which you should begin to advance. Do not think that this task is beyond your strength; but also do not think that it is so easy that you have only to wish it, and it will be immediately accomplished. The first step in attracting the mind to the heart is essentially to be moved with sympathy, entering with your feelings into the meaning of the prayers which you read or hear; for it is the feelings of the heart which usually dominate the mind. If you take this first step as you should, these feelings will change according to the content of the prayers. But besides this first kind of feelings there are others, far stronger and more overwhelming—feelings which take captive both our conscious¬ness and heart, enchaining the soul and giving it no freedom to continue reading, claiming its attention wholly for themselves. These are special feelings; and as soon as they are born, the soul too gives birth to prayers which are their very progeny. You must never interrupt these special feelings and prayers which are born in the heart—do not, for instance, go on reading, but stop at once—for you must leave them freedom to pour out until they are exhausted and emotion returns to the level of the more usual feelings during prayer. This second form of prayer is more powerful than the first, and sends the mind down into the heart more quickly. But it can only act after the first form, or together with it.



THEOPHAN THE RECLUSE









Nossos corações ficam inquietos até que repousam em Ti



Pode ser que em seu caso Deus peça por uma derradeira entrega de seu coração, e seu coração anseie por Deus. Pois sem Deus ele nunca está contente, permanecendo insatisfeito para sempre. Examine-se deste ponto de vista. Talvez você encontrará aqui a porta para o local da morada de Deus.



TEÓFANO, O RECLUSO





Our hearts are restless till they rest in Thee (p. 187)



Maybe in your case God asks for a final surrender of your heart, and your heart longs for God. For without God it can never be content but remains for ever unsatisfied. Examine yourself from this point of view. Perhaps you will find here the door to God's dwelling place.



THEOPHAN THE RECLUSE











A sala de recepção do Senhor



Você busca o Senhor? Busque, mas apenas dentro de si mesmo. Ele não está longe de ninguém. O Senhor está perto de todos aqueles que verdadeiramente O invocam. Encontre um lugar em seu coração e fale ali com o Senhor. É a sala de recepção do Senhor. Todos aqueles que encontram o Senhor, O encontram ali; Ele não fixou nenhum outro local para encontrar as almas.



TEÓFANO, O RECLUSO



The Lord's reception room (p. 187)



You seek the Lord? Seek, but only within yourself. He is not far from anyone. The Lord is near all those who truly call on Him. Find a place in your heart, and speak there with the Lord. It is the Lord's reception room. Everyone who meets the Lord, meets Him there; He has fixed no other place for meeting souls.

THEOPHAN THE RECLUSE







Templo de Dendara (Interior) - Egito



Atenção interior e solidão no coração



Você conserva a atenção interior e a solidão no coração. Possa o Senhor ajudar-lhe a sempre permanecer assim. Esta é a coisa mais importante em nossa vida espiritual. Quando a consciência está dentro do coração, ali também está o Senhor; e assim os dois tornam-se unidos e o trabalho de salvação progride com sucesso. A entrada é bloqueada por maus pensamentos e, ainda mais, por emoções e estados de humores. O Nome do Senhor, Ele mesmo, dispersa tudo que é estranho ao coração e atrai tudo que é semelhante.

O que você deve temer mais que tudo? Auto-satisfação, auto-apreciação, auto-orgulho e todas as outras coisas que começam com eu próprio.

Trabalhe na sua salvação com temor e tremor. Acenda e mantenha um espírito contrito, um humilde e contrito coração.

TEÓFANO, O RECLUSO



Inner attention and solitude in the heart (p. 187)



You preserve inner attention and solitude in the heart. May the Lord help you always to remain thus. This is the most im¬portant thing in our spiritual life. When consciousness is within the heart, there too is the Lord; and so the two become united and the work of salvation progresses successfully. The entry is barred to evil thoughts, and still more to emotions and moods. The Name of the Lord by itself disperses everything alien to it and attracts everything akin.

What have you to fear above all else ? Self-satisfaction, self-appreciation, self-conceit, and all other things beginning with self.

Work out your salvation with fear and trembling. Kindle and maintain a contrite spirit, a humble and a contrite heart.



THEOPHAN THE RECLUSE







Um sentimento de calorosa ternura



Durante a prece, é essencial que o espírito tenha que se unir com a mente, e que eles tenham que recitar a oração juntos; mas na medida em que a mente trabalha com palavras, proferindo-as seja mentalmente ou em voz alta, o espírito age através de um sentimento de calorosa ternura ou lágrimas. A união dos dois é concedida no devido tempo; mas para o iniciante é suficiente se o espírito simpatiza e coopera com a mente. Se a atenção é mantida pela mente, o espírito fica confinado a sentir um verdadeiro calor e ternura. O espírito é algumas vezes chamado de coração, assim como a mente é algumas vezes denominada como cabeça.



BISPO IGNATII



A feeling of warm tenderness (p. 188)



During prayer, it is essential that the spirit should be united with the mind, and that they should recite the prayer together; but whereas the mind works with words, uttered either mentally or aloud, the spirit acts through the feeling of warm tenderness or tears. Union of the two is given in due course by divine grace; but for the beginner, it is enough if the spirit sympathises and co-operates with the mind. If attention is kept by the mind, the spirit is bound to feel true warmth and tenderness. The spirit is sometimes called the heart, just as the mind is sometimes termed the head.



BISHOP IGNATII







Monge Jesuíno do Monte Carmelo – Igreja da Ordem Terceira do Carmo - SP



Oração da mente, do coração, e da alma



A oração é chamada ‘da mente’, quando é recitada pela mente com profunda atenção e com a solidariedade do coração. A oração é chamada ‘do coração’, quando recitada pela mente unida com o coração, quando a mente desce como se estivesse no coração e envia ao alto, das suas profundezas, a prece. A oração é chamada ‘da alma’, quando ela vem de toda a alma, com a participação do próprio corpo – quando é oferecida pelo ser inteiro, que se torna por assim dizer o porta-voz da prece.

Os Santos Padres em seus escritos incluem frequentemente sob o termo ‘oração da mente’ ou ‘oração mental’, tanto a oração do coração como a oração da alma. Mas algumas vezes eles os distinguem. Assim, S. Gregório do Sinai disse: ‘Clame incessantemente com a mente, ou com a alma.’ Mas em nossos dias, quando o ensinamento oral sobre este tema diminui enormemente, é muito útil conhecer as distinções entre as definições. Em algumas pessoas a oração da mente é mais ativa, em outras a oração do coração, ainda em outras a oração da alma: tudo depende como cada qual é presenteado, seja naturalmente ou através da graça, pelo Doador de todos os bens. Mas algumas vezes no mesmo lutador ascético podem tornar-se ativas primeira uma oração e depois outra. Muito frequentemente, na verdade na maioria dos casos, tal oração é acompanhada por lágrimas.



BISPO IGNATII







Prayer of the mind, of the heart, and of the soul (p. 188)



Prayer is called ‘of the mind’, when it is recited by the mind with profound attention, and with the sympathy of the heart. Prayer is called ‘of the heart’, when it is recited by the mind united with the heart, when the mind descends as it were into the heart, and sends up the prayer from its depths. Prayer is called ‘of the soul’, when it comes from the whole soul, with the participation of the body itself—when it is offered by the whole being, which becomes so to speak the mouthpiece of the prayer.

The Holy Fathers in their writings often include under the term ‘prayer of the mind’ or ‘mental prayer’, both prayer of the heart and prayer of the soul. But sometimes they distinguish them. Thus St. Gregory of Sinai said: ‘Cry out unceasingly with the mind, or with the soul.’ But nowadays, when oral teaching on this subject has greatly diminished, it is very useful to know the distinctions between definitions. In some people prayer of the mind is more active, in others prayer of the heart, in yet others prayer of the soul: it all depends how each is gifted, either naturally or through grace, by the Giver of all good. But some¬times in the same ascetic struggler first one prayer and then another may be active. Very often, indeed in most cases, such prayer is accompanied by tears.



BISHOP IGNATII









Falcão Peregrino



Como obter discernimento dos pensamentos



Para você, o caminho da salvação ainda está obscuro. Leia os primeiros parágrafos de Filoteu do Sinai na Filocalia, e veja o que é dito lá. Um ato é requerido – e este é tudo: pois este único ato carrega todas as coisas juntas e mantém tudo em ordem. Tente organizar-se como Filoteu orienta, e você receberá a correta ordem interna, como claramente perceberá. Este único ato é manter-se com atenção em seu coração, e permanecer lá diante de Deus em adoração. Este é o início da sabedoria espiritual.

Você deseja ficar sábio a respeito do discernimento de pensamentos. Desça da cabeça ao coração. Então, verá todos os pensamentos claramente, como se movessem diante do olho da afiada visão de sua mente. Mas até que você desça ao coração, não espere possuir uma devida discriminação de pensamentos.



TEÓFANO, O RECLUSO



How to achieve discernment of thoughts (p. 189)



For you, the path of salvation is still dark. Read the first para¬graphs of Philotheos of Sinai in the Philokalta, and see what is said there. One act is required—and that is all: for this one act pulls everything together, and keeps everything in order. Try to organize yourself as Philotheos directs, and you will receive the right order within, as you will clearly realize. This one act is to stand with attention in your heart, and to remain there before God in worship. This is the beginning of spiritual wisdom.

You wish to grow wise in discernment of thoughts. Descend from the head into the heart. Then you will see all thoughts clearly, as they move before the eye of your sharp-sighted mind. But until you descend into the heart, do not expect to have due discrimination of thoughts.



THEOPHAN THE RECLUSE







Oferenda de Orações e Incensos ao Fogo Sagrado

Zoroastrismo - Irã



O que significa estar com a mente no coração



Você pergunta o que significa estar com a mente no coração? Significa isto. Você sabe onde o coração está? Como saber isto pode ajudá-lo tendo uma vez aprendido? Então, esteja ali com a atenção e permaneça firmemente dentro, e você fará com que sua mente esteja no coração. A mente é inseparável da atenção; onde uma está a outra estará.

Você escreveu que com frequência sente um fogo em seu coração quando lê o hino Acatista ao nosso mais encantador Senhor Jesus. Faça, então, com que sua atenção esteja no lugar onde sente este fogo; e permaneça ali, não somente durante a oração mas em todos os outros momentos. Não é suficiente apenas pôr-se em oração: você deve se colocar em oração com a ciência de que está defrontando-se com o Senhor, que está diante do Seu olho que tudo vê, que penetra as profundezas secretas do coração; e para ficar assim esforce-se para ter algum caloroso sentimento em relação a Deus: de temor, amor, esperança, devoção, contrição carregada de dor, ou algo similar a estas coisas. Este é o princípio básico da ordem interior. Vigie, e tão logo veja que esta ordem é perturbada, apresse-se em restaurá-la.



TEÓFANO, O RECLUSO





What it means to be with the mind in the heart (p. 189)



You ask what it means, to be with the mind in the heart? It means this. You know where the heart is? How can you help knowing it having once learnt? Then stand there with attention and remain steadfastly within, and you will have your mind in your heart. The mind is inseparable from attention; where one is there will be the other.

You have written that you often feel a fire in your heart when you read the Akathist to our sweetest Lord Jesus. Let your atten¬tion, then, be in the place where you feel this fire; and remain there, not only during prayer but at all other times. It is not enough just to stand at prayer: you must stand with awareness that you are facing the Lord, before His all-seeing eye, which penetrates the secret depths of the heart; and in order to stand thus, endeavour to have some warm feeling towards God, of fear, love, hope, devotion, grief-laden contrition, or something akin to these. This is the basic principle of inner order. Watch, and as soon as you see that this order is disturbed, hasten to restore it.



THEOPHAN THE RECLUSE







O Casamento Judeu – Rembrandt - 1665



Encontrando o lugar do coração



Quando lemos nos escritos dos Padres sobre o lugar do coração que a mente encontra através da oração, devemos compreender por isto a faculdade espiritual que se encontra no coração. Colocada pelo Criador na parte superior do coração, esta faculdade espiritual distingue o coração humano do coração dos animais: pois os animais têm a faculdade da vontade ou desejo, e a faculdade do ciúme ou fúria, na mesma medida que o homem. A faculdade espiritual no coração manifesta-se – independentemente do intelecto – na consciência ou ciência de nosso espírito, em temor a Deus, em amor espiritual para com Deus e nossos vizinhos, em sentimentos de arrependimento, humildade, ou mansidão, em contrição de espírito ou profunda tristeza por nossos pecados, e em outros sentimentos espirituais; todos os quais sendo estranhos aos animais. A faculdade intelectual na alma do homem, embora espiritual, habita no cérebro, isto é, na cabeça: do mesmo modo a faculdade espiritual que denominamos por espírito do homem, embora espiritual, habita na parte superior do coração, perto do mamilo esquerdo do peito e um pouco acima dele. Assim a união da mente com o coração é a união dos pensamentos espirituais da mente com os sentimentos espirituais do coração.



BISPO IGNATII



Finding the place of the heart (p. 190)



When we read in the writings of the Fathers about the place of the heart which the mind finds by prayer, we must understand by this the spiritual faculty that exists in the heart. Placed by the Creator in the upper part of the heart, this spiritual faculty distinguishes the human heart from the heart of animals: for animals have the faculty of will or desire, and the faculty of jealousy or fury, in the same measure as man. The spiritual faculty in the heart manifests itself—independently of the intellect—in the conscience or consciousness of our spirit, in the fear of God, in spiritual love towards God and our neighbour, in feelings of repentance, humility, or meekness, in contrition of the spirit or deep sadness for our sins, and in other spiritual feelings; all of which are foreign to animals. The intellectual faculty in man's soul, though spiritual, dwells in the brain, that is to say in the head: in the same way the spiritual faculty which we term the spirit of man, though spiritual, dwells in the upper part of the heart, close to the left nipple of the chest and a little above it. Thus the union of the mind with the heart is the union of the spiritual thoughts of the mind with the spiritual feelings of the heart.



BISHOP IGNATII







Brinco Turquesa-Dourado

Tillya-Tepe - Afeganistão – séc. I D.C.



O coração é o homem íntimo



O coração é o homem íntimo ou espírito. Aqui estão localizadas a ciência de si, a consciência, a idéia de Deus e da própria e completa dependência Dele, e todos os eternos tesouros da vida espiritual.



TEÓFANO, O RECLUSO



The heart is the innermost man (p. 190)



The heart is the innermost man, or spirit. Here are located self-awareness, the conscience, the idea of God and of one's complete dependence on Him, and all the eternal treasures of the spiritual life.



THEOPHAN THE RECLUSE





Capa do Livro “A Nuvem do Não-Saber”



Não pergunte como



Onde está o coração? Onde a tristeza, a alegria, a raiva, e outras emoções são sentidas, aí está o coração. Fique lá com atenção. O coração físico é um pedaço de carne muscular, mas não é a carne que sente e sim a alma; o coração carnal é como um instrumento para estes sentimentos, assim como o cérebro serve de instrumento para a mente. Fique no coração, com a fé que Deus também está ali, mas perguntar-se como Ele está ali, isto não é para especulação. Ore e suplique para que no devido tempo o amor por Deus possa avivar-se dentro de você pela Sua graça.



TEÓFANO, O RECLUSO



Do not ask how (p. 191)



Where is the heart? Where sadness, joy, anger, and other emotions are felt, here is the heart. Stand there with attention. The physical heart is a piece of muscular flesh, but it is not the flesh that feels, but the soul; the carnal heart serves as an instru¬ment for these feelings, just as the brain serves as an instrument for the mind. Stand in the heart, with the faith that God is also there, but how He is there do not speculate. Pray and entreat that in due time love for God may stir within you by His grace.



THEOPHAN THE RECLUSE

O homem oculto do coração



O espírito da sabedoria e da revelação e um coração que é limpo são dois problemas diferentes; o primeiro é do alto, de Deus, o ultimo é de nós mesmos. Mas no processo de obtenção da compreensão Cristã eles estão inseparavelmente unidos e esta compreensão não pode ser ganha, a menos que ambos estejam presentes conjuntamente. O coração sozinho, a despeito de toda purificação – se é possível a purificação sem a graça – não nos dará sabedoria; mas o espírito da sabedoria não virá a nós a menos que tivermos preparado um puro coração para ser seu lugar de morada.

Aqui, o coração deve ser entendido não no seu significado comum, mas no sentido do ‘homem interior’. Temos dentro de nós um homem interior, de acordo com o Apóstolo Paulo, ou um homem oculto do coração, de acordo com o Apóstolo Pedro. É o espírito de Deus que foi soprado no primeiro homem e permanece continuamente conosco, mesmo depois da Queda. Ele mostra-se no temor a Deus que se funda na certeza da existência de Deus e na ciência de nossa completa dependência Dele, nos movimentos da consciência e em nossa falta de contentamento com tudo que é material.



TEÓFANO, O RECLUSO



The hidden man of the heart (p. 191)



The spirit of wisdom and revelation, and a heart that is cleansed, are two different matters; the former is from on high, from God, the latter is from ourselves. But in the process of acquiring Christian understanding they are inseparably united, and this understanding cannot be gained unless both of them are present together. The heart alone, despite all purification—if purification is possible without grace—will not give us wisdom; but the spirit of wisdom will not come to us unless we have prepared a pure heart to be its dwelling-place.

The heart is to be understood here, not in its ordinary mean¬ing, but in the sense of 'inner man'. We have within us an inner man, according to the Apostle Paul, or a hidden man of the heart, according to the Apostle Peter. It is the God-like spirit that was breathed into the first man, and it remains with us continuously, even after the Fall. It shows itself in the fear of God, which is founded on the certainty of God's existence, and in the awareness of our complete dependence on Him, in the stirrings of conscience and in our lack of contentment with all that is material.



THEOPHAN THE RECLUSE







Deus Sopra a Vida no Homem - Mosaico Bizantino - Séc. XII







A alavanca que controla tudo



A alavanca que controla todas as nossas atividades é o coração. Aqui são formadas as convicções e simpatias que determinam a vontade e dão força a ela.



TEÓFANO, O RECLUSO



The lever which controls everything (p. 192)



The lever which controls all our activities is the heart. Here are formed the convictions and sympathies which determine the will and give it strength.



THEOPHAN THE RECLUSE



A vida do coração



Ninguém tem poder para comandar o coração. Ele vive sua própria vida especial. Ele se regozija de si mesmo, é triste de si mesmo; e ninguém pode fazer qualquer coisa a este respeito. Apenas o Mestre de tudo, sustentando tudo na Sua mão direita, tem poder para entrar no coração, para colocar sentimentos nele independentemente de suas correntes naturalmente mutáveis.



TEÓFANO, O RECLUSO



The life of the heart (p. 192)



No one has power to command the heart. It lives its own special life. It rejoices of itself, it is sad of itself; and no one can do anything about this. Only the Master of all, holding all in His right hand, has power to enter the heart, to put feelings into it independently of its naturally changing currents.



THEOPHAN THE RECLUSE







Estamos em casa no coração



Congratulações pelo seu seguro retorno! Sua própria casa é um paraíso depois de uma ausência. Todos sentem o mesmo a esse respeito. Exatamente o mesmo sentimento chega a nós quando, depois da distração, retornamos à atenção e à vida interna. Quando estamos no coração estamos em casa; quando não estamos no coração estamos desabrigados. E é a esse respeito acima de todas as coisas que devemos nos inquietar.



TEÓFANO, O RECLUSO

At home in the heart (p. 192)



Congratulations on your safe return! Your own home is para¬dise after an absence. Everyone feels alike about this. Exactly the same feeling comes to us when, after distraction, we return to attention and to inner life. When we are in the heart, we are at home; when we are not in the heart, we are homeless. And it is about this above all that we must take trouble.



THEOPHAN THE RECLUSE









Estatueta de Homem Sentado – Antigo Reino - Egito – 3000-2300 A.C.



O propósito pelo qual o homem foi criado



Não se deve estar sem trabalho por um único momento. Mas há trabalho executado pelo corpo, visivelmente, e há trabalho que é feito mentalmente, invisivelmente. E é este segundo tipo que se constitui como trabalho real. Ele consiste primariamente na incessante lembrança de Deus, com a oração da mente no coração. Ninguém o vê, ainda que aqueles que estão neste estado trabalhem com incessante vigor. Esta é a única coisa necessária. Uma vez que está ocorrendo, não se preocupe a respeito de qualquer outro trabalho.

O primeiro decreto divino a respeito do homem é que ele deve estar numa viva união com Deus, e esta união consiste em viver em Deus com a mente no coração: assim, de qualquer um que almeje tal vida e, ainda mais, de qualquer um que participe dela em alguma extensão, pode ser dito que ele cumpre o propósito na vida para a qual foi criado. Aqueles que buscam esta união viva deveriam compreender o que estão tentando fazer, e não ficar perturbados pelas suas carências de obtenções em quaisquer feitos externos especialmente importantes. Este trabalho por si mesmo engloba todas as outras ações.



TEÓFANO, O RECLUSO



The purpose for which man was created (p. 192)



One must not be without work for a single moment. But there is work performed by the body, visibly, and there is work which is done mentally, invisibly. And it is this second kind that con¬stitutes real work. It consists primarily in the unceasing remem¬brance of God, with the prayer of the mind in the heart. Nobody sees it, yet those who are in this state work with ceaseless vigour. This is the one thing necessary. Once it is there, do not worry about any other work.

The first divine decree about man is that he should be in living union with God, and this union consists of living in God with the mind in the heart: thus anyone who aims at such a life, and still more anyone who participates in it to some extent, can be said to fulfil the purpose in life for which he was created. Those who seek this living union should understand what they are trying to do, and not be troubled at their lack of achievement in any speci¬ally important external feats. This work by itself embraces all other action.



THEOPHAN THE RECLUSE







Transfiguração de Cristo (Mateus xvii 1-8)– Novgorod – Rússia – Séc. XV

União com o Senhor



Todo Cristão real sempre deve lembrar e nunca deve permitir-se esquecer que é indispensável para ele estar unido com Nosso Senhor o Salvador em seu pleno ser; permitir que o Senhor habite em sua mente e em seu coração, e começar a viver de acordo com Sua mais sagrada vida. O Senhor apropriou-se de nossa carne e nós devemos apropriar-se de Sua carne e Seu Espírito todo-santo, aceitando-os e apegando-se a eles para sempre. Somente tal união com Nosso Senhor nos dará aquela paz e boa vontade, aquela luz e vida que perdemos no primeiro Adão, agora renovadas dentro de nós pelo segundo Adão, o Senhor Jesus Cristo. E o caminho mais certo para obter esta união com o Senhor, próxima a comunhão de Sua Carne e Sangue, é a interna Oração de Jesus.



BISPO JUSTIN



Union with the Lord (p. 193)



Every real Christian must always remember and must never let himself forget, that it is indispensable for him to be united with Our Lord the Saviour in his whole being; to let the Lord dwell in his mind and heart, and to begin to live according to His most holy life. The Lord took our flesh, and we must take on His flesh and His all-holy Spirit, accepting them and holding fast to them for ever. Only such a union with Our Lord will give us that peace and good-will, that light and life which we lost in the first Adam, and which are now renewed within us by the second Adam, the Lord Jesus Christ. And the surest way to achieve this union with the Lord, next to communion of His Flesh and Blood, is the inner Jesus Prayer.



BISHOP JUSTIN

Alguém que está sempre presente



“Eu estou tentando apropriar-me do coração.” Possa Deus lhe ajudar! Mas não negligencie a coisa mais importante que é estar concentrado com a mente no coração. Dirija todos os seus esforços principalmente para isto. A única maneira é tentar ficar com a atenção no coração, lembrando-se da onipresença de Deus e que Seu olho enxerga seu coração. Acredite firmemente que, embora possa estar sozinho, você sempre tem – não apenas perto, mas dentro de você – alguém que está sempre presente, olhando e vendo tudo que está em você. O que lhe escrevi a respeito de recitar a Oração de Jesus muitas vezes num dia, provará ser um poderoso meio em direção a este fim. Faça isto por dez a quinze minutos por vez; e é melhor ficar na posição da prece, fazendo prostrações da cintura ou não - como melhor preferir. Trabalhe nesta maneira e ore a Deus para que Ele possa finalmente lhe conceder, no fim, o conhecimento do que significa ter uma ‘dor’ no coração, como o stárets Parthenii coloca. Isto não é dado de uma vez. Tomará um ano de trabalho concentrado, ou talvez mais, antes que quaisquer traços dele comecem a aparecer. Possa o Senhor lhe abençoar neste trabalho e neste caminho; não pense nisto como uma atividade secundária, mas a considere como seu principal trabalho.



TEÓFANO, O RECLUSO



Someone who is ever present (p. 193)



‘I am trying to take heart.’ May God help you! But do not neg¬lect the most important thing, to be concentrated with the mind in the heart. Direct all your efforts chiefly to this. The only way is to try to stand with attention in the heart, remembering the omni-presence of God, and that His eye looks into your heart. Firmly believe that although you may be alone, you always have—not only near you, but within you—someone who is ever present, looking at you and seeing all that is in you. What I wrote to you about reciting the Jesus Prayer several times a day will prove a very powerful means towards this end. Do so for ten to fifteen minutes at a time; and it is better to stand in the position of prayer, making bows from the waist or not, as suits you best. Work in this manner, and pray to God that He may finally grant you to know in the end what it means to have a 'soreness' in the heart, as staretz Parthenii puts it. This is not given at once. It will take a year of concentrated work, or perhaps more, before any traces of it will begin to appear. May the Lord bless you in that work and on that path; do not think of it as a secondary activity, but regard it as your principal work.



THEOPHAN THE RECLUSE







Cristo em Glória (Detalhe do Julgamento Final) – Giotto – 1305/1306









Permanecendo diante do Senhor invisível



Ficar de guarda sobre o coração, estar com a mente no coração, descer da cabeça ao coração – todas estas indicações são uma única e mesma coisa. A essência do trabalho reside na concentração da atenção e na permanência diante do Senhor invisível, não na cabeça mas dentro do peito, perto do coração e no coração. Quando chegar o calor divino, tudo isto ficará claro.



TEÓFANO, O RECLUSO



Standing before the invisible Lord (p. 194)



To stand guard over the heart, to stand with the mind in the heart, to descend from the head into the heart—all these are one and the same thing. The core of the work lies in the concentration of attention and the standing before the invisible Lord, not in the head but within the chest, close to the heart and in the heart. When the divine warmth comes, all this will be clear.



THEOPHAN THE RECLUSE









Concentrado dentro de si mesmo



Esteja concentrado dentro de si mesmo e tente não deixar o coração, pois o Senhor está lá. Busque este estado e trabalhe por ele. Quando você o tiver obtido perceberá quão precioso ele é.



TEÓFANO, O RECLUSO



Concentrated within yourself (p. 194)



Be concentrated within yourself and try not to leave the heart, for the Lord is there. Seek this state and work for it. When you have attained to it you will realize how precious it is.



THEOPHAN THE RECLUSE



































Um bebê nos braços de sua mãe



O fato de que você seja guiado por sentimentos ou que você tenha sentimentos espirituais em geral, ainda não significa que você esteja permanecendo firmemente com a atenção no coração. Quando este último estado é obtido, então, a mente permanece no coração incessantemente, ficando diante de Deus com temor e piedade e não tendo desejo de mover-se dali: não mais do que um bebê deseja mover-se quando envolto pelos braços de sua mãe. Possa o Senhor lhe ajudar a alcançar este ponto.



TEÓFANO, O RECLUSO



A baby in its mother's arms (p. 194)



The fact that you are directed by feeling, or that you have spiritual feelings in general, does not yet mean that you are stand¬ing firmly with attention in the heart. When this last state is attained, then the mind remains in the heart permanently, standing before the Lord in fear and piety, and it has no desire to move thence, any more than a baby desires to move when renting in its mother's arms. May the Lord help you to reach thin point.



THEOPHAN THE RECLUSE







A Oração de Jesus une a mente com o coração



Toda sua desordem interior é devida à desarticulação de seus poderes, a mente e o coração indo cada um pelo seu próprio caminho. Você deve unir a mente com o coração: então o tumulto dos seus pensamentos cessará e você obterá um leme para guiar o barco da sua alma, uma alavanca com a qual colocar todo seu mundo interior em movimento. Como esta união pode ser obtida? Torne um hábito orar estas palavras com a mente no coração: “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tenha piedade de mim.” E esta oração, quando tiver aprendido a usá-la apropriadamente, ou melhor, quando ela for transplantada ao coração, o conduzirá ao fim que deseja: ela unirá sua mente com seu coração, ela irá conter a turbulência de seus pensamentos e lhe dará poder para governar os movimentos de sua alma.



TEÓFANO, O RECLUSO



The Jesus Prayer unites the mind with the heart (p. 195)



All your inner disorder is due to the dislocation of your powers, the mind and the heart each going their own way. You must unite the mind with the heart: then the tumult of your thoughts will cease, and you will acquire a rudder to guide the ship of your soul, a lever with which to put all your inner world in movement. How can this union be achieved? Make it your habit to pray these words with the mind in the heart: “Lord Jesus Christ, Son of God, have mercy upon me.” And this prayer, when you have learnt to use it properly, or rather, when it becomes grafted to the heart, will lead you to the end which you desire: it will unite your mind with your heart, it will quell the turbulence of your thoughts, and it will give you power to govern the movements of your soul.



THEOPHAN THE RECLUSE







Cristo Cura Paralítico na Piscina de Betesda (João v. 1-9)

Bartolomé Esteban Murillo - 1667



A piscina de Betesda



Na medida em que um estado de desordem interna prevalece dentro de nós, o trabalho da oração pode estar presente mas o coração está quase sempre frio, muito raramente movendo-se para a oração calorosa e fervente. Quando esta confusão interna é eliminada, por outro lado, o calor da prece é constante e há apenas um esfriamento ocasional; e este é logo subjugado por uma paciente permanência na ordem de vida e nas ocupações que acendem o sentimento caloroso. Há também uma grande diferença na atitude do coração em relação aos ataques da vaidade e das paixões. Quem está livre deles? Mas na condição anterior eles entravam no coração, dele tomavam posse, e (como se por força) capturavam suas simpatias, de modo que o coração se tornava continuamente corrompido, encontrando prazer em pensamentos pecaminosos, ainda que neste estado não houvesse atos pecaminosos. Na condição presente, quando estes mesmos ataques se aproximam, o guardião – a atenção – fica permanentemente na entrada do coração e, em Nome de Senhor Jesus, repele os inimigos; sendo que apenas raramente o inimigo é bem sucedido na sutil insinuação de alguma tentação favorita. Esta, entretanto, é imediatamente percebida, vindo a ser expulsa e o coração purificado por arrependimento, de modo que nenhum vestígio dela permanece.

Durante o período de busca, antes de alcançarmos este estágio, passamos anos sentados na beira d’água, chorando como o homem da piscina de Betesda: “Não tenho ninguém que me ponha no tanque” (João v. 7). Oh, quando a salvação de Israel virá para colocar-nos na piscina que dá a vida! Como é possível que Ele, aceito por nós internamente, possa nos fazer definhar desta maneira? A falta é nossa: Ele está, de fato, dentro de nós, mas nós mesmos não ficamos diante Dele em Sua presença. Portanto, devemos retornar para dentro de nós mesmos e encontrá-Lo lá. Lemos o suficiente, agora devemos agir; nós observamos o suficiente como os outros caminham, agora devemos nós mesmos caminhar.



TEÓFANO, O RECLUSO



The pool of Bethesda (p. 195)



So long as a state of inner disorder prevails within us, the work of prayer may be present, but the heart is almost always cold, be¬ing very seldom moved to warmth and fervent prayer. When this inner confusion is eliminated, on the other hand, the warmth of prayer is constant, and there is only occasional cooling; and this is soon overcome by patiently remaining in the order of life and occupations which arouse the feeling of warmth. There is also a great difference in the attitude of the heart towards attacks of vanity and passions. Who is free from them? But in the former condition they entered the heart, took possession of it, and (as if by force) captured its sympathies, so that the heart was continually defiled by taking pleasure in sinful thoughts, although in this state also there were no sinful deeds. Now when the same attacks approach, the guardian—attention—stands permanently at the entrance of the heart, and in the Name of the Lord Jesus repulses the enemies; only seldom is the enemy successful in subtly insinuating some favourite temptation. This, however, is immediately noticed, and is cast out and purified by repentance, so that no trace of it remains.

During the period of seeking, before we reach this stage, we spend years sitting by the water's edge, crying out like the man at the pool of Bethesda, 'I have no one to put me into the pool' (John v. 7). Oh when will the salvation of Israel come, to put us into the pool that gives life! How is it possible that He, accepted by us within, should make us languish in this manner? The fault is ours: He is indeed within us, but we ourselves do not stand before Him in His presence. Therefore we must return within ourselves, and find Him there. We have read enough, now we must act; we have watched enough how others walk, now we must walk ourselves.



THEOPHAN THE RECLUSE







Labirinto no Pavimento da Nave Central - Catedral de Chartres – Séc. XIII



O cumprimento dos mandamentos – antes e depois da união da mente e do coração



O cumprimento dos mandamentos que ocorrem antes da união da mente com o coração, é diferente do cumprimento dos mandamentos que ocorrem depois. Antes da união, o lutador ascético cumpre os mandamentos com o maior labor, tendo que forçar-se e compelir sua natureza decaída. Mas uma vez que esta união é adquirida, o poder espiritual que une sua mente com o coração, por si só o atrai para cumpri-los, fazendo disto algo confortável, fácil e prazeroso de ser feito. ‘Correrei o caminho dos teus mandamentos, quando alargares o meu coração’, como disse o Salmista (Sl. cxix. 32)



BISPO IGNATII





Fulfilment of the commandments—before and after the union of mind and heart (p. 196)



The fulfilment of the commandments that comes before the union of the mind with the heart, is different from the fulfilment of the commandments that comes after. Before the union, the ascetic wrestler fulfils the commandments with the greatest labour, having to force and compel his fallen nature. But once this union is achieved, the spiritual power that unites his mind with the heart, itself draws him on to fulfil them, making it com¬fortable, easy and pleasant for him to do so. ‘I will run the way of thy commandments, when thou hast set my heart at liberty’, as the Psalmist said (Ps. cxviii. 32. Sept.).



BISHOP IGNATII







Nave Central - Catedral de Chartres – Séc. XIII



A coisa essencial na oração



A coisa essencial é unir a mente com o coração na prece. Consegue-se isto pela graça de Deus no tempo apropriado e por Ele Próprio determinado. Nossas primeiras técnicas foram completamente substituídas pelo tranquilo pronunciamento da Oração; deve haver uma curta pausa após cada prece, a respiração deve ser calma e sem pressa e a mente deve estar encerrada nas palavras da oração. Com tais métodos, podemos obter facilmente certo grau de atenção. Muito rapidamente o coração começa a sentir-se em simpatia com a atenção da mente que ora. A concórdia do coração e da mente começa pouco a pouco a ser transformada na união da mente com o coração, e o caminho da oração recomendado pelos Padres virá assim a estabelecer-se automaticamente. Métodos mecânicos de espécie física são sugeridos pelos Padres, exclusivamente, como um meio de obter a atenção na prece de forma mais rápida e fácil; mas não como algo essencial.



BISPO IGNATII



The essential thing in prayer (p. 197)



The essential thing is to unite the mind with the heart in prayer. This is accomplished by God's grace at the proper time which He Himself determines. Our earlier techniques are com¬pletely replaced by the unhurried uttering of the Prayer; there should be a short pause after every prayer, breathing should be quiet and leisurely, and the mind should be enclosed in the words of the prayer. With such methods, we can easily attain a certain degree of attention. Very quickly the heart begins to feel in sympathy with the attention of the mind as it prays. The concord of heart and mind begins, little by little, to be transformed into the union of the mind with the heart, and the way of prayer recommended by the Fathers will then establish itself automatic¬ally. Mechanical methods of a physical kind are suggested by the Fathers exclusively as means to achieve attention in prayer quickly and easily, but not as something essential.



BISHOP IGNATII









Rosário Talhado em Madeira – Inglaterra – Séc. XV





O lugar dos métodos mecânicos



A parte indispensável e essencial da prece é a atenção. Sem atenção não há prece. A atenção verdadeira, plena de graça, vem da mortificação do coração em relação ao mundo. Métodos mecânicos sempre permanecem como algo secundário – simples meios em relação a um fim. Os mesmos Santos Padres que sugerem introduzir a mente no coração em conjunção com a respiração, dizem que quando a mente adquiriu o hábito de estar unida com o coração – ou mais corretamente, quando esta união é obtida pelo dom e pela ação da graça – a mente não mais necessita da ajuda destes métodos mecânicos para tal união; mas simplesmente por si mesma, pelo seu próprio movimento, uni-se com o coração.



BISPO IGNATII



The place of mechanical methods (p. 197)



The essential and indispensable part of prayer is attention. Without attention, there is no prayer. True attention, full of grace, comes from mortification of the heart towards the world. Mechanical methods always remain something secondary— simply means towards an end. The same Holy Fathers who sug¬gest introducing the mind into the heart in conjunction with breathing, say that when the mind has acquired the habit of being united with the heart—or more correctly, when this union is achieved by the gift and action of grace—the mind no longer needs the help of these mechanical methods for such union, but simply by itself, by its own movement, unites with the heart.



BISHOP IGNATII



O caminho da respiração



A descida da mente ao coração pelo caminho da respiração é sugerida para o caso de alguém que não sabe onde sustentar sua atenção ou onde o coração fica; mas se você sabe como encontrar o coração sem este método, escolha seu próprio caminho nele. Apenas uma coisa importa – estabelecer-se no coração.



TEÓFANO, O RECLUSO



The way of breathing (p. 198)



The descent of the mind into the heart by the way of breathing is suggested for the case of anyone who does not know where to hold his attention, or where the heart is; but if you know, without this method, how to find the heart, choose your own way there. Only one thing matters—to establish yourself in the heart.



THEOPHAN THE RECLUSE









Tesouro oculto



Possa o Senhor lhe ajudar a ser plenamente vivo e preservar a sobriedade. Mas não se esqueça da coisa principal: unir a atenção e a mente com seu coração e permanecer lá, incessantemente, diante do Senhor. Todo esforço que você faz na oração deve dirigir-se a isto. Ore ao Senhor de modo que Ele possa dar-lhe esta benção: é o tesouro escondido no campo, a pérola de valor inestimável.



TEÓFANO, O RECLUSO

Hidden treasure (p. 198)



May the Lord help you to be fully alive and to preserve sobriety. But do not forget the chief thing, to unite the attention and mind with your heart, and remain there unceasingly, before the Lord. Every effort that you make in prayer must be directed towards this. Pray to the Lord, that He may give you this blessing: it is the treasure hidden in the field, the pearl beyond price.



THEOPHAN THE RECLUSE











quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

A Arte da Prece - Uma Antologia Ortodoxa. (Capítulo VII) Ensinamentos dos Startsi do Monastério de Valamo





 



A ARTE DA PRECE

Uma Antologia Ortodoxa
compilada pelo


Hegúmeno Chariton de Valamo


CAPÍTULO VII


ENSINAMENTOS DOS STARTSI DO
MONASTÉRIO DE VALAMO






 



Hegúmeno Chariton de Valamo[1]
(1872 – 1947)


(i) Monge Schema[2] Agapii


Igreja Central (Fundos) – Novo Monastério de Valamo - Finlândia

Prece Oral

No início a Oração de Jesus é em grande parte proferida com indisposição e constrangimento. Mas se temos uma firme intenção de subjugar todas as nossas paixões, através da oração e com a ajuda da graça divina, então com frequente prática da Oração e perseverança, na medida em que as paixões enfraquecem, a própria Oração se tornará gradualmente mais fácil e mais atrativa.
Na prece oral devemos tentar de todo modo possível manter nossa mente fixa nas palavras da oração, dizendo-as sem pressa e concentrando toda nossa atenção no significado das palavras. Quando a mente torna-se distraída pelos pensamentos estranhos, devemos desencorajá-la e trazê-la de volta para as palavras da prece.
Livrar-se da distração não é algo dado a mente rapidamente, nem sempre quando ela deseja. Ocorre quando nós primeiramente nos tornamos humildes, e quando Deus escolhe conceder esta benção para nós. Este dom divino não depende da quantidade de tempo oferecido nem do número de orações recitadas. O que é necessário é um coração humilde, a graça de Cristo, e esforço constante.
Da oração recitada com atenção passamos para a oração interna ou mental. Esta é assim chamada porque em tal oração nossa mente é varrida em direção a Deus e apenas vemos a Ele.


Oral prayer (p. 275)

In the beginning the Jesus Prayer is mostly uttered with unwill­ingness and constraint. But if we have a firm intention to subdue all our passions, through prayer and with the help of divine grace, then with frequent practice of the Prayer and perseverance, as the passions grow less, the Prayer itself will become gradually easier and more attractive.
In oral prayer we must try in every possible way to keep our mind fixed on the words of the prayer, saying it without haste and concentrating all our attention on the meaning of the words. When the mind becomes distracted by alien thoughts, we must bring it back undiscouraged to the words of the prayer.
Freedom from distraction is not given to the mind quickly, nor whenever we wish it. It comes when we have first humbled ourselves, and when God chooses to grant this blessing to us. This divine gift does not depend upon the length of time we pay or the number of prayers we recite. What is needed is a humble heart, the grace of Christ, and constant effort.
From oral prayer recited with attention we pass over to inner or mental prayer. This is so called because in such prayer our mind is swept towards God and sees Him alone.


Ícone (Fundos) – Novo Monastério de Valamo - Finlândia

Oração interna (oração da mente)        

Para praticar a oração interna é essencial manter nossa atenção no coração diante do Senhor. Em resposta ao nosso zelo e humilde esforço na oração, o Senhor presenteia nossa mente com Seu primeiro presente – o presente do recolhimento e da concentração na oração. Quando a atenção é dirigida ao Senhor sem esforço e sem interrupção, esta é uma atenção dada pela graça, já que nossa própria atenção é sempre forçada. Esta oração interna, se tudo segue bem no seu devido tempo, passa a ser oração do coração: a transição é facilmente feita desde que tenhamos um professor experimentado que nos guie. Quando os sentimentos de nosso coração estão com Deus e o amor por Deus preenche nosso coração, tal oração é chamada prece do coração.

Inner prayer (prayer of the mind) (p.276)

To practise inner prayer, it is essential to keep our attention in the heart before the Lord. In response to our zeal and humble striving in prayer, the Lord bestows upon our mind His first gift—the gift of recollection and concentration in prayer. When attention is directed towards the Lord effortlessly and without interruption, this is attention given by grace, whereas our own attention is always forced. This inner prayer, if all goes well, in due time passes into prayer of the heart: the transition is easily made, provided we have an experienced teacher to guide us. When the feelings of our heart are with God and love for God fills our heart, such prayer is called prayer of the heart.










Igreja Central – Novo Monastério de Valamo - Finlândia





Igreja Central  (Cúpula)Novo Monastério de Valamo - Finlândia

Oração do coração

Está dito nos Evangelhos: “Se alguém me quiser seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga” (Mateus xvi. 24). Quando oramos, então, primeiro devemos renunciar à nossa própria vontade e às nossas próprias idéias, e então tomar nossa cruz que é o inevitável trabalho do corpo e da alma na busca espiritual. Tendo nos entregado inteiramente para o cuidado de Deus que nunca se adormece, deveríamos alegre e humildemente suar e trabalhar, por causa da real recompensa que Deus concederá ao zeloso quando o momento certo chegar. Então Deus, transferindo Sua graça para nós, colocará um fim aos devaneios de nossa mente e a colocará – junto com a lembrança Dele – imutavelmente dentro do coração. Quando esta morada da mente no coração torna-se algo natural e constante, os Padres a chamam de ‘união da mente e do coração’. Neste estado a mente não tem mais qualquer desejo de estar fora do coração. Ao contrário, se as circunstâncias externas ou alguma longa conversa mantém a mente longe de sua atenção ao coração, ela experimenta um irresistível desejo de retornar para dentro, uma ansiada sede espiritual: seu único desejo é pôr-se a trabalhar uma vez mais com renovado zelo em construir sua casa interior.
Quando esta ordem interior é estabelecida todas as coisas em um homem passam da cabeça ao coração. Então, uma espécie de luz interior ilumina tudo que está dentro dele, e qualquer coisa que faz, diz, ou pensa, é executada com plena ciência e atenção. Ele é capaz de discernir claramente a natureza dos pensamentos, intenções e desejos que chegam até ele; ele voluntariamente submete sua mente, coração e vontade a Cristo, obedecendo ansiosamente a cada mandamento de Deus e dos Padres. Ao desviar-se deles de qualquer modo, ele expia sua falta com arrependimento sentido no coração e contrição, prostrando-se humildemente diante de Deus com sincero e real pesar, suplicando e esperando confidentemente ajuda de cima pela sua fraqueza. E Deus, vendo esta humildade, não deixa o suplicante sem Sua graça. 
A oração da mente no coração chega rapidamente para algumas pessoas, enquanto que para outras o processo é vagaroso. Assim, de três pessoas que conheço, esta oração entrou em uma, tão logo lhe foi falado a respeito, naquela mesma hora; para outra chegou num tempo de seis meses; para uma terceira depois de dez meses, enquanto que no caso de um grande staréts chegou somente após dois anos. Por quê acontece assim, só Deus sabe.
Saiba também que antes que as paixões sejam destruídas a oração é de uma espécie, e depois que o coração foi purificado das paixões ela é de outra espécie. A primeira espécie ajuda a purificar o coração das paixões, enquanto que a segunda é um símbolo espiritual da benção futura. Isto é o que você deveria fazer: quando puder sentir, de fato, a mente entrando no coração e estiver conscientemente ciente dos efeitos da oração, dê pleno poder a tal prece, banindo tudo que é hostil a ela; e tanto quanto ela continua ativa em você, não faça nada mais. Mas quando você não sentir-se arrebatado assim, pratique a prece oral com prostrações, lutando de todas as maneiras para manter sua atenção no coração diante da face do Senhor. Esta maneira de orar também capacitará o coração para adquirir calor.
Vigie e seja sóbrio, especialmente durante a oração da mente e do coração. Ninguém agrada a Deus mais do que aquele que pratica corretamente a oração da mente e do coração. Quando as circunstâncias externas tornarem a prece difícil, ou quando você não tiver tempo para orar, em tais momentos, seja lá o que estiver fazendo, lute para conservar o espírito da oração em você mesmo por todos os meios possíveis, lembrando de Deus e lutando de todos os modos para vê-Lo diante de você com os olhos da sua mente, com temor e amor. Sentindo Sua presença diante de você, entregue-se à Sua toda-poderosa força, onisciente e testemunha de tudo, em devocional submissão prostrando todas suas atividades diante dele, de tal maneira que em cada ação, palavra, e pensamento você lembre-se de Deus e Sua sagrada vontade. Isto, sendo breve, é o espírito da prece. Quem quer que tenha um amor pela oração deve, sem fracasso, possuir este espírito, e tanto quanto possível, deve submeter sua compreensão à compreensão de Deus através de constante atenção do coração, obedecendo aos mandamentos de Deus humilde e reverentemente. Do mesmo modo ele deveria submeter seus desejos e vontades à vontade de Deus, e entregar-se completamente aos desígnios da providência de Deus.  
De todas as maneiras possíveis deveríamos combater o espírito da arbitrária obstinação e o impulso que destrói todo controle. É um espírito que sussurra para nós: “Isto está além da minha força, para isto não tenho tempo, é muito cedo ainda para empreender isto, deveria esperar, minhas tarefas monásticas impedem-me” – e muitas outras desculpas de quaisquer espécies. Aquele que ouve a este espírito nunca adquirirá o hábito da prece. Estreitamente conectado com este espírito está o espírito da auto-justificativa: quando formos empurrados para a má ação pelo espírito da obstinada arbitrariedade e estivermos, portanto, preocupados pela nossa consciência, este segundo espírito aproxima-se e põe-se a trabalhar em nós. Num tal caso o espírito da auto-justificativa usa toda espécie de engambelação para derrotar a consciência e apresentar nosso erro como um acerto. Possa Deus proteger-lhe contra estes maus espíritos.

Prayer of the heart (p.276)

It is said in the Gospels: ‘If any man will come after me, let him deny himself, and take up his cross, and follow me’ (Matt. xvi. 24). When we pray, then, we must first give up our own will and our own ideas, and then take up our cross, which is the labour of body and soul that is unavoidable in this spiritual quest. Having surrendered ourselves  entirely to  the never-sleeping care of God, we should joyfully and humbly endure the sweat and labour, for the sake of the true reward God will grant to the zealous when the right time comes. Then God, imparting His grace to us, will put an end to the wanderings of our mind and will place it—together with the remembrance of Himself— immovably within the heart. When this dwelling of the mind in the heart has  become  something natural and  constant,  the Fathers call it ‘union of mind and heart’. In this state the mind has no longer any desire to be outside the heart. On the contrary, if outward circumstances or some long conversation keeps the mind away from its attention to the heart, it experiences an irresistible longing to return within, a craving and spiritual thirst: its one desire is to set to work once more with renewed zeal in building its inner house.
When this inner order is established, everything in a man passes from the head into the heart. Then a kind of inner light illumines all that is within him, and whatever he does, says, or thinks, is performed with full awareness and attention. He is able to dis­cern clearly the nature of the thoughts, intentions, and desires that come to him; he willingly submits his mind, heart, and will to Christ, eagerly obeying every commandment of God and the Fathers. Should he deviate from them in any respect, he expiates his fault with heart-felt repentance and contrition, humbly prostrating himself before God in unfeigned sorrow, begging and confidently awaiting help from above in his weakness. And God, seeing this humility, does not deprive the suppliant of His grace.
Prayer of the mind in the heart comes quickly to some people, while for others the process is slow. Thus of three people known to me, it entered into one as soon as he was told about it, in that same hour; to another it came in six months' time; to a third after ten months, while in the case of one great staretz it came only after two years. Why this happens so, God alone knows.
Know also that before the passions are destroyed prayer is of one kind, and after the heart has been purified of passions it is of another kind. The first kind helps to purify the heart of passions, while the second is a spiritual token of future bliss. This is what you should do: when you can actually feel the mind entering the heart and are consciously aware of the effects of prayer, give full sway to such a prayer, banishing all that is hostile to it; and so long as it continues active within you, do nothing else. But when you do not feel thus carried away, prac­tise oral prayer with prostrations, striving in all possible ways to keep your attention in the heart before the face of the Lord. This manner of praying will also enable the heart to acquire warmth.
Watch and be sober, and especially during the prayer of mind and heart. No one pleases God more than he who practises the prayer of mind and heart aright. When outward surroundings make prayer difficult, or when you have no time to pray, at such times, whatever you may be doing, strive to preserve the spirit of prayer in yourself by all possible means, remembering God and striving in every way to see Him before you with the eyes of your mind, in fear and love. Feeling His presence before you, surrender yourself to His almighty power, all-seeing and omniscient, in worshipful submission laying all your activities before him, in such a way that in every action, word and thought you remember God and His holy will. Such, in brief, is the spirit of prayer. Whoever has a love for prayer must without fail possess this spirit, and, as far as possible, must submit his understanding to God's understanding by means of constant attention of the heart,  humbly and reverently obeying the commands of God. In the same way he should submit his wishes and desires to God's will, and surrender himself completely to the designs of God's providence.
In all possible ways we should combat the spirit of arbitrary self-will and the impulse to shake off all restraint. It is a spirit that whispers to us: “This is beyond my strength, for that I have no time, it is too soon yet for me to undertake this, I should wait, my monastic duties prevent me”—and plenty of other excuses of like kind. He who listens to this spirit will never acquire the habit of prayer. Closely connected with this spirit is the spirit of self-justification: when we have been carried away into wrong­doing by the spirit of wilful arbitrariness and are therefore worried by our conscience, this second spirit approaches and sets to work on us. In such a case the spirit of self-justification uses all kinds of wiles to deceive the conscience and to present our wrong as being right. May God protect you against these evil spirits.




Teto da Capela de Oração – Novo Monastério de Valamo – Finlândia


(ii) Hegúmeno Varlaam


The Apostle writes: ‘For our rejoicing is this, the testimony of our conscience’ (2 Cor. i. 12). Simeon the New Theologian says: 'If our conscience is pure, we are given the prayer of mind and heart; but without a pure conscience we cannot succeed in any spiritual endeavour.'

(iii) Hegúmeno Nazarii[3]


Ícone (Interior) – Novo Monastério de Valamo - Finlândia

Com reverência invoque em segredo pelo Nome de Jesus, assim: “Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tenha piedade de mim, um pecador.”
Tente fazer esta prece entrar ainda mais profundamente em sua alma e coração. Faça a oração com sua mente e pensamento, e não permita que ela deixe seus lábios mesmo por um momento. Se possível coloque-a junta com sua respiração, e com toda sua força tente, através da oração, forçar-se a uma sentida contrição no coração, arrependendo-se de seus pecados com lágrimas. Se não existem lágrimas, ao menos deveria haver contrição e pesar no coração.

With reverence call in secret upon the Name of Jesus, thus: 'Lord Jesus Christ, Son of God, have mercy upon me, a sinner.'
Try to make this prayer enter ever more deeply into your soul and heart. Pray the prayer with your mind and thought, and do not let it leave your lips even for a moment. Combine it, if possible, with your breathing, and with all your strength try through the prayer to force yourself to a heart-felt contrition, repenting over your sins with tears. If there are no tears, at least there should be contrition and mourning in the heart.


Novo Monastério de Valamo (Interior) - Finlândia




















[1] A Arte da Prece, compilação de Chariton, apareceu originalmente em Russo, publicado pelo Monastério de Valamo em 1936. Quatro anos depois esta Valamo submergiu na segunda guerra mundial. Em 3 de fevereiro de 1940 foi pesadamente bombardeada pelas tropas soviéticas, e no dia seguinte Chariton e setenta monges fugiram atravessando a neve, conseguindo refúgio no interior da Finlândia. No fim da guerra, a ilha de Valamo permaneceu dentro da fronteira da U.S.S.R, e nenhuma permissão foi dada para que fosse retomada a vida monástica ali: as construções do monastério estavam sendo usadas para campo de férias. Mas, depois de grande fadiga, os refugiados na Finlândia conseguiram restabelecer a vida da comunidade, denominando sua recém criada fundação como: ‘Novo Monastério de Valamo’, em funcionamento até os dias de hoje. (Prefácio – A Arte da Prece)
[2] Para o significado de ‘schema’ veja nota 1 no Cap. II (ii), p. 9. 
[3] Hegúmeno Nazarii (1731-1809), staréts no monastério de Sarov, enviado pelo Metropolitano (Arcebispo) Gavriil de S. Petersburgo em 1782 para assumir a direção de Valamo: ele se manteve como Abade até 1801. Ao chegar ele encontrou a comunidade num grave estado de declínio, com somente alguns monges restantes. Sob a liderança de Nazarii o número de monges rapidamente cresceu e a vida espiritual do monastério foi, uma vez mais, elevada a um nível superior.